A gestão de contratos é, para muitos times internos, o coração da operação e, frequentemente, sua maior dor de cabeça. Contratos dispersos em diferentes áreas, falta de visibilidade sobre renovações, análises lentas e uma perigosa tendência de abrir mão da segurança em prol da agilidade são sintomas comuns.
Sem processos sólidos, dados confiáveis e liderança estratégica, nenhuma tecnologia será capaz de gerar eficiência real no jurídico corporativo, especialmente na área de gestão de contratos de departamentos jurídicos.
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Percebemos que, isoladamente, a IA não salva gestão de contratos ineficiente, mas a boa e velha estratégia sim. Muitos jurídicos caem na mesma armadilha ao olhar para a gestão de contratos: apostar na contratação de tecnologia como solução mágica para todos os problemas.
Implanta-se um sistema, contrata-se um CLM, injeta-se IA e, meses depois, os gargalos continuam, os custos aumentam, a dependência de mão de obra intensifica e a frustração é maior. A verdade é incômoda: sem processos sólidos, dados confiáveis e liderança estratégica, a tecnologia não é salvação… É catalisador. Ela não corrige o caos, apenas o acelera.
A armadilha de automatizar o caos
O discurso é sedutor: “Nosso jurídico será digital, integrado e inteligente.” A realidade, muitas vezes, é outra: meses de implantação de sistemas caros, orçamentos estourados, bugs intermináveis, desconexão com sistemas corporativos e equipes desmotivadas. Tudo porque um passo essencial foi ignorado: a metodologia de mapear e redesenhar processos antes de escolher a tecnologia.
Na área de contratos, o cenário é um dos mais complexo ainda, com dezenas e até centenas de modelos contratuais; diversos fluxos de aprovações sem SLA (jurídico da outra parte, validações internas, urgências de vendas, assinaturas); áreas solicitantes com riscos contratuais diferentes (contratante/contratada/parceira), regras diversas de controle de vigência, muitas particularidades e dificuldade em padronizar modelos de negócio. Para isso, é preciso se atentar cada vez mais que CLM não é tecnologia e nem fórmula milagrosa para se encontrar no mercado.
CLM é mapeamento, ciclo, processo, governança interna
E CLM só funciona bem se houver uma base sólida: cláusulas padronizadas, fluxos claros, regras de revisão bem definidas e métricas objetivas para coleta de dados. Ignorar isso é abrir a porta para workflows tão complexos que apenas desenvolvedores, TI, suporte, consultoria conseguirá manter. Se desconsiderarmos o processo, seguiremos trabalhando para sistemas. Tecnologia sem estratégia é desperdício. Estratégia sem tecnologia é processo. Estratégia com tecnologia é revolução.
É inegável o valor da tecnologia e mais precisamente da IA no dia a dia da rotina jurídica. Estamos considerando tal qual a essencialidade do uso da internet. O ponto chave não é dispensar o uso da tecnologia, e sim, reconhecer definitivamente que a tecnologia por si só pode mais atrapalhar do que ajudar.
A pauta que precisamos evoluir e consolidar na rotina corporativa é a essencialidade da metodologia de projeto, de se debruçar nas complexidades criadas até aqui e propor novos caminhos simplificados. É reconhecer que cada dado cadastrado sem regras de governança é direcionamento distorcido no futuro.
O foco do líder corporativo jurídico deve ser, antes de tudo, método. As barreiras tecnológicas estão cada vez menores, sistemas no/low-code e plug and play nascem a cada dia. O mercado legaltech nos distrai por muitas vezes e nos faz considerar soluções de prateleira, como se a base interna estivesse madura e pronta para só conectar a mais nova tecnologia. O que não é a realidade de grande parte dos departamentos jurídicos quando se fala em contratos.
Antes de buscar ferramentas no mercado, devemos focar no mapeamento de fluxos do “As is” para o “to be”, discutir e validar o roadmap. Se o time não está preparado para execução desta etapa, invista em consultoria de mapeamento de processos, em planejamento estratégico, busque profissionais qualificados em eficiência e em projetos para o time, entenda como outros departamentos passaram por esta etapa de planejamento e mapeamento.
A estratégia
Mas então, o que diferencia de fato o “jurídico eficiente” na gestão de contratos?
- Visibilidade total: o primeiro passo é o básico: centralizar todos os contratos em um repositório único. Parece simples, mas é a fundação para qualquer inteligência futura. Saber o que temos, onde está e quando vence é o mínimo. A partir daí, estruturamos dados essenciais: partes, objeto, valor, prazo, cláusulas de risco.
- Workflows inteligentes: a agilidade na análise contratual não pode vir ao custo da segurança. A resposta está em construir workflows de aprovação que garantam a proteção da empresa, baseados em uma matriz de risco clara. Quem aprova o quê? Quais cláusulas exigem um olhar mais atento? Um fluxo bem desenhado, com um registro auditável, garante que a velocidade não se transforme em imprudência.
- Comunicação e clareza: a proteção que um contrato oferece depende de sua clareza. Ferramentas como o Visual Law e o Legal Design são essenciais para transformar documentos densos e complexos em instrumentos de negócio claros e objetivos, melhorando a comunicação com todas as partes interessadas.
Checklist estratégico para o jurídico iniciar projeto de CLM
O universo jurídico é inundado por um tsunami de inovações tecnológicas que, muitas vezes, mais confundem do que orientam. Para gestores de contratos, o desafio é navegar nesse cenário e construir uma área verdadeiramente eficiente. Se você busca um caminho claro, este roteiro prático guiará a transformação da sua área.
- Faça o diagnóstico preciso das dores: antes de buscar soluções, mergulhe nos problemas. Mapeie exaustivamente os gargalos operacionais, as tarefas de baixo valor agregado e as fontes de atrito que consomem o tempo da sua equipe. Nesta fase, o objetivo não é encontrar a cura, mas sim entender a fundo a doença.
- Estabeleça o foco com priorização estratégica: a tentação de resolver tudo de uma vez é a receita para o fracasso. Analise as dores mapeadas e priorize aquelas com maior impacto e viabilidade de solução. Concentre os esforços em uma iniciativa de cada vez. Lembre-se: quando se tenta executar múltiplos projetos simultaneamente, nenhum avança com a excelência necessária.
- Monte um time dedicado à execução: a inovação não pode ser um projeto paralelo. Defina um grupo enxuto e focado para liderar as melhorias. Uma equipe menor facilita a comunicação e a tomada de decisão. O mais importante é que esses membros tenham o projeto como sua prioridade principal, garantindo que a iniciativa não se perca em meio às demandas do dia a dia. Se tudo é prioridade, nada é prioridade.
- Adote metodologias de gestão de projetos: profissionalize a execução. O estudo e a aplicação de metodologias ágeis (como Scrum ou Kanban) são fundamentais para controlar o andamento dos projetos, quebrar grandes desafios em entregas menores e garantir a implantação de melhorias de forma organizada e visível para todos.
- Processo primeiro, sempre: a máxima de que 99% das falhas em projetos de tecnologia decorrem de um mapeamento de fluxo deficiente é uma verdade quase universal. Antes de qualquer implementação, dedique tempo para desenhar e validar o fluxo de trabalho ideal (o “to be”). Um processo bem estruturado é a fundação sobre a qual a tecnologia pode prosperar.
- Entenda a tecnologia como meio, não como fim: ferramentas são catalisadores, não soluções mágicas. Muitas vezes, um processo quebrado precisa primeiro de reestruturação, não de um software. A tecnologia deve servir a um fluxo de trabalho inteligente; aplicá-la a um processo falho apenas automatizará o caos.
- Crie uma cultura de documentação: “Por que fazemos o processo desta forma?” Quantas vezes uma decisão crucial é perdida, forçando a equipe a revisitar debates já encerrados? Institua o hábito de registrar o objetivo de cada projeto e todas as decisões importantes tomadas ao longo do caminho. Isso cria um histórico rastreável e evita retrabalho.
- Construa uma governança sólida: implementar uma melhoria é apenas metade da batalha. A outra metade, mais importante, é garantir sua perpetuidade. Defina uma governança clara para manter os dados saneados, a disciplina nos procedimentos e a integridade dos novos fluxos. Sem governança, a inovação de hoje se torna o problema de amanhã.
- Cultive o engajamento e o propósito: projetos de mudança podem ser longos e enfrentar obstáculos externos que desmotivam a equipe. O papel do líder é manter vivo o “porquê” da iniciativa. Somente quando a equipe entende profundamente como a mudança irá aliviar suas dores diárias e agregar valor ao seu trabalho, ela se manterá engajada e resiliente para superar os desafios.
- Valide integração com fluxos internos implantados: conheça as ferramentas já utilizadas pela empresa, em especial, pela área de vendas, financeiro, pós-venda e demais áreas. Integre o fluxo do jurídico aos fluxos do ecossistema existente, sem duplicar processos ou dados. Garanta que o dado seja único em todas as etapas do processo.
- Simplicidade como regra: fluxos devem ser diretos, simples e funcionais. Evite o excesso de condicionantes “e se” e regras de aprovações que criam “elefantes brancos” difíceis de manter.
Por fim, a verdadeira transformação na gestão de contratos não está em escolher a tecnologia mais sofisticada, mas em garantir que exista uma estratégia clara, processos bem definidos e governança consistente. Só assim a tecnologia deixa de ser promessa e passa a ser ferramenta real de eficiência e segurança.