A 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2) reverteu, em decisão unânime, a desconsideração da personalidade jurídica que havia sido parcialmente concedida no processo de uma ex-funcionária contra a Saraiva e a Siciliano S.A., empresas que se encontram em recuperação judicial desde 2023. A trabalhadora buscava responsabilizar diretamente os sócios e administradores, para que pagassem a dívida trabalhista com seus bens pessoais.
Em primeira instância, o juiz Mauro Schiavi, da vara do Trabalho de Cajamar (SP), considerou que “a moderna doutrina e a jurisprudência trabalhista encamparam a teoria objetiva da desconsideração da personalidade jurídica que disciplina a possibilidade de execução dos bens do sócio, independentemente de os atos deste violarem ou não o contrato, ou haver abuso de poder. Basta a pessoa jurídica não possuir bens para ter início a execução dos bens do sócio”.
Este entendimento se justifica, afirma o juiz, em razão da hipossuficiência do trabalhador, da dificuldade de demonstrar a má-fé do administrador e do caráter alimentar do crédito trabalhista.
Ainda que a executada esteja constituída sob a forma de sociedade anônima, afirma Schiavi, “é possível a responsabilização dos diretores administradores, pois estes detêm a administração da sociedade, sendo inviável a responsabilização dos acionistas”. Por isso, ele havia determinado a execução contra os diretores Jorge Eduardo Saraiva e Jorge Saraiva Neto.
A defesa dos diretores, conduzida pela advogada Naiara Insauriaga, especialista em Direito do Trabalho do escritório Barcellos Tucunduva Advogados, sustentou que a responsabilização pessoal exige a comprovação de abuso da personalidade jurídica, desvio de finalidade ou confusão patrimonial, conforme previsto no artigo 50 do Código Civil e nos artigos 117 e 158 da Lei das Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/76).
Na decisão, o desembargador relator Daniel de Paula Guimarães acolheu o pedido da defesa e afirmou que “a mera insolvência da companhia, ainda que de capital fechado, é insuficiente para autorizar o redirecionamento automático da execução contra todos os acionistas”, e que “a tentativa de equiparar a S.A. de capital fechado a uma sociedade limitada para fins de responsabilidade patrimonial representa um equívoco fundamental”.
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O relator também citou precedentes do Tribunal Superior do Trabalho e do Superior Tribunal de Justiça que consolidam a aplicação da “Teoria Maior” da desconsideração da personalidade jurídica às sociedades anônimas, exigindo prova inequívoca de conduta dolosa ou culposa dos administradores ou acionistas controladores. As provas de desvio de finalidade ou confusão patrimonial não foram apresentadas pela ex-funcionária, sendo rejeitado por unanimidade o pedido de desconsideração da personalidade jurídica
Segundo a advogada, “essa decisão é importante porque é comum na Justiça do Trabalho vermos um direcionamento desenfreado, de forma quase automática, das execuções contra acionistas quando a empregadora está insolvente. Essa decisão é relevante porque traz segurança jurídica acerca da aplicação correta da lei, além de um entendimento correto dos institutos jurídicos alinhado com a jurisprudência de outros Tribunais”.
O processo tramita com o número 1000776-56.2019.5.02.0221.