A reforma tributária aprovada pelo Congresso e promulgada no final de 2023 altera a tributação sobre o consumo no Brasil e, sem entrarmos na discussão quanto aos seus excessos e equívocos, sem dúvida trará grandes alterações no cotidiano de todos nós. Contudo, nada vai mudar para os consumidores antes de 2026, quando as novas regras começam a valer.
Por outro lado, pouco tem se discutido sobre as alterações fiscais que já entram em vigor agora em 2024, algumas das quais com poder de causar grandes estragos. Uma mudança relevante trazida pela Lei 14.789/2023, publicada em 29/12/2023, põe fim à isenção sobre a subvenção para investimentos e incentivos fiscais, podendo afetar gravemente as economias estaduais.
A subvenção é um tipo de subsídio dado pelo governo, por meio de um benefício tributário, como estímulo à instalação, ampliação ou manutenção de empreendimentos em determinados locais. Isso acontece muito comumente (mas não exclusivamente) com o ICMS, em praticamente todos os estados, nas mais diversas áreas de produção.
As subvenções para investimento exigem uma contrapartida do contribuinte – como instalar ou aumentar uma fábrica, abrir determinado número de postos de trabalho etc. Já as subvenções para custeio não requerem uma contrapartida do contribuinte; são benefícios concedidos para a manutenção dos empreendimentos e aumento de sua competitividade.
Em 2014, a Lei 12.973 definiu a não incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores das subvenções para investimento, desde que estas fossem registradas em conta de reserva de lucros e não distribuídas aos sócios. As Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 também estabeleciam a desoneração de PIS e Cofins sobre as subvenções para investimento.
Mais recentemente, após muitas discussões entre contribuintes e Receita Federal acerca das isenções mencionadas, especialmente quanto à aplicabilidade destas sobre as subvenções para custeio, a Lei Complementar 160/2017 equiparou todos os benefícios fiscais de ICMS a uma subvenção para investimento, para fins de exclusão dos respectivos valores das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, mantendo a determinação de escrituração dos valores em reserva de lucros.
Veja-se que a isenção não é uma mera liberalidade da legislação. É condicionada à manutenção dos recursos subvencionados sob titularidade da empresa, em reserva de lucros. Ou seja, os recursos devem ser mantidos na empresa e utilizados na operação, incrementando o negócio. Se distribuídos aos sócios, devem ser tributados.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), instado a se manifestar sobre o tema, afirmou inclusive que as subvenções oferecidas por meio de crédito presumido de ICMS não deveriam compor as bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, independentemente de qualquer requisito, sob pena de ferir o princípio constitucional do pacto federativo. Como reconhecido pela corte, a União não poderia onerar, pelos tributos federais IRPJ e CSLL, rendimentos oriundos de benefícios do tributo estadual ICMS, concedidos pelos estados no âmbito de suas próprias políticas fiscais.
Agora, sob o pretexto de corrigir eventuais interpretações distorcidas, o governo federal simplesmente revogou expressamente todas as disposições legais que tratavam da isenção e pretende exigir IRPJ, CSLL, PIS e Cofins sobre estas receitas, indistintamente.
Em lugar da isenção, as empresas beneficiárias de subvenção para investimentos, apenas estas, terão direito a um crédito junto à Receita Federal, de 25% do valor da subvenção, que poderá ser usado para pagar tributos federais ou ressarcido em dinheiro. E mesmo esse crédito, para sua concessão e utilização, requer o cumprimento de diversas formalidades.
Na prática, a lei impõe às indústrias geradoras de empregos e de desenvolvimento regional um aumento significativo da carga tributária.
Isso, na medida em que as subvenções, nas suas mais variadas formas, fortalecem o setor produtivo, geram um ambiente propício para o crescimento dos negócios e contribuem para a diversificação, especialização e desenvolvimento das economias estaduais.
Em Minas Gerais, por exemplo, segundo levantamento do próprio estado, ao final de 2022, 9.353 empresas possuíam regimes especiais dentre os chamados TTSs (Tratamentos Tributários Setoriais). Nestes regimes empresas de alguns setores específicos obtêm benefícios pré-estabelecidos pelo estado, cumprindo apenas alguns requisitos como atuação na área, sede no estado e regularidade fiscal.
O setor de mineração, responsável por aproximadamente 4% do PIB nacional e cerca de 1 milhão de empregos, entre diretos e indiretos (informações do Senado), é praticamente todo beneficiário de regimes especiais de tributação estadual, em todo o país.
Assim, ao tributar subvenções concedidas por outras unidades federativas, a União, além de transbordar sua competência, agredindo o pacto federativo, na medida em que tributa recursos transferidos aos contribuintes por outras pessoas políticas de direito público, afeta sobremaneira as economias estaduais.
Algumas empresas, com a nova incidência, deixarão de ser viáveis, com risco de demissão maciça de funcionários ou mesmo encerramento das atividades. Já aquelas capazes de se sustentar, fatalmente ajustarão seus preços, o que afeta tanto a competitividade do país em relação aos demais, como também a economia interna.
É fato, com menos capital de giro, as empresas reduzem sua capacidade de operação, de geração de empregos e investimento. E com menos operação, menos tributos são pagos, o que no final, pode gerar um efeito inverso daquele pretendido pelo governo federal. Neste ano de 2024, possivelmente, a União terá um incremento arrecadatório em razão da medida. Mas e nos seguintes?