Tributação de aplicações financeiras, de entidades controladas e trusts no exterior

  • Categoria do post:JOTA

O Congresso Nacional aprovou em 12 de dezembro de 2023 a Lei 14.754/2023, a qual versa sobre as alterações legislativas sobre a tributação de aplicações em fundos de investimento no país e da renda auferida por pessoas físicas residentes no país em aplicações financeiras, entidades controladas e trusts no exterior. Assim, foram alteradas as regras sobre tributação das aplicações financeiras no exterior, feitas por – ou por intermédio – de empresas e fundos conhecidos como offshore localizados, muitas vezes, em Estados de tributação favorecida ou regime privilegiado.

Inscreva-se no canal de notícias tributárias do JOTA no WhatsApp e fique por dentro das principais discussões tributárias!

A nova legislação alinha o Brasil aos Estados integrantes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), e passamos a seguir as recomendações e diretrizes do Projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting Project), estabelecendo alterações significativas e regras anti-diferimemto dos lucros e rendimentos auferidos no exterior, adotando o regime de transparência fiscal. Tais regras já foram incorporadas por vários outros países como Chile, Colômbia e Estados Unidos e tem como principal alvo os contribuintes, que através de estruturas controladas, são investidores no exterior.  

Tributação de rendimentos no exterior

Com a nova legislação, os rendimentos no exterior passarão a ser tributados pelo IRPF pela alíquota fixa de 15% (quinze por cento), nas modalidades de aplicações financeiras e de lucros e dividendos de entidades controladas. 

Os ganhos de capital percebidos por pessoas físicas residentes no país provenientes de alienação de bens e direitos situados no exterior, que não constituam aplicações financeiras no exterior, permanecem sujeitos às regras específicas de tributação, ou seja, às alíquotas progressivas de 15% a 22,5%.

Destaca-se que a variação cambial de depósitos em conta corrente não remunerada ou em cartão de débito/crédito não ficará sujeita a tributação. A variação cambial de moeda estrangeira em espécie não ficará sujeita a tributação até o limite de alienação de USD 5 mil. 

Aplicações financeiras no exterior

Em relação às aplicações financeiras no exterior, a nova lei define – e exemplifica – o que são as aplicações financeiras no exterior. Assim, os títulos de renda variável, de renda fixa, os certificados de depósitos, criptoativos, as cotas de fundos de investimento, as apólices de seguros resgatáveis, ativos virtuais, carteiras digitais, e as operações de crédito e mútuo ficaram dentro na atual regulação.

Nestes casos, para que as pessoas físicas possam deduzir do seus IRPF o imposto sobre a renda pago, no mesmo ano calendário, no país de origem dos rendimentos, deverá haver acordo internacional ou acordo de reciprocidade de tratamento entre o Brasil e o Estado onde o imposto já foi pago. 

Lucros de controladas no exterior

Uma das grandes alterações refere-se à tributação dos lucros auferidos pessoas jurídicas, fundos de investimento, fundações e outras entidades, sejam elas personificadas ou não – definidas como Entidades Controladas no Exterior (ECEs) – as quais serão tributadas pelo IRPF todo 31.12 de cada ano à alíquota fixa de 15% (quinze por cento)

Conheça o JOTA PRO Tributos, nossa plataforma de monitoramento tributário para empresas e escritórios, que traz decisões e movimentações do Carf, STJ e STF

Os lucros apurados por ECEs a partir de 1 de janeiro, serão considerados distribuídos para a pessoa física residente (sócia ou acionista), em 31 de dezembro de cada ano, independentemente de distribuição efetiva, com base em balanço patrimonial específico nas ECEs seguintes condições:

localizados em países com tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado: ou 
com renda passiva (royalties, dividendos, aluguéis e aplicações financeiras) superior a 40% da renda total.

Os lucros das ECEs deverão ser apurados em balanço anual, com observância aos padrões internacionais de contabilidade ou com a legislação comercial brasileira. Poderão ser deduzidos (i) os lucros de investidas da ECE no Brasil e demais rendimentos e ganhos apurados pela ECE no país; e (ii) o imposto pago sobre a renda no exterior pela ECE ou por suas investidas, observadas as diretrizes da Lei.

Os lucros não distribuídos deverão ser incluídos na Declaração de Ajuste Anual (DAA) como Custo de Aquisição dos Dividendos a Receber, e não serão tributados novamente. 

Para os lucros acumulados até 31 de dezembro de 2023 será mantida a regra de diferimento de tributação até sua efetiva distribuição.

Alternativamente, a pessoa física pode optar por declarar os bens e direitos detidos pela entidade controlada no exterior como se fossem detidos diretamente, de forma transparente. Esta opção é irrevogável e irretratável durante todo o prazo em que a pessoa física detiver a entidade controlada no exterior, de modo que o IR seja cobrado apenas sobre ganhos e rendimentos efetivamente realizados no exterior.

A variação cambial do principal aplicado nas controladas no exterior comporá o ganho de capital percebido pela pessoa física no momento da alienação, baixa ou liquidação do investimento.

Com  alteração da legislação houve impactos no planejamento patrimonial, e foram impostas novas regras para a contribuição e transferência de ativos no exterior para ECEs, determinando que, quando realizadas, sejam consideradas a valor de mercado, sendo a diferença entre o valor de mercado e o custo de aquisição considerado renda da pessoa física, sujeita à tributação pelo IRPF no momento da transferência. 

Trusts

A lei também trata da tributação de Trusts no exterior, considerando-os, conforme o disposto no art, 10 da Lei 14.754/2023, como entidades transparentes, de forma que os bens e direitos objeto de Trusts são considerados como de propriedade do instituidor (Settlor) até o momento em que passarem à titularidade do(s) beneficiário(s), mediante distribuição ou falecimento do Settlor, devendo os rendimentos e ganhos de capital relativos aos bens e direitos do Trust também considerados como auferidos pelo titular e sujeitos ao IRPF.

A partir de 01 de janeiro de 2024, a transferência de titularidade do patrimônio do Trust do Settlor ao beneficiário será considerada, conforme o caso, como transmissão a título gratuito ou causa mortis, incidindo o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), eliminando as controvérsias e divergências do entendimento exarado anteriormente pela própria Receita Federal de que tais distribuições seriam rendimentos sujeitos à tributação do Imposto de Renda pelo beneficiário.

As disposições aplicam-se também a contratos regidos por lei estrangeira com características similares às do Trust e que não forem enquadrados como entidades controladas.

Possibilidade de Atualização do valor de bens no exterior

A lei traz, ainda, a possibilidade de o contribuinte optar pela atualização dos bens no exterior ao valor de mercado em 31 de dezembro de 2023 (incluindo o efeito da variação cambial), aplicando-se a alíquota de 8% com recolhimento até 31 de maio de 2024. 

O custo de aquisição dos bens e direitos que tiverem sido adquiridos com rendimentos auferidos originariamente em moeda estrangeira, deverá ser calculado mediante a conversão do valor dos bens e direitos da moeda estrangeira para moeda nacional.

A parcela do capital investido (ou similar) atualizado ao câmbio de 31 de dezembro de 2023 será considerada como Custo de Aquisição Adicional, enquanto a parcela do lucro da ECE será tratada como Crédito de Dividendos a Receber.

A nova legislação altera o regime atual que permitia o diferimento tributário dos lucros das ECEs, que poderia se estender até gerações futuras, enquanto não ocorresse a sua efetiva disponibilização, utilizando de estruturas em paraísos fiscais.

Altera, ainda, as regras dos fundos de investimento no país, em especial os fundos fechados e exclusivos, estabelecendo um regime de tributação periódica (come-cotas). A nova lei entrará em vigor em 1 de janeiro de 2024 e demandará especial atenção nas futuras estruturações societárias que visem o planejamento empresarial e exigirá cuidado e prudência dos contribuintes e seus assessores fiscais e contábeis na análise do conjunto de normas que  regulamentará a legislação nos próximos dias.