Uma recente decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) surpreendeu pelo seu novo posicionamento. A turma, ao analisar um último recurso (um terceiro embargos de declaração em um agravo regimental de uma reclamação constitucional), os ministros foram unânimes para reconsiderar todas as decisões anteriores de cassação do vínculo empregatício reconhecido pela Justiça do Trabalho entre uma empresa e um prestador de serviços, e, ao final, determinou a suspensão do processo.
Na prática, até que exista o desfecho do processo afetado em repercussão geral no Supremo, que trata da licitude da contratação de prestadores de serviços pessoas jurídica ou de trabalhador autônomo (Tema 1.389), o vínculo neste caso fica mantido e o andamento suspenso.
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No caso julgado, a empresa entrou com reclamação constitucional no Supremo contra decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT15), que reconheceu vínculo empregatício entre um prestador e serviços e uma empresa. Em um primeiro momento, a 2ª Turma cassou a decisão e agora, em último recurso, reviu seu posicionamento.
O prestador de serviço tinha recorrido com esses últimos embargos pedindo a suspensão do processo, conforme foi determinado pelo relator do caso em repercussão geral, ministro Gilmar Mendes.
O relator do caso, ministro Edson Fachin, ao analisar o processo, contudo, expôs em seu voto que os precedentes invocados na reclamação (ADPF 324 e Tema 725) trataram da licitude da terceirização. “No julgamento dos paradigmas rechaçou-se a presunção da fraude pela terceirização, mas se anotou que o seu “exercício abusivo” poderia violar a dignidade do trabalhador, de modo que cabe, assim, à Justiça Trabalhista, diante da primazia da realidade, reconhecer os elementos fáticos que denotam a relação de emprego”, diz.
Ante o caráter excepcional da via reclamatória, Fachin destaca que a “jurisprudência consolidou o entendimento segundo o qual a relação de pertinência estrita entre o ato reclamado e o parâmetro de controle é requisito indispensável para o cabimento de reclamação, não sendo possível a sua utilização como sucedâneo recursal”.
Por essa razão, afirma na decisão, que “nos casos de minha relatoria até agora examinados sobre essa temática, venho defendendo o descabimento da reclamação constitucional como instrumento apto a desconstituir vínculos reconhecidos pela Justiça do Trabalho quando essa justiça especializada verifica presentes indícios de fraude, para além dos requisitos dos artigos 2º e 3º da CLT”.
Uma vez que, segundo Fachin, “a via da reclamação não permite a nova valoração de fatos e provas e tampouco a aplicação dos paradigmas para situações que não sejam estritamente condizentes com aquelas neles apreciadas”.
Assim, entendeu que as reclamações “que não estejam fundadas no reconhecimento de ilicitude da terceirização ou na indevida distinção entre atividade meio e atividade fim, mas sim na análise fática levada a efeito pela Justiça do Trabalho quando conclui pela configuração de eventual fraude, com consequente reconhecimento de vínculo laboral, não guardam a estrita com os paradigmas evocados”.
Neste sentido determinou “que sejam acolhidos em parte os presentes embargos de declaração para, emprestando-lhes efeitos infringentes, reformar o acórdão embargado, bem como aqueles decorrentes dos julgamentos dos embargos de declaração e do agravo regimental anteriores, para dar parcial provimento ao agravo regimental para julgar parcialmente procedente a reclamação, a fim de determinar a suspensão do feito de origem, até a apreciação do mérito do Tema 1389 da repercussão geral pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal”.
O caso foi levado ao plenário virtual entre os dias 16 a 23 de maio e a decisão foi unânime ao acompanhar o voto do ministro Fachin. (Rcl 66.883). O processo está em segredo de justiça na Justiça do Trabalho.
De acordo com o advogado que assessora o trabalhador, Ricardo Calcini, do Calcini Advogados, “na prática, o trabalhador permanece com o vínculo de emprego reconhecido pela Justiça do Trabalho, ainda que o processo fique suspenso pelo Tema 1389-STF, mas lhe garante uma vantagem processual de vitória quando tudo estava perdido” Para Calcini, a decisão acende uma luz amarela para as empresas, “pois centenas de decisões de vínculos cassadas via reclamações constitucionais podem ser revistas pelo STF”, diz.
Já advogado que assessora a empresa, Maurício Corrêa da Veiga, do Corrêa da Veiga Advogados, afirma que “esta decisão não faz o menor sentido, pois o caso já havia sido julgado com a procedência da reclamação constitucional e a improcedência do reconhecimento do vínculo de emprego, conforme decisão proferida pelo próprio STF” Para Corrêa da Veiga “há que se falar em suspensão do feito neste momento. E na prática esta suspensão, para o reclamante, representa apenas um adiamento do destino final inevitável que é a improcedência da reclamação trabalhista ou a remessa da causa para a Justiça Comum — o que particularmente, não se espera”.