O Tribunal de Contas da União (TCU) comemora o primeiro ano de sua atuação como promotor de soluções consensuais relacionadas a controvérsias envolvendo órgãos da Administração Pública Federal. Em artigo para a imprensa, o ministro Bruno Dantas, recentemente reeleito presidente do tribunal, exaltou o número expressivo de pedidos de solução consensual recebidos pelo TCU no período e disse que buscará “consolidar e expandir os resultados promissores que a SecexConsenso atingiu em seu primeiro ano”[1].
Mas nem tudo foi festa. Poucos dias antes do primeiro aniversário da autoatribuída competência para promover consensos, o TCU recebeu duras críticas de entidades da sociedade civil, em razão de acordo aprovado por seu Plenário no Acórdão 2.508/2023-Plenário, de 6 de dezembro de 2023.
O acordo busca dar uma solução definitiva às controvérsias travadas entre o Ministério de Minas e Energia, a Aneel e a empresa Karpowership Brasil Energia Ltda. (KPE) na execução de Contratos de Energia de Reserva celebrados em 2021. O conflito foi objeto da primeira experiência do TCU em processo de Solicitação de Solução Consensual (SSC), que originou “acordo preliminar” aprovado pelo Acórdão 1.130/2023-Plenário e teve efeitos até o final de 2023[2]. Ultrapassado este período, foi necessária nova composição.
O recente acordo, aprovado pelo criticado Acórdão 2.508/2023-Plenário, estabeleceu a redução de multas aplicadas à KPE, alteração do volume de produção energética contratado e de outras condições contratuais, manutenção de outorgas anteriormente cassadas pela Aneel e o encerramento de processos administrativos e judiciais. Na decisão que o aprovou, o TCU avalia e avaliza as vantagens da solução, indo bem além do papel de mediador técnico. Segundo o relator do acórdão, ministro Benjamin Zymler, as condições contratuais obtidas nas negociações gerarão uma economia ao consumidor de R$ 740.802.469,81.
A Frente Nacional dos Consumidores de Energia discorda. O presidente da entidade afirmou à imprensa que o acordo terá uma repercussão negativa aos consumidores da ordem de 9,97 bilhões de reais e que estes “não concordam e não se sentem defendidos nessa negociação”[3]. A Abrace Energia, associação que representa grandes consumidores de energia, também foi a público e fez duras críticas ao TCU pelas condições definidas no acordo[4].
Há a percepção de que número expressivo de pedidos de negociação recebidos pelo TCU em 2023 e comemorado por seu presidente na imprensa, foi impulsionado pelo fato de o carimbo do tribunal no acordo afastar a responsabilização pessoal dos gestores por condições negociadas em processo de SSC, salvo se verificada fraude ou dolo.
Já o TCU parece que não ficará imune a questionamentos. Ao (auto) ampliar sua competência e protagonizar as negociações, assumiu grande responsabilidade. Terá que responder aos atores com interesse no objeto da controvérsia e à sociedade sobre as soluções dadas nos acordos.
[1] Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/direito-e-justica/2024/02/6796046-bruno-dantas-um-ano-de-secexconsenso-e-a-meditacao-tecnica-no-tcu.html.
[2] Comentado nesta coluna, em: “TCU e sua consensualidade controladora”.
[3] Ver em: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2023/12/07/tcu-reduz-multas-a-termicas-flutuantes-da-karpowership.ghtml.
[4] Ver em: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/12/entidades-de-energia-contestam-acordo-bilionario-entre-tcu-e-turca-kps.shtml