A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem quatro votos para considerar válida a penhora de salários, aposentadorias, pensões ou saldo de poupança de até 40 salários-mínimos para o pagamento de honorários advocatícios de sucumbência. Há uma divergência, no entanto, entre o voto do relator, ministro Villas Bôas Cueva, e dos demais em relação ao fundamento e, consequentemente, à extensão desta penhora. Até o momento, prevalece a tese de que os honorários possuem natureza de prestação alimentar, inserindo-se na exceção prevista no parágrafo segundo do artigo 833 do Código de Processo Civil.
Seguiu esse entendimento o ministro Luis Felipe Salomão, que proferiu seu voto nesta quarta-feira (21/2). Para ele, o termo prestação alimentícia “não se restringe aos alimentos decorrentes de vínculo familiar, indenizatório ou voluntário, mas sim abrange todas as verbas de caráter alimentar”. De acordo com o ministro, essa interpretação está alinhada à jurisprudência da Casa.
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“Filio-me à corrente dos que entendem que os créditos decorrentes de honorários advocatícios se equiparam a prestação alimentícia e são exceção à regra da impenhorabilidade dos ganhos de natureza alimentar, sendo, portanto, possível a penhora de verbas remuneratórias para o seu pagamento, observando-se a dignidade da pessoa humana e o mínimo existencial”, justificou.
Também votaram nessa linha os ministros Humberto Martins e Raul Araújo, em divergência ao voto do relator. Embora considere ser possível a penhora de salários para o pagamento de honorários, o ministro Villas Bôas Cueva considera que as verbas devidas a advogados, apesar de terem natureza alimentar, não se enquadram como prestação alimentícia, “obrigação periódica de caráter ético-social, normalmente lastreada no princípio da solidariedade entre membros do grupo familiar”.
O ministro ressalta que prestação alimentícia é em favor de uma pessoa de quem efetivamente necessita para garantir sua sobrevivência e de seus dependentes a curtíssimo prazo.
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“Estender tal prerrogativa aos honorários advocatícios e, via de consequência, aos honorários devidos a todos os profissionais liberais implicaria que toda e qualquer verba que guardasse alguma relação com o trabalho do credor, ou com qualquer outra fonte de renda destinada a seu sustento e de sua família, também deveria ser reconhecida como tal, tornando regra a exceção que o legislador reservou apenas para as situações extremas”, argumenta.
Possibilidade de penhora
Antes do julgamento ter sido suspenso nesta quarta-feira por pedido de vista do ministro João Otávio Noronha, que se tornou uma vista coletiva, Cueva fez uma ressalva. O ministro pontuou que, qualquer que seja o resultado, “não se retira ao profissional do direito, ao advogado, a possibilidade da penhora de parte das verbas remuneratórias, que são elencadas no artigo 4º do artigo 833, desde que seja preservado o percentual capaz de dar o alívio de dignidade do devedor e da sua família, como já julgado em um dos casos aqui na corte especial”.
“Em qualquer hipótese, portanto, independentemente da natureza jurídica do crédito executado, será possível, em tese, a penhora de parte das verbas de caráter remuneratório especificadas no artigo 4º do artigo 833 do CPC. Caso se verifique, a partir da análise do caso concretamente examinado, que o ato de contrição judicial não retira do devedor a capacidade de manutenção de um mínimo existencial e de um padrão de vida digno em favor dele próprio e de seus dependentes”, completou.
Ao votar, o ministro citou o julgamento do EREsp 1.874.222, em abril do ano passado, no qual a Corte Especial do STJ definiu que é possível penhorar o salário do devedor até mesmo para dívidas não alimentares, desde que não se comprometa a dignidade ou subsistência do devedor e sua família. Esta regra, portanto, também valeria para os honorários advocatícios.
Ao JOTA, a especialista em Processo Civil e líder em Recuperação de Créditos do Albuquerque Melo Advogados, Renata Belmonte, afirmou que a diferença prática entre o voto do relator e o dos demais ministros está relacionada ao momento da penhora. Ela explica que há um entendimento jurisprudencial de que os honorários advocatícios sucumbenciais compõem uma verba de natureza alimentar, que é diferente de uma prestação alimentícia, em que o pagamento é obrigado a ser feito mensalmente para garantia da sobrevivência.
“Uma verba de natureza alimentar só é penhorada ao fim da execução. Por quê? Porque a execução tem uma regra para seguir. Você só vai conseguir chegar ao salário se a pessoa não pagar voluntariamente. A Justiça vai tentar uma penhora na conta, de um veículo ou outro bem. Se chegar ao fim e o pagamento não foi feito, então é possível penhorar parte do salário. Agora, se você está falando de uma prestação alimentícia, o salário será penhorado logo no começo da execução”, afirma.
O julgamento ocorre nos REsp 1.954.380 e REsp 1.954.382.