Revisão da vida toda: após voto de Zanin, processo corre risco de retornar ao STJ

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O voto do ministro Cristiano Zanin no julgamento dos embargos de declaração da revisão da vida toda abre a possibilidade de o processo retornar ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), caso seu voto seja seguido pela maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Isso porque, ao acolher a alegação de nulidade do acórdão do STJ proposta pelo INSS, o ministro aponta uma possível falha na condução da ação no Tribunal. 

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Em seu voto, Zanin afirma que na tramitação do processo ouve uma inobservância da reserva de plenário prevista no art. 97 da Constituição da República. Para ele, esse tipo de processo deveria ter sido julgado pelo plenário do Tribunal e não por um colegiado. No caso, a decisão é oriunda da Primeira Seção do Tribunal da Cidadania. A cláusula de reserva de plenário é uma regra segundo a qual as Cortes só poderão declarar a inconstitucionalidade de uma lei ou norma pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos integrantes do órgão especial.

“A meu ver, ao definir a tese de que o segurado pode optar pela regra definitiva prevista no art. 29, I e II da Lei n. 8.213/1991, para fins de apuração do salário de benefício, quando mais favorável do que a regra de transição contida no art. 3o da Lei n. 9.876/1999, a Primeira Seção do Tribunal da Cidadania exerceu controle de constitucionalidade de lei nos exatos termos em que vedado pelo art. 97 da Constituição da República”, afirma o ministro em seu voto.

Com esse argumento, Zanin propõe que o processo seja devolvido ao STJ para um novo julgamento. Até então, o Supremo havia referendado a decisão da 1ª Seção do STJ, que validou a possibilidade de se aplicar a regra mais favorável aos segurados do INSS para o cálculo da aposentadoria.

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O voto altera a posição do ministro Ricardo Lewandowski, hoje aposentado, e antecessor de Zanin. Em fase anterior do julgamento, Lewandowski havia seguido o voto do relator, que não identificou violação à cláusula de reserva de plenário. Como ao seguir o voto do relator, Lewandowski não se pronunciou especificamente sobre a reserva de plenário, Zanin entendeu poderia acolher o argumento do INSS.

Críticas ao voto de Zanin

O posicionamento de Zanin, no entanto, vem sendo alvo de críticas de entidades como o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Em nota, o IDBP, em conjunto com o Instituto de Estudos Previdenciário (Ieprev), afirma que o voto revogaria “não apenas a decisão de mérito proferida pelo Min. Ricardo Lewandowski (seu predecessor), como também de todo o colegiado”. 

“Tanto não houve omissão que no julgamento do mérito, em Plenário Presencial, o Min. Luiz Fux (divergente) propõe à anterior Presidente da Casa, Min. Rosa Weber, que seria possível, em respeito à delicadeza do Tema (por versar sobre grupo vulnerável e hipossuficiente) e à celeridade, desconsiderar qualquer suposta ofensa à cláusula de plenário que teria ocorrido pelo STJ. Decerto, por ter ocupado a cadeira recentemente, o Min. Cristiano Zanin não teve tempo hábil para assistir, na íntegra, o julgamento presencial do Tema”, afirmam.

Já a OAB pediu ao Supremo a manutenção do voto de Lewandowski e o reconhecimento de impossibilidade de rediscussão do mérito em embargos de declaração. A entidade sustenta que tanto o regimento interno do Supremo como o Código de Processo Civil não permitem que um novo ministro anule um voto já proferido pela cadeira ocupada por um ministro aposentado. A OAB solicitou ainda ao Tribunal que discuta a questão de ordem antes de dar seguimento ao julgamento dos embargos declaratórios.

“Não há fato novo ou superveniente que permita a votação do Min. Zanin quanto ao suposto desrespeito à reserva de plenário. Cogitar eventual anulação do julgamento do tema 999 do STJ após decisão por maioria, com votação em plenário virtual e presencial, se revela notório desrespeito às decisões colegiadas, além de subverter os comandos constitucionais da segurança jurídica e do juiz natural”, pontua nota da entidade. 

Modulação de efeitos e impacto no orçamento

Outro pedido feito pelo INSS nos embargos de declaração foi, caso a nulidade do acórdão não seja aceita, que a Corte estabeleça a modulação de efeitos da decisão. Neste caso, o ministro Alexandre de Moraes, relator do RE 1.276.977, votou para excluir do entendimento firmado pelo STF a revisão de benefícios previdenciários já extintos e a revisão retroativa de parcelas de benefícios já pagas e quitadas por força de decisão já transitada em julgado. Para o Iprev e o IBDP, esse é o entendimento que deve ser mantido. 

Em relação à modulação de efeitos, Zanin afirma que, caso seja vencido na posição por anular o acórdão, é necessária a manutenção dos benefícios previdenciários pagos com base no entendimento vigente até a publicação da ata de julgamento do acórdão embargado, sem qualquer alteração. Para ele, autorizar o pagamento de valores retroativos colocaria em risco o equilíbrio financeiro e atuarial do Regime Geral de Previdência Social.

À época do julgamento que reconheceu o direito à revisão da vida toda aos aposentados, a preocupação em relação ao equilíbrio financeiro da União também foi mencionada. Em nota, o então Ministério da Economia projetou impacto de R$ 360 bilhões em 15 anos. Já aposentados representados pelo grupo “Lesados pelo INSS Revisão da Vida Toda” estimam o impacto entre R$ 2,7 bilhões e R$ 5,5 bilhões nos gastos federais com Previdência, conforme a mediana do indicador de inflação.

O INSS também alega que a decisão gera problemas operacionais. Um deles é o aumento da fila que, segundo o órgão, já está em 5 milhões de atendimentos pendentes e, com a possibilidade de recálculo das aposentadorias, tende a crescer. Aponta também que não tem o aparato tecnológico de software necessário, nem condições físicas para atender integralmente ao comando judicial.

Retorno à pauta

O julgamento dos embargos de declaração ocorria em sessão virtual até Alexandre de Moraes pedir destaque. O placar estava em 4 a 3 contra o reconhecimento da omissão do STF quanto à alegação de inobservância, pelo STJ, da cláusula de reserva de plenário. Além de Moraes e Weber, votaram a favor apenas da modulação de efeitos Cármen Lúcia e Edson Fachin. Já o voto de Zanin foi acompanhado pelos ministros Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli.

Depois do destaque de Moraes, o caso da revisão da vida toda será retomado no plenário físico do STF, de forma que o julgamento será reiniciado. O tema está na pauta de julgamento desta quinta-feira (1/2).