Responsabilidade nas acusações de assédio no local de trabalho

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Nos últimos anos, as acusações de assédio moral e sexual no ambiente de trabalho têm ganhado destaque, sendo tratadas com seriedade por empresas, investidores e o público em geral.

A crescente conscientização sobre a gravidade dessas práticas trouxe avanços significativos na proteção das vítimas, mas também revelou desafios complexos, como a responsabilidade de apurações justas, os danos causados por falsas acusações e as consequências para todos os envolvidos, direta ou indiretamente.

Precisamos ter em mente a importância de uma abordagem responsável e profissional na apuração de denúncias de assédio, os impactos de falsas acusações na reputação profissional e os desdobramentos jurídicos e éticos para aqueles que participam ou acobertam condutas indevidas.

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A sociedade atual exige que empresas adotem políticas robustas de compliance, com canais de denúncia eficazes e procedimentos claros para apuração de condutas indevidas. A Resolução 351/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por exemplo, institui a Política de Prevenção e Combate ao Assédio Moral, Sexual e Discriminação no âmbito do Judiciário, destacando a importância de sigilo, profissionalismo e acolhimento às vítimas.

No entanto, a apuração de denúncias deve ser conduzida com rigor e imparcialidade para evitar injustiças. É fundamental que os culpados sejam devidamente identificados e que não haja tratamento desigual entre indivíduos com condutas semelhantes. A falta de clareza ou negligência na investigação pode resultar em punições injustas ou na perpetuação de ambientes tóxicos, onde o assédio é tolerado ou mal interpretado.

Responsabilidade de participantes indiretos

Um aspecto menos discutido, mas igualmente relevante, é a responsabilidade de indivíduos que, sem cometer diretamente o assédio, participam ou acobertam condutas indevidas.

Por exemplo, em situações onde uma pessoa faz um comentário racista, homofóbico, ou de qualquer forma discriminatório em um grupo e outra ri ou permanece em silêncio, surge a questão: até que ponto esses indivíduos são cúmplices?

No contexto trabalhista, a aplicação de penalidades exige requisitos específicos, em especial para a pena mais grave, que é a despedida por justa causa. A empresa deve observar a gradação das penas e garantir tratamento isonômico a todos os seus empregados que tenham tido conduta equivalente.

Em um caso recente analisado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, um empregado conseguiu reverter a justa causa recebida pois, apesar do Tribunal reconhecer a gravidade de sua conduta, ligada ao contexto da prática de homofobia, foi observado que os demais empregados envolvidos no mesmo contexto receberam mera advertência. A decisão destacou que a empresa violou o princípio da isonomia ao imputar a penalidade máxima apenas ao autor da ação, sem justificativa para o tratamento desigual em relação aos demais empregados.

Falsas acusações: danos à reputação e recolocação profissional

Enquanto o combate ao assédio é essencial, falsas acusações representam um problema grave, com impactos devastadores na vida profissional e pessoal dos acusados.

Um caso emblemático julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em São Paulo, expõe a situação de um empregado que foi infundadamente acusado de assédio sexual, sendo rotulado como “tarado” ou “assediador” no ambiente de trabalho. A difamação se espalhou, resultando em pichações em banheiros com referências pejorativas e sérios prejuízos à sua reputação, saúde mental e vida familiar.

O tribunal reconheceu o dano moral e condenou a empresa por sua negligência na apuração, destacando a responsabilidade do empregador em evitar a propagação de boatos infundados.

Falsas acusações podem surgir em diversos contextos, incluindo o chamado “assédio sexual de revanche”. Esse fenômeno ocorre quando, por exemplo, após o término de um relacionamento, uma das partes, inconformada, faz denúncias infundadas de assédio como forma de vingança. Tais situações são particularmente delicadas, pois misturam questões pessoais e profissionais, exigindo das empresas uma apuração meticulosa para distinguir fatos de alegações motivadas por má-fé.

A ausência de provas robustas, como mensagens, gravações ou testemunhas, pode dificultar a comprovação do assédio, mas também a defesa do acusado, que muitas vezes enfrenta o estigma social antes mesmo de um julgamento formal.

Os danos à reputação profissional causados por falsas acusações frequentemente dificultam a recolocação no mercado de trabalho. Profissionais acusados, mesmo que absolvidos, podem ser evitados por empregadores devido ao receio de controvérsias. Além disso, o impacto psicológico, incluindo ansiedade, depressão e isolamento social, pode comprometer a capacidade do indivíduo de retomar sua carreira.

A Justiça do Trabalho tem concedido indenizações por danos morais em casos de falsas acusações, mas a reparação financeira nem sempre compensa os prejuízos intangíveis.

O papel das empresas na apuração de denúncias

As empresas têm um papel central na prevenção e apuração de denúncias de assédio. A adoção de políticas internas claras, canais de denúncia confidenciais e treinamentos regulares é essencial para criar um ambiente de trabalho seguro e ético.

A Portaria MPT 4219/2022 reforça a obrigatoriedade de normas de conduta e procedimentos para apuração, garantindo o anonimato do denunciante e a proteção contra represálias. No entanto, as empresas devem ir além do cumprimento legal, agindo com humanidade, imediatidade, sigilo e profissionalismo.

A apuração deve ser conduzida por profissionais capacitados, preferencialmente com apoio de comissões internas ou consultorias externas, para garantir imparcialidade.

A documentação detalhada de cada etapa do processo é crucial, tanto para embasar as decisões tomadas pela empresa, quanto para proteger a empresa em eventuais ações judiciais.

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É importante ressaltar que a função da empresa não é substituir o Judiciário na esfera criminal, mas sim apurar os fatos no âmbito trabalhista, aplicando penalidades como advertências, suspensões ou demissões, quando necessário.

Conscientização e consequências para os envolvidos

Para todos os envolvidos, direta ou indiretamente, é fundamental compreender a postura esperada no ambiente de trabalho. Comentários, piadas ou omissões que contribuam para um ambiente hostil podem ter consequências graves, desde sanções disciplinares até processos judiciais.

A conscientização sobre os impactos de acusações, verdadeiras ou falsas, deve ser promovida por meio de treinamentos e campanhas internas, que reforcem a importância do respeito, da ética e da responsabilidade.

A apuração das acusações de assédio no local de trabalho exige um equilíbrio delicado entre a proteção das vítimas e a garantia de justiça para todos os envolvidos. Empresas devem adotar uma abordagem profissional, sigilosa e humana na apuração de denúncias, documentando cada etapa e aplicando penalidades trabalhistas com base em provas concretas, o que é facilitado se houver assessoria profissional especializada.

A conscientização coletiva, aliada a políticas robustas de compliance, e a efetividade em sua apuração e penalização são a chave para promover ambientes de trabalho respeitosos e justos, onde a dignidade humana seja preservada e as consequências de ações sejam devidamente enfrentadas.