Resolução de conflitos poderia destravar R$ 30 bi em investimentos, aponta BNDES

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O crescimento da arbitragem na administração pública federal pode ser fator central para aumento de investimentos, geração de empregos e outras  à economia brasileira. Esta é a conclusão de árbitros, advogados e juristas que participaram de um seminário sobre arbitragem, segurança jurídica e desenvolvimento na sede do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no Rio de Janeiro, nesta quarta-feira (7/8).

Organizado pelo BNDES e pelo Conselhos Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro (OAB-RJ), esta é a segunda edição do evento aberto para discutir os temas. Desta vez, o encontro fez parte da Rio Arbitration Week 2024 (RJAW 2024) e teve como foco a arbitragem voltada para setores regulados – como de energia, telecomunicações, saneamento e transportes.

Segundo dados do BNDES, apresentados na abertura, o setor de infraestrutura no Brasil investe, atualmente, cerca de R$ 250 bilhões por ano em novos projetos. E, com a resolução de conflitos jurídicos, poderia destravar outros R$ 30 bilhões em investimentos.

“Quando se fala de conflitos intragovernamentais e entre governo e um setor regulado, se trata de um potencial que significaria elevar em mais de 15% os investimentos. Esse aumento só com a solução de conflitos jurídicos em setores regulados”, explicou o diretor jurídico do BNDES, Walter Baère.

Por isso, há enorme potencial econômico em encontrar soluções para conflitos nessa seara. Os setores regulados no Brasil atualmente representam retorno de 20% do Produto Interno Bruto (PIB), com o país tendo a expectativa de alcançar R$ 11,5 de trilhões no índice, ainda conforme dados reunidos pelo BNDES.

Dessa forma, cerca de R$ 2,3 trilhões do PIB nacional está no setor regulado. Outro dado importante aponta que os setores regulados são, também, responsáveis pelo maior percentual da geração de empregos formais no Brasil.

A resolução de conflitos seria um modo de abrir espaço para esse potencial aumento do PIB. “Novos investimentos e melhoria da competitividade passam por destravar os entraves jurídicos e conflitos existentes. Para isso, temos alguns desafios que merecem algumas reflexões, já com a experiência exitosa da arbitragem no Brasil há três décadas e com a consolidação da administração pública como um participante”, completou Baère.

Arbitragem como pauta de Desenvolvimento

A árbitra Selma Maria Ferreira Lemes, autoridade no tema e coautora técnica da Lei de Arbitragem, de 1996, destacou o papel da arbitragem ao lado da administração pública.

A arbitragem é um mecanismo extrajudicial de solução de conflitos empresariais. Por ser menos burocrático, o processo arbitral costuma ser mais ágil do que uma ação judicial. Na arbitragem, as partes em disputa concordam, em uma cláusula de arbitragem, em submeter a controvérsia a um árbitro ou a um tribunal privado, que, ao final do processo, deve decidir quem tem razão.

Na visão de Lemes, ela acaba funcionando como ferramenta de fomento, uma vez que o ambiente de segurança jurídica produzido pode reduzir custos, que podem ser converter é investimentos. Da mesma forma, produz transparência, o que é fundamental em se tratando de instituições públicas ou sociedades de capital misto.

Ainda, o uso da arbitragem pela Administração Pública seria importante peça para o desenvolvimento nacional. “Geralmente, ela está presente em contratos de infraestruturas, como parcerias público-privadas e de concessão. A previsão de cláusula de arbitragem traz economia nos custos de transação, o que acaba repercutindo no valor final do contrato. Com arbitragem, já se tem uma previsão de que surgindo os conflitos, será possível resolver com mais rapidez”, avaliou Lemes.

A sobrecarga do Judiciário no país, que compromete a celeridade dos processos, também foi apontada como um dos motivos que tornam vantajosa a arbitragem brasileira no ambiente dos setores regulados e da administração pública. Para a vice-presidente da OAB-RJ, Ana Tereza Basílio os investidores buscam segurança de que os pactos sejam cumpridos, estabilidade que é facilitada por meio da arbitragem.

“De modo geral, o que foi pactuado tem um peso muito especial na arbitragem. Os árbitros respeitam o que foi acordado pelas partes. Isso é uma fonte de atração de investimentos para o Brasil”, disse.

Papel do poder público

O árbitro e professor Carlos Alberto Carmona relembrou que o poder público, antes encarado como um ator externo, é, hoje, visto normalmente como um ator nos processos de conciliação. E que a resolução por árbitros – que conhecem as especificidades dos temas tratados –, evita prejuízos para a sociedade, como obras paralisadas, licitações suspensas e atrasos em entregas

“Os resultados são muito satisfatórios, na medida em que a administração pública sente que consegue contestar em igualdade. E, portanto, consegue ver analisados os seus argumentos com propriedade pelos árbitros. Isso é bem confortável em termo de segurança jurídica”, afirmou.

O árbitro José Emílio Nunes Pinto ressaltou que a administração pública teve importante contribuição para o que ele caracteriza como “ressurgimento de arbitragem” e na consolidação do instrumento extrajudicial. Mas até chegar a este momento de contribuição entre as partes, foi necessário superar diversos obstáculos até a aceitação da prática naquele ambiente.

“É interessante perceber o crescimento da arbitragem no âmbito da administração pública, notadamente nos setores regulados”, disse ele, pensando no retrospecto desde que o projeto que daria origem à Lei da Arbitragem começou a ser discutido no Congresso, há três décadas.

“Havia poucos entusiastas de que a arbitragem na administração pública era viável. Naquele momento, não se tinha certeza inicial se a arbitragem era constitucional no campo da administração pública”, relembrou.

“A administração pública no início era contrária a arbitragem. Depois se tornou parceira e depois amiga”, resumiu Pedro Batista Martins, árbitro e outro ator importante por trás da criação da Lei da Arbitragem.