O Supremo Tribunal Federal (STF) negou seguimento ao recurso extraordinário do caso que discutia o uso de banheiros públicos por pessoas trans e cancelou a repercussão geral que havia sido reconhecida. Ao devolver o voto-vista, o ministro Luiz Fux abriu a divergência ao defender que a ação não tratava de questão constitucional. Ele foi seguido por outros sete colegas.
Vencido, o relator, ministro Luís Roberto Barroso, considerou que a Corte deveria julgar o caso. “A questão processual não afasta a discussão da tese reconhecida como de repercussão geral”, disse o presidente da Corte, que foi seguido por Edson Fachin e Cármen Lúcia.
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“Essa questão é claramente constitucional. Estamos lidando com a minoria mais estigmatizada da sociedade brasileira, mais constante vítima da violência. Portanto, proteger grupos vulneráveis é por definição um dos principais papéis do STF”, defendeu.
Votaram pela improcedência do recurso e pelo cancelamento da repercussão geral os ministros Luiz Fux, Flávio Dino, Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.
Em 2014, o STF iniciou o julgamento do caso de uma mulher trans que foi retirada de dentro do banheiro feminino por seguranças de um shopping de Santa Catarina. Na ocasião, o relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, defendeu a repercussão geral do tema, que havia sido reconhecida pela maioria do plenário.
Em 2015, ao julgar o mérito do recurso, Barroso votou pela fixação da seguinte tese: “Os transexuais têm direito a serem tratados socialmente de acordo com a sua identidade de gênero, inclusive na utilização de banheiros de acesso público”. Edson Fachin, acompanhou o voto e propôs indenização fixada em R$50 mil.
Na ocasião, o ministro Luiz Fux paralisou o julgamento com um peido de vista que reverberou as divergências entre os integrantes da Corte. Na ocasião, Fux disse que havia um desacordo moral razoável na sociedade sobre este tema e que seria necessário ouvi-la.
Na sessão desta quinta-feira (6/6), ao devolver o voto-vista, Fux defendeu a revisão da repercussão geral definida pelo plenário em 2014. Para o ministro, o caso em questão não apresenta fundamento constitucional para intervenção do STF. “Não somos um tribunal de apelação, somos uma Corte em que o efeito devolutivo é sob efeito constitucional”, defendeu.
Segundo o ministro, a fundamentação do recurso se restringiu à revisão do acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC), que entendeu que não havia provas de que a abordagem dos seguranças foi agressiva e impulsionada por transfobia. Fux sustenta que o acórdão não abordou questões constitucionais.
“A relevância social da discussão em tese por si só, não pode conduzir ao abandono dos limites impostos pela sistemática processual para conhecimento das questões por este Supremo Tribunal Federal sob pena de enfraquecimento da própria lógica do sistema de precedentes”, sustentou.
O ministro Barroso se pronunciou e defendeu que o caso apresenta questões constitucionais sobre o direito das pessoas trans a serem tratadas pela identidade de gênero. Além disso, afirmou que nos embargos de declaração do acórdão houve prequestionamento constitucional.
Ao acompanhar a divergência, Flávio Dino entendeu que no caso concreto a questão constitucional não é ventilada e que a sentença foi lastreada no Código de Defesa do Consumidor. “Temos que ser coerentes na nossa jurisprudência. O Supremo pode muito mas não pode tudo”, considerou.
A ministra Cármen Lucia, que acompanhou o voto de Barroso, adiantou que há uma ADPF sobre o mesma tema sobre a relatoria dela. Trata-se da ADPF 1.169, movida pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Desta forma, o caso deverá ser julgado no mérito pelos ministros em algum momento.
O julgamento ocorreu no RE 845.779.