2023 foi um ano em que a arbitragem foi questionada em vários âmbitos. O instituto sofreu severas críticas: seja no âmbito legislativo, com a continuidade da tramitação do Projeto de Lei 3.293/21, conhecido como “PL antiarbitragem”, seja no âmbito judiciário, com a tramitação da ADPF 1.050 perante o Supremo Tribunal Federal a respeito do dever de revelação dos árbitros.
Os ataques se espalharam até mesmo em alguns eventos, como posicionamentos exarados em congresso ocorrido no fim do ano em Brasília e a disseminação da cultura de impugnação às sentenças arbitrais por meio da ação anulatória.
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Apesar disso, a perspectiva é que a arbitragem continue a crescer em 2024. É que, ao se aprofundar sobre os questionamentos apontados, não se encontram fundamentos válidos e aptos a ameaçar a longevidade desse mecanismo de resolução de controvérsias regulado pela Lei 9.307/1996.
A arbitragem vem sendo utilizada de forma crescente como método adequado de solução de litígios, o que, no Brasil, é essencial diante da incapacidade do Poder Judiciário de lidar com todo o volume e a complexidade de lides que lhe são endereçadas. Tendo como base a autonomia privada, essa via permite que as partes contratantes acordem sobre quem julgará a demanda, qual será a sede, em qual câmara tramitará o procedimento, os prazos que serão observados, dentre outras nuances que asseguram sua efetividade.
Segundo a célebre pesquisa “Arbitragem em Números” realizada pela Professora Selma Ferreira Lemes e pelo Canal Arbitragem, com auxílio de Vera Barros e Bruno Hellmeister, houve um aumento de 4% de arbitragens entrantes de 2021 para 2022.
Mesmo tendo sido revelado pela pesquisa que os valores das arbitragens entrantes foram reduzidos em 28% de 2021 para 2022, ainda assim houve incremento na quantidade de procedimentos iniciados. Nota-se, também, que as arbitragens entrantes são lideradas pelas matérias societária e de construção civil e energia, áreas propulsoras da economia que têm se valido cada vez mais da arbitragem. Assim, com o crescimento das áreas, consequentemente a via mais utilizada para resolução de litígios também cresce.
E, quando a análise empírica se volta para a realidade das ações judiciais que questionam a validade das sentenças arbitrais – isto é, as ações anulatórias – o resultado não confirma a intensidade das críticas disseminadas, tampouco dos injustificados ataques sofridos por esse método adequado de solução de controvérsias.
Conforme o relatório “Processos Relacionados à Arbitragem: um levantamento do banco de sentenças do TJSP” divulgado em 22 de novembro de 2023 pela Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ) em parceria com o Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr), apenas uma a cada 66 decisões arbitrais é anulada pelo Poder Judiciário.
A pesquisa foi conduzida entre 2018 e 2022 nas varas especializadas em direito empresarial da justiça de São Paulo. Foram analisados 289 processos, sendo que 93 eram ações anulatórias e, dessas, 59 eram referentes a contratos de colaboração, nos quais há grande assimetria e dependência entre as partes (por exemplo, em um contrato de franquia).
Como bem pontuado pelo presidente do CBAr, André Abudd, o resultado da pesquisa revela que “o Judiciário tem sido chamado a intervir mais para dar suporte do que para controlar a arbitragem”, de modo que se conclui pela solidez da arbitragem, apesar de todos os ataques sofridos.
Se as ações anulatórias chegaram a ser uma ameaça, os números demonstram que não têm mais sido, na prática. Isso também revela que esse tipo de via está sendo corretamente aplicado como via excepcional de impugnação que é – ainda que não se possa ter tranquilidade quanto a isso.
Dessa forma, verifica-se que a tendência é, em um médio prazo, o aumento da respeitabilidade da arbitragem, influenciado pelo comportamento do Poder Judiciário em rechaçar as ações anulatórias de sentenças arbitrais ajuizadas indevidamente.
Afinal, um dos atrativos que faz as partes contratantes optarem por essa via de solução de litígios é, justamente, a segurança jurídica.
Outro fator que faz concluir pelo contínuo crescimento da arbitragem em 2024 é o fato de que o Poder Judiciário não está conseguindo absorver todas as demandas. Para além das notoriedades sobre o assunto, nunca é demais lembrar os desabafos feitos pelos ministros do Superior Tribunal de Justiça no fim de 2023 a respeito dos inúmeros recursos, das incontáveis sustentações orais e da impossibilidade de apreciação de todos os feitos.
Nesse ponto, a arbitragem volta a suprir o gargalo da vazão do Poder Judiciário, e ainda o faz com qualidade técnica nas decisões, considerando-se a especialidade dos árbitros escolhidos pelas partes para julgar as causas.
Por todas essas razões, a aposta é pelo contínuo crescimento da arbitragem em 2024, suplantando as ameaças e ataques, com aprimoramento a partir das críticas recebidas.