Política europeia para fomento do hidrogênio verde ganha tração

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A estratégia da União Europeia para impulsionar o mercado de hidrogênio verde (H2V) é crucial na transição energética europeia e global e se situa como um dos pilares do Green Deal europeu. O bloco econômico pretende importar 10 milhões de toneladas de hidrogênio renovável até 2030, o que se estima em torno de 40% do mercado global, de acordo com a Agência Internacional de Energia (mais informações sobre a estratégia da União Europeia para o hidrogênio verde aqui).

Nesse contexto, diversas ações têm sido implementadas para impulsionar a indústria, visando equilibrar desbalanços entre oferta e demanda nesse mercado nascente. O tema estava na ordem do dia na recém concluída Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 28), que foi marcado por pronunciamentos importantes do setor público e privado a respeito pelo engajamento robusto e continuado para fomentar a produção e reduzir limitações de financiamento dos investimentos intensivos em capital.

As ações empreendidas pela Europa não apenas delineiam o futuro energético do continente, mas também exercem um impacto direto sobre o Brasil, que é reconhecido como um parceiro estratégico nessa empreitada, já que a Europa enfrenta limites para produção doméstica. Projetos de financiamento e subsídios assumirão um papel ainda mais proeminente em 2024, incluindo projetos situados além das fronteiras do continente europeu.

Subvenções por meio de leilões de compra

A Comissão Europeia lançou o primeiro leilão europeu destinado a subsidiar a produção de hidrogênio verde. Por meio do Banco Europeu de Hidrogênio, será alocado um orçamento de € 800 milhões para a iniciativa. Projetos que visem uma nova capacidade instalada de, no mínimo, 5 MW estão habilitados a submeter propostas para receber, por um período de até dez anos, um subsídio fixo de até € 4,50 por quilo de hidrogênio verde.

A experiência obtida no primeiro leilão piloto servirá para aprimorar os leilões futuros, incluindo um já anunciado para 2024, com orçamento esperado de € 2,2 bilhões, conforme anunciado pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, no âmbito da Semana do Hidrogênio Verde da União Europeia de 2023.

O leilão piloto é restrito para projetos estabelecidos no âmbito da União Europeia, mas há previsão de ampliar esse mecanismo de fomento para abranger projetos localizados além das fronteiras europeias, beneficiando assim países com elevado potencial produtivo como o Brasil.

Na Alemanha, a subvenção a projetos de hidrogênio verde fora da União Europeia já é uma realidade. O mecanismo conhecido por H2Global consiste em leilões de compra que subvencionam a diferença entre os preços de oferta (com produção e transporte) e os preços de demanda. O primeiro leilão foi lançado em 2023 e outros estão previstos para 2024. Além disso, há discussões bilaterais em curso entre Alemanha e Holanda, e multilaterais entre Alemanha e Comissão Europeia, para promover leilões para importação de hidrogênio verde de forma conjunta por meio do mecanismo H2Global.

Financiamentos: Fundo de Desenvolvimento PtX da KfW

O banco de desenvolvimento da Alemanha (KfW, na sigla em alemão) lançou durante a COP 28 o PtX Development Fund, um fundo de desenvolvimento específico para a indústria de hidrogênio verde, que prevê subsídios não reembolsáveis de € 270 milhões para projetos novos relacionados à cadeia de valor Power-to-X. Projetos interessados devem manifestar interesse até 1º de março de 2024. O termo diz respeito a tecnologias de conversão que tornam eletricidade originária de fontes renováveis em diversos produtos como o próprio hidrogênio, combustíveis (e-SAF, metanol), produtos químicos (amônia), fertilizantes etc.

A iniciativa contempla sete países, entre eles o Brasil[1]. Além disso, os projetos devem ter nível de maturidade industrial em qualquer fase da cadeia de valor, incluindo produção, processamento, armazenamento, transporte, distribuição e aplicação de tecnologias. As partes interessadas podem ser entes públicos, privados, joint ventures, parcerias público-privadas (PPP) ou veículo para fins especiais (Special Purpose Vehicle). A figura abaixo ilustra a cadeia de valor contemplada:

Fonte: PtX Development Fund, Memorando Informativo, 11 de dezembro de 2023, disponível aqui.

As subvenções podem ser alocadas para despesas de capital, tais como a construção, instalação, modernização ou expansão da infraestrutura de projetos. Além disso, para reduzir o déficit de bancabilidade de projetos dessa natureza, os recursos do fundo podem ser complementados com outras fontes de financiamento oferecidos pela Plataforma PtX do KfW, tais como empréstimos promocionais, financiamentos de capital e de dívida, bem como financiamentos mezzanine.

Conclusões

Diante dos objetivos ambiciosos de  descarbonização da economia global, espera-se o crescimento exponencial de mecanismos de fomento ao desenvolvimento da indústria de hidrogênio verde e seus derivados. Oportunidades não faltam para que o Brasil se beneficie de investimento estrangeiro para alavancar seu potencial produtivo, seja para participar do mercado internacional como grande fornecedor, mas, principalmente, para conduzir sua própria transição energética.

Para além das oportunidades em hubs voltados para exportação, como o do porto do Pecém a atração de investimentos deve considerar o enorme potencial de descarbonização de nossa indústria de base. Polos químicos, siderúrgicos, devem estar também no centro das discussões como locais de produção do H2V. Os estados de São Paulo e Minas Gerais são ótimos exemplos de regiões que deveriam se beneficiar deste momento para se tornarem indústrias verdes, agregando valor ao hidrogênio verde e beneficiando aço verde e amônia verde.

[1] Demais países elegíveis são Egito, Geórgia, Índia, Quênia, Marrocos e África do Sul.