Lançado na última segunda-feira (6/11), o primeiro edital da “Transação 2.0” ficará em consulta pública até 14 de novembro. Ainda, pela primeira vez os contribuintes poderão indicar quais temas poderiam ser alvo de futuras transações.
Ao JOTA, entretanto, a procuradora-geral da Fazenda Nacional, Anelize Ruas de Almeida, antecipou quais assuntos não devem ser aceitos pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), caso constem em sugestões apresentadas por contribuintes: aqueles já resolvidos de forma favorável à Fazenda em repetitivo ou repercussão geral, como a incidência de PIS e Cofins sobre receitas financeiras, e os assuntos “que ainda não estão maduros”, como a tributação dos benefícios de ICMS.
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Almeida falou ao JOTA durante o Congresso Internacional Reforma Tributária: Impactos Econômicos e Jurídicos, promovido pela Escola Superior Dom Helder. A procuradora prevê a publicação, no final de novembro, do edital de transação tributária relacionado à tese da tributação dos lucros de controladas ou coligadas no exterior. No final de dezembro ou, no máximo, no começo de janeiro, será disponibilizada outra transação, com tema escolhido a partir das contribuições colhidas durante a audiência pública.
Os novos programas de transação, salienta a procuradora-geral, terão prazo determinado. “Não estamos abrindo mão das teses”, sintetiza Almeida.
O edital submetido à consulta pública na última segunda-feira abre a possibilidade de transação de débitos discutidos administrativa ou judicialmente relacionados à incidência de IRPJ e CSLL sobre lucros da empresa investidora domiciliada no Brasil auferido por meio da sua investida no exterior, previsto no artigo 74 da MP 2.158-35/2001 e nos artigos 76 a 80 da Lei 12.973/2014.
Segundo a subsecretária de Tributação e Contencioso da Receita Federal do Brasil, Cláudia Lúcia Pimentel Martins da Silva, que participou do lançamento do edital na segunda-feira, há aproximadamente 150 processos na Receita relacionados à tese, somando um estoque de R$ 54 bilhões em discussão. Há outros 50 na PGFN, com valor entre R$ 14 bilhões e R$ 15 bilhões. A Receita Federal não divulgou uma estimativa de arrecadação para 2024 especificamente com essa tese. O governo, por outro lado, mantém a previsão de arrecadação de R$ 12 bilhões em 2024 com o conjunto de editais de transação tributária que serão lançados até o ano que vem.
De acordo com Anelize, apesar de originalmente estarem sendo estudados temas relacionados ao PIS e à Cofins para a abertura da transação, os lucros de controladas “passaram na frente”, entre outros pontos, pela grandeza do contencioso relacionado ao debate. Ainda, o assunto constava em uma lista encaminhada à PGFN pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) com temas que poderiam ser alvo de editais de transação tributária.
Apesar de a consulta pública ter sido levada à frente pela Advocacia-Geral da União (AGU), Anelize diz que a análise das sugestões apresentadas e a inclusão dos temas nos próximos editais ficarão a cargo da PGFN e da Receita.
Em relação aos assuntos dos próximos programas, a procuradora afirma que o conceito de insumo de PIS e Cofins ainda está no radar. O debate, que é frequente em processos administrativos e judiciais, gira em torno do conceito de insumo para a legislação das contribuições, gerando direito a crédito.
Na outra ponta, não devem ser alvo de programas de transação tributária temas que já foram decididos de forma favorável à Fazenda Nacional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por meio de repercussão geral ou pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) sob o rito dos recursos repetitivos.
Como exemplos, Almeida citou o Tema 372 (RE 609096), por meio do qual o STF definiu que incidem PIS e Cofins sobre receitas financeiras. “Qualquer desconto nesse tema é renúncia de receita”, afirmou a procuradora.
Da mesma forma, não faria sentido a abertura de edital relacionado à tese da coisa julgada em matéria tributária. O debate foi levado ao STF por meio dos temas 881 e 885 (REs 949297 e 955227), tendo a Corte definido que uma decisão judicial favorável com trânsito em julgado permitindo o não pagamento de um tributo perde seus efeitos diante de um novo entendimento do Supremo considerando a cobrança constitucional.
Os embargos de declaração dos REs estão em pauta para a próxima quinta-feira (9/11).
Por fim, ao afirmar que não serão abertas transações sobre temas que não estão “maduros”, a procuradora-geral da Fazenda Nacional afastou a possibilidade de criação de um programa relacionado à incidência de IRPJ e CSLL sobre os benefícios fiscais de ICMS. O tema foi analisado pelo STJ por meio dos REsps 1.945.110/RS e 1.987.158/SC, submetidos ao rito dos recursos repetitivos, tendo decidido a 1ª Seção que, desde que cumpridos os requisitos da LC 160/17 e da Lei 12.973/14, incentivos como redução de alíquota e diferimento não podem ser tributados pelo IRPJ e pela CSLL.
A abrangência da decisão, entretanto, ainda é incerta, já que em agosto o governo Federal editou a MP 1185, que cria um crédito fiscal atrelado aos benefícios fiscais de ICMS, que o contribuinte poderá usar por meio de ressarcimento ou compensação. A medida, com produção de efeitos a partir de 1º de janeiro de 2024, ainda precisa ser analisada pelo Congresso.
Segundo Almeida, além de haver uma MP a ser analisada sobre o assunto, a decisão do STJ pode gerar uma “litigância fática” muito grande, ou seja, divergências relacionadas às situações em que os contribuintes cumpriram ou não os termos da decisão da Corte.