PGD: mudando o paradigma do controle de frequência para uma gestão por resultados

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Após a pandemia da Covid-19, o modelo dominante do trabalho no Estado brasileiro vem mudando consideravelmente, devido à necessidade que se impôs de experimentar novas formas de atuação profissional dos servidores. Desde essa crise, a Administração Pública federal percebeu que é possível se organizar e funcionar com mais autonomia, responsabilidade e mais comprometimento nas entregas. Evidências sobre os resultados que este novo modelo de trabalho vem trazendo estão sendo reunidas para em breve serem publicadas.

O Programa de Gestão, já previsto em norma desde 1995, ganhou maior fôlego e foco a partir de 2020, quando se efetivou o Programa de Gestão e Desempenho (PGD), como um programa inovador e indutor de melhoria de desempenho individual e organizacional no serviço público.

O PGD, além de substituir o tradicional controle de frequência e assiduidade pela gestão por resultados, visa à otimização do desempenho institucional para maior eficácia e efetividade da atuação pública em prol da sociedade, ao mesmo tempo que valoriza os agentes públicos ao permitir combinações mais flexíveis de desenvolvimento dos trabalhos e mais aderentes às várias realidades e possibilidades de atuação dos servidores e organizações.

Inicialmente, por meio da Instrução Normativa 24/2023, que regulamentou o Decreto 11.072/2022, o programa conferiu maior poder e autonomia aos órgãos e entidades da administração federal que a ele aderiram, na alocação e gestão do seu corpo funcional. Ao invés de controle burocrático de frequência, as instituições aderentes passam a ter que aperfeiçoar os seus planejamentos para a perseguição dos respectivos objetivos institucionais.

A partir daí se dá o processo de engajamento dos participantes, cuja adesão ao programa depende da assinatura do Termo de Ciência e Responsabilidade (TCR) e da pactuação de planos de trabalho individuais. Esses planos individuais se conectam aos planos de entregas das unidades de execução, e ambos são avaliados periodicamente pelas respectivas instâncias superiores em cada órgão ou entidade – e cada órgão ou entidade, por sua vez, contará com o apoio do Comitê Executivo criado pelo Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), órgão responsável por definir as políticas e diretrizes de gestão de pessoas e de desenvolvimento organizacional para toda a Administração Pública federal.

No PGD, servidores e chefias podem optar pela modalidade mais adequada à execução dos planos e processos de trabalho, vale dizer: presencial, teletrabalho parcial e teletrabalho integral, este sendo possível, sob determinadas condições e permissões da autoridade máxima do órgão, de ser realizado com residência no exterior. Acredita-se que essa flexibilidade nos arranjos laborais carrega em si o potencial de incrementar, simultaneamente, a qualidade de vida no trabalho, a produtividade individual e de equipe e o desempenho organizacional.

Para tanto, é claro, os órgãos e entidades da Administração Pública federal precisarão dedicar maiores esforços e competências à gestão interna de pessoas, valendo-se tanto do apoio institucional e suportes administrativos do MGI, como também de inovações próprias que sejam capazes de produzir e reproduzir ao longo do processo de implementação do PGD.

Por esta razão é que, visando regulamentar situações laborais específicas da gestão de pessoas no âmbito do PGD, foi posteriormente publicada a Instrução Normativa 52/2023, que estabelece orientações a serem observadas pelos órgãos e entidades integrantes do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (Sipec) e do Sistema de Organização e Inovação Institucional do Governo Federal (Siorg).

Dentre as tais orientações, importa destacar aquelas relacionadas à gestão do desempenho dos partícipes do PGD, de tal modo que os respectivos planos de trabalho possam ser avaliados segundo uma escala que varia entre: i) excepcional: plano de trabalho executado muito acima do esperado; ii)  alto desempenho: plano de trabalho executado acima do esperado; iii) adequado: plano de trabalho executado dentro do esperado; iv) inadequado: plano de trabalho executado abaixo do esperado ou parcialmente executado; e v) não executado: plano de trabalho integralmente não executado.

Como política de consequências, no caso de planos de trabalho avaliados como inadequados por execução abaixo do esperado, deverá haver o registro no Termo de Ciência e Responsabilidade (TCR) das ações de melhoria a serem observadas pelo participante, bem como indicação de outras possíveis providências, como ações de desenvolvimento de pessoas, por exemplo. No caso de planos de trabalho avaliados como inadequados por inexecução parcial ou não executado, o plano de trabalho do período subsequente deverá prever a compensação da carga horária correspondente.

Além disso, caberá o desconto na folha de pagamento – após processo recursal e ampla defesa do participante – em dois tipos de ocasiões, a saber: i) nos casos em que a justificativa para o seu plano de trabalho avaliado como inadequado por inexecução (parcial ou integral) não for apresentada ou não for acatada pela chefia da unidade de execução; e ii) quando não houver a compensação (parcial ou integral) da carga horária prevista para o respectivo plano de trabalho não executado, parcial ou integralmente. A inobservância das regras do PGD poderá ensejar a apuração de responsabilidades.

Tudo somado, a combinação de elementos presentes nas IN 24 e 52 de 2023 permite dizer que, finalmente, o governo federal possui um bom embrião para o desenvolvimento e posterior regulamentação de processos avaliativos do desempenho individual na Administração Pública federal, que considerem ao menos cinco premissas fundamentais.

A primeira delas afirma que ambientes de trabalho saudáveis, seguros e sustentáveis são condição necessária para qualquer iniciativa de melhoria do desempenho individual de servidores públicos. Ou seja, a estabilidade funcional e as relações de confiança e colaboração – e não instabilidades e ameaças de demissão ou rebaixamento de qualquer tipo – são fatores que garantem melhorias exitosas e permanentes do desempenho. A segunda das premissas afirma que a maior parte dos servidores públicos responde melhor a incentivos positivos e não pecuniários ao desempenho individual que a processos avaliativos obscuros ou punitivistas.

A terceira premissa garante ser indispensável considerar a dimensão coletiva do desempenho institucional, ainda mais em se tratando de avaliar desempenho no âmbito público, onde tudo o que se produz costuma ter caráter coletivo e intangível, vale dizer, irredutível a métricas individuais ou monetárias tradicionais de avaliação. A quarta premissa reforça a necessidade de se implementar, difundir e praticar avaliações nas quais todos avaliam e são avaliados, inclusive as respectivas chefias, durante períodos e processos contínuos, coletivos e cumulativos de trabalho.

Por fim, a quinta das premissas sugere que a partir da aplicação das condições anteriores é possível (e necessário) identificar e atuar sobre as razões individuais e organizacionais do baixo desempenho, fechando um ciclo completo que se traduz em critérios objetivos e propositivos de avaliação, ao mesmo tempo que em condições de enfrentamento e resolução de problemas ao longo do tempo. Não obstante, é claro que ainda são muitos os desafios enfrentados diante das imagens e narrativas negativas construídas por determinados segmentos da sociedade em relação ao desempenho no serviço público.

Diante disso, atualmente, o MGI vem trabalhando na consolidação de normas e entendimentos para o fortalecimento desta nova abordagem sobre a gestão pública e o desempenho dos servidores e organizações. Para tanto, um primeiro grande desafio consiste em enfrentar e superar a cultura tanto punitivista como fiscalista que infelizmente ainda permeia as discussões e propostas sobre desempenho no setor público federal. A partir disso, em segundo lugar, abre-se a possibilidade de criação e difusão de uma nova e mais promissora abordagem conceitual e prática sobre o desempenho, assentada nas premissas acima indicadas.

Com esse foco reflexivo na aferição do desempenho como processo contínuo, coletivo e cumulativo em diferentes níveis, é possível apurar necessidades para o desenvolvimento permanente de agentes públicos por meio da oferta de ações direcionadas ao desenvolvimento de competências. Neste sentido, a publicação da IN 52/2023, voltada para temas de gestão de pessoas no âmbito do PGD, reforça, junto aos órgãos e entidades da Administração Pública federal, a adoção e a expansão desta inovação, por meio da qual é possível valorizar e reter talentos, além de otimizar serviços públicos indispensáveis à sociedade.

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Pela Secretaria de Gestão de Pessoas (SGP) do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), participaram da elaboração deste artigo: José Celso Cardoso Jr. (Secretário de Gestão de Pessoas), Eduardo Almas (Diretor de Carreiras e Desenvolvimento de Pessoas), Priscila Aquino (Coordenadora-Geral de Gestão e Desempenho de Pessoas), Juliana Loureiro (Analista Técnica de Políticas Sociais)

Pela Secretaria de Gestão e Inovação (SEGES) do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), participaram da elaboração deste artigo: Roberto Pojo (Secretário de Gestão e Inovação), Juliana Legentil, Thaís Brito e Luciana Vieira, todas servidoras lotadas na Diretoria de Inovação da SEGES