Paulo Gonet fala em ‘agir técnico’, sem ‘holofotes’, na posse como PGR

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Paulo Gonet Branco tomou posse como procurador-geral da República nesta segunda-feira (18/12), em cerimônia no auditório Juscelino Kubitschek, na sede da Procuradoria-Geral da República (PGR).

O Senado Federal aprovou a indicação de Gonet para o cargo na última quarta-feira (13/12). O então subprocurador-geral da República e vice-procurador-geral Eleitoral recebeu 65 votos favoráveis e 11 contrários.

Seu nome foi o escolhido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), quem presidiu o ato de posse. Na mesa, também estiveram o vice, Geraldo Alckmin (PSB), o vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e a ex-procuradora-geral da República Elizeta Ramos.

“O Ministério Público é uma instituição tão grande que nenhum procurador tem o direito de brincar com ela. O Ministério Público é de tamanha relevância para a sociedade brasileira e para o processo democrático deste país que um procurador não pode se submeter ao presidente da República, não se submeter ao presidente da Câmara, não pode se submeter ao presidente do Senado, não pode se submeter aos presidentes de outros Poderes, mas também não pode se submeter à manchete de nenhum jornal nem à manchete de um canal de televisão”, discursou Lula durante a cerimônia.

“A única coisa que eu peço a você, em nome do que você representará daqui pra frente na história deste país, é que você só tenha um preocupação: fazer com que a verdade, e somente a verdade, prevaleça, acima de qualquer outro interesse”, prosseguiu.

“Da minha parte, quero lhe dizer publicamente, nunca lhe pedirei um favor pessoal, nunca exercerei, sobre o Ministério Público, qualquer pressão pessoal para que alguma coisa não seja investigada. A única coisa que eu lhe peço, não faça o Ministério Público se diminuir diante da expectativa dos 200 milhões de brasileiros que acreditam nesta instituição. Seja o mais sincero possível, o mais honesto possível, o mais duro possível, mas, ao mesmo tempo, o mais justo possível para a sociedade brasileira”, acrescentou.

Na plateia estavam os ministros do STF Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Nunes Marques, bem como os já aposentados Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski. O futuro ministro do Supremo Flávio Dino, que participou, com Gonet, da sabatina no Senado, também marcou presença.

Paulo Gonet Branco é carioca formado em Direito pela Direito pela Universidade de Brasília (UnB). Obteve o título de mestre em Direitos Humanos Internacionais pela Universidade de Essex (Reino Unido) e retornou à para se tornar doutor em Direito.

No Ministério Público Federal (MPF) desde 1987, foi subprocurador-geral, atuou como diretor-geral da Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU) e exerceu a função de vice-procurador-geral Eleitoral.

Leia abaixo o discurso na íntegra

“Exmo. Sr. Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva

Exmo. Sr.  Presidente do Congresso Nacional Senador Rodrigo Pacheco

Exmo. Sr.  Presidente da Câmara dos Deputados Deputado Arthur Lira

Exmo. Sr.  Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal Ministro Edson Fachin

Exma. Sra. Vice-Presidente do Conselho Superior do Ministério Público Federal, minha antecessora imediata Dra. Elizeta Ramos

Exmo. Sr. Governador do Distrito Federal Governador Ibaneis Rocha

Por meio de Vossas Excelências cumprimento todas as demais pessoas constituídas em autoridade presentes, pedindo vênia para saudar nomeadamente o Decano do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes, o Presidente do Tribunal Superior Eleitoral Ministro Alexandre de Moraes e o meu companheiro de sabatina, Ministro Flavio Dino, que dividiu comigo a mesa da sessão recente da CCJ do Senado, presidida pelo Senador Davi Alcolumbre.

Citando os meus venerandos pais, Francisco e Marly, enfim, cumprimento todos os presentes.

Gostaria de expressar prontamente o meu reconhecimento ao Sr. Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva pela honra com que me distinguiu, nomeando-me para o cargo que assumo. Sou-lhe grato, Senhor Presidente, mais ainda, por nos ter deferido o privilégio da sua presença na sede da PGR, a fim de comandar este ato de posse.

Agradeço também aos Senadores da República que anuíram à indicação que lhes foi submetida.

Agradeço, da mesma forma, a todos os que acorreram a esta cerimônia, que acontece em tão breve lapso de tempo desde que marcada.

Não posso deixar de expressar a minha mais funda gratidão a meus venerandos pais, minha mulher Flávia, meus filhos Pedro, Maria Teresa, João, e José, aqui presentes com os meus demais familiares. A eles devo o que melhor posso oferecer de mim mesmo no cargo que assumo.

É também a eles, nas gerações que representam, a que remonto, quando penso nas imensas responsabilidades que a chefia do Ministério Público da União implica.

Temos um passado a resgatar, um presente a nos dedicar e um futuro a preparar.

O Ministério Público vive momento crucial na cronologia da nossa República democrática. O instante é de reviver na instituição os altos valores constitucionais que inspiraram a sua concepção única na História e no Direito Comparado.

O constituinte de 1988 nos situou como corresponsáveis pela preservação e fomento dos direitos fundamentais individuais e coletivos, dos direitos sociais, das liberdades públicas, da peleja em prol da igualdade e do progresso econômico ecologicamente sustentado. Somos corresponsáveis pela preservação da democracia, estabelecida como eixo axiomático de toda a ordem jurídica, social e política. Somos corresponsáveis pelo estímulo e resguardo dos valores republicanos.

Cabe-nos, sem dúvida, o sentimento de enlevo diante da importância com que nos tratou a República de 1988, entregando-nos tantas competências inéditas e requalificadas.

Cumpre que nos portemos sob a inspiração dessas fontes básicas da nossa existência institucional e a ela constantemente nos reportemos. Se o fizermos, teremos a boa atuação no presente e demonstraremos, para o futuro, que também conosco o constituinte foi bem avisado.

Sabemos que não nos foi dado formular políticas públicas nem deliberar sobre a conformação social e política das relações entre cidadãos. Essas decisões essenciais estão reservadas ao povo, que se expressa pelos representantes eleitos para isso. Cabe, porém, a nós do Ministério Público, função muito a ser apreciada. Está no nosso domínio concitar que as políticas públicas determinadas pelo constituinte sejam efetivamente concebidas e que as que forem prescritas sejam consumadas, sempre que estiverem adstritas aos limites constitucionais da liberdade de conformação dos representantes do povo.

A harmonia entre os poderes, fundada no respeito devido por cada um deles às altas missões próprias e às dos outros é pressuposto para o funcionamento proveitoso e resoluto do próprio Estado democrático de Direito. A isso o Ministério Público deve ater-se e é isso o que lhe incumbe propiciar.

A defesa constante dos direitos inerentes à dignidade que peculiariza cada ser humano deve ser o nosso Norte intransigente.

Respeitar a dignidade é atuar para que todos disponham das condições mínimas para viver — e viver em liberdade, de acordo com as conquistas da civilização tecnológica, democrática e republicana.

Nos limites de nossa atuação, havemos de estar atentos, de modo especial, aos que sofrem e que não têm quem os acolha; aos que não acham espaço de proteção na política, nem no interesse jornalístico, nem nos cuidados da sociedade civil, a fim de que todos encontrem alívio e alento. Esses que tantas vezes estão invisivelmente ao nosso lado nas paisagens do cotidiano são os que mais reclamam o nosso dever de agir.

Respeitar a dignidade do outro é lhe reconhecer autonomia,  liberdade de elaborar e de realizar os seus próprios projetos de vida. É, contudo, também, cobrar-lhe a responsabilidade pelos seus atos e omissões que infrinjam os seus deveres legais para com seus semelhantes e para com a coletividade. Não há respeito pleno da dignidade sem que também reconheçamos a responsabilidade de cada qual pelos atos que praticam ou que omitem.

A nós do Ministério Público espera-se que atuemos firmemente na cobrança dessas responsabilidades, na investigação dos fatos que importem falta a esses compromissos, em busca de punição e reparação justas.

Daí o nosso dever indeclinável de combater a corrupção, as organizações criminosas, os atos que perturbam a indispensável segurança na vida das relações. Daí a nossa pertinaz e radical oposição aos que se dedicam a destruir os projetos vitais de convivência pacífica e democrática. Daí a nossa terminante rejeição à leviandade na gestão dos bens comuns de todos os cidadãos.

No zelo pelo cumprimento dessa tarefa primordial, haveremos de ser os primeiros a mostrar o nosso compromisso com os direitos de dignidade de todos, mesmo do mais censurável malfeitor, submetendo-nos sempre às garantias constitucionais dos que estão sob as nossas vistas, contendo-nos às estritas competências de que somos titulares e obedecendo aos limites éticos do papel que nos foi confiado.

A atuação do Ministério Público é, assim, particularmente exigente para os seus membros, e para o seu melhor desempenho é de se esperar o reconhecimento prático do seu labor, medido em retribuição proporcional ao que se lhes demanda.

Mais ainda, se devemos manter sempre o ânimo ardente pelo nobre múnus que o constituinte nos conferiu, não podemos perder de vista que o equilíbrio deve ser nosso apanágio. Toda a ordem jurídica, afinal, visa ao balanço satisfatório de forças, interesses e direitos.

Esse equilíbrio se obtém a partir de ações consequentes e assisadas. Se todos somos, por decisão constitucional, independentes no exercício das nossas funções, formamos, também, em virtude do desenho constitucional que nos define, uma unidade. Daí ser imperioso o bom funcionamento dos órgãos de coordenação e disciplina, para que a independência desatenta da unidade não resulte em momentos de cacofonia institucional, desmerecedores da nossa vocação superior.

Nesse plano, como Ulisses no mar das sereias sedutoras e capciosas, devemos estar aferrolhados a um mastro forte; no nosso caso, o dos princípios constitucionais diretores do nosso atuar e do nosso destino.

No nosso agir técnico, não buscamos palco nem holofotes, mas, com destemor, havemos de ser fieis e completos ao que nos delega o constituinte e nos outorga o legislador democrático.

Devemos ser inabaláveis diante dos ataques dos interesses contrariados e constantes diante da efervescência das opiniões ligeiras.

Devemos sobretudo ter a audácia de sermos bons, justos e corretos.

É isso o que impetro para mim e para todo o Ministério Público ao Deus da paz, com a dedicação a essas causas dos meus melhores esforços no desempenho do cargo em que investido.

Muito obrigado!”