O procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirmou nesta quarta-feira (19/6) que a colaboração premiada, se bem utilizada, pode ser eficaz e que não vê razão em proibir o acordo com réus presos. “Impedir que a pessoa que esteja presa faça delação premiada, para mim, não faz sentido. Se essa prisão é legítima, e desde que esse preso esteja acompanhado de um advogado, alguém que exerce uma função essencial à Justiça, e vai ter a deleção premiada homologada por uma autoridade judiciária que não participa do processo de delação, parece que estão preenchidos todos os requisitos de segurança”, disse.
Gonet, no entanto, enfatizou que esta não era uma manifestação oficial como PGR, apenas uma fala “pré-compreensão”, ou seja, o tema ainda precisa ser estudado com maior profundidade. A afirmação foi feita durante o evento “Novo enfrentamento da corrupção”, promovido pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), pela Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU) e pelo escritório Xavier Vasconcelos Advogados, que ocorreu em Brasília nesta quarta. O evento contou com apoio de mídia do JOTA.
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Durante o evento, Gonet foi questionado sobre possíveis mudanças nas regras da delação premiada. Isso porque a Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira da última semana (12/6) um requerimento de urgência para o projeto de lei que proíbe delações premiadas de presos. Para Gonet, o colaborador não é alguém que acorda e diz: “estou com um drama de consciência. Eu vou procurar a polícia ou o Ministério Público para contar todos os crimes que eu conheço”, mas alguém que só tomará essa decisão se tiver benefícios como contrapartida.
“Há sempre um quadro de pressão em cima do colaborador. Se não houver pressão, não existe colaboração. O problema está na intensidade. É óbvio que você não pode fazer essa tensão mostrando para o cara um pau de arara, coroa de cristo, choque”, disse. “Mas você pode apresentar para ele: ‘olha, as consequências do seu comportamento até agora, são essas aqui. São consequências previstas pelo direito, mas você pode tentar amenizar essas consequências se nos ajudar com dados que nós não temos outros meios para acessá-los’”, acrescentou. Gonet ainda reiterou que a delação não pode ser a única prova, mas, sim, um fornecimento de dados para que as investigações possam avançar.
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Dividido em dois painéis, o evento promoveu discussões a respeito do combate à corrupção e ao crime organizado. Paulo Gonet participou ao lado dos presidente e vice-presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Ubiratan Cazetta e Luciana Loureiro, e do advogado Beto Vasconcelos. O ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, foi convidado, mas não pôde comparecer.
Crime organizado
Outro tópico discutido foi o combate às organizações criminosas — um tema que, segundo Gonet, é central no mandato dele à frente do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Para ele, o crime organizado está crescendo, inclusive no Brasil. Gonet citou países em que esta modalidade criminosa teria “tomado conta do modelo estatal”, e que isso teria feito com que a população vivesse em uma miséria cada vez maior, com uma insatisfação incontornável. “Temos que lutar para que isso não aconteça, colocar todos os esforços para que as organizações sejam freadas”, afirmou.
Gonet reiterou a importância do possível acordo entre Brasil com a Eurojust — órgão do Conselho Europeu que reúne Ministérios Públicos da União Europeia. Esse acordo, se homologado, proporcionaria um contato direto dos órgãos brasileiros com o Ministério Público Europeu para troca de informações e dados que são importantes para o combate às organizações criminosas. “Se não houver esse mecanismo de interação, a gente perde bastante”, defendeu.
O PGR encerrou a fala ao dizer que o Ministério Público vai trabalhar duro para combater o crime organizado com técnica e conhecimento. “Não é se render a um desânimo, a uma depressão e dizer que nunca nós vamos conseguir combater o crime porque sempre os advogados da outra parte vão descobrir uma forma de anular o nosso serviço. Eles vão descobrir uma forma de anular o nosso serviço se a gente não fizer o serviço perfeito”, disse.
E ainda cobrou políticas públicas para a sociedade. “Se a gente não der uma perspectiva de futuro sóbrio, correto, decente para essa população, as organizações criminosas vão crescer cada vez”, afirmou. Para ele, não cabe aos órgãos de Justiça criar políticas públicas, mas, sim, exigir que as políticas existentes sejam efetivamente concretizadas.