Pagamento de precatórios tem chance de impacto maior no PIB do que Fazenda estimava

  • Categoria do post:JOTA

Realizado no fim de 2023, o pagamento dos precatórios acumulados desde 2021 tem boas chances de gerar um impacto na atividade econômica deste ano maior do que o Ministério da Fazenda estimou. A pasta divulgou no início de dezembro um estudo da Secretaria de Política Econômica (SPE) em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) que estimava o efeito em 2024 entre 0,24 e 0,28 pontos percentuais do PIB.

O material foi feito com base em estimativas sobre a distribuição dos recursos e aplicou os chamados “multiplicadores fiscais” (quanto uma injeção de recursos públicos impacta o PIB) próprios do modelo econométrico do BID – que não estão abertos. Dentro do próprio governo há avaliações de que o impacto pode chegar a pelo menos 0,4 ponto percentual ou mais no PIB, a depender do multiplicador a ser utilizado na conta.

A subsecretária de política fiscal da SPE e autora do estudo sobre o potencial impacto, Débora Freire, reconhece que a pasta usou uma metodologia mais conservadora porque a intenção era olhar os impactos de longo prazo para subsidiar a decisão sobre se deveria pagar antecipadamente ou não os precatórios.

“O estudo não é sobre o PIB de 2024, mas sim para ver quais seriam as respostas ao longo do tempo para avaliar a melhor opção. A preocupação era basicamente fiscal. Mas o que os resultados nos mostram é que pagar o precatório de forma diluída é melhor escolha porque além das questões fiscais se tem menor volatilidade na economia”, disse a economista do governo.

Para ela, é razoável supor que o impacto no PIB pode ser maior que o estimado pela SPE, mas, ao seu ver, também não deve ser tão superior ao que apareceu nos resultados. Isso porque, explica, apesar de ter um volume grande de precatórios “alimentares”, referente a salários e benefícios que tendem a ir mais rápido para o consumo, não caberia aplicar multiplicadores fiscais mais altos relativos ao programa Bolsa Família.

Esses recursos “alimentares” vão em grande parte para beneficiários do Regime Geral de Previdência (RGPS), servidores e outros que têm uma situação de renda melhor do que do grupo do Bolsa Família.

“Do que conheço desses dados, a gente não está falando de multiplicadores de programas sociais, que são mais elevados. Mesmo no RGPS, tem o pessoal do salário mínimo, mas tem gente acima disso. Não é de fato um multiplicador de programa social”, argumentou.

Dados da AGU mostram que, dos R$ 90,7 bilhões informados pelo Conselho da Justiça Federal (CJF), R$ 49 bilhões são dos precatórios alimentares e o restante de precatórios comuns.

Uma fonte do governo aponta que esse montante, sem contar os recursos restantes que também serão injetados na economia, deve ter um grande impacto no início deste ano. Para esse interlocutor, os efeitos macroeconômicos são similares a aumento em programa social e em salários, acelerando a atividade nos primeiros meses do ano – na hipótese de que o dinheiro efetivamente chegue nas mãos das pessoas no primeiro trimestre.

Em relatório recente, a consultoria LCA destaca que a decisão do governo de zerar o estoque de precatórios atrasados poderá gerar um reforço temporário da renda das famílias nesta primeira metade de 2024 que pode chegar perto de 0,5% do PIB (quando considerados apenas os precatórios alimentares). “Isso significa que, na média de 2024 em relação à média de 2023, a massa real de renda pode vir a registrar uma expansão anual até um ponto percentual maior do que o crescimento de 4,7% que ora projetamos”, diz o texto, que não projeta os impactos no PIB mas aponta que as recentes revisões do mercado para a economia pode estar relacionado a isso.

A pesquisa Focus do Banco Central vinha mostrando as projeções de PIB para 2024 estacionadas em 1,5%, mas no início do ano a mediana começou a se deslocar para a casa de 1,6%. Os dados não apontam os motivos para as revisões das casas que informam o BC.

Análise do Bradesco em dezembro chegou a um número menor de impacto que o da Fazenda, com impacto de 0,1%, mas apontando que pode ser conservador. O departamento econômico lembra que os processos tratam de valores elevados – superiores a 60 salários mínimos, já que atualmente as RPVs estão sendo pagas no exercício.

“O impacto sobre o consumo deve ser, portanto, inferior ao de um benefício assistencial, em geral com valor baixo pago a um número grande de pessoas. De todo modo, parece razoável supor que uma fração dos precatórios de natureza alimentar impulsionará a demanda via consumo das famílias. Considerando, por exemplo, que R$ 20 bilhões (cerca de 20% dos precatórios totais e metade dos alimentares) sejam injetados na economia via renda disponível e que esse valor seja destinado ao consumo, estimamos um impacto próximo de 0,1 p.p. no PIB ao longo do primeiro semestre de 2024”, diz o departamento econômico do BC. “Essa parece ser uma estimativa conservadora, de toda forma, uma vez que o volume total dos pagamentos se aproxima de 1,0% do PIB e pode, eventualmente, se traduzir em uma maior demanda por consumo do que nossas simulações sugerem”, completa o texto.