O que disse Paulo Gonet em sua apresentação na sabatina no Senado

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Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para chefiar a Procuradoria-Geral da República (PGR), o subprocurador Paulo Gonet está sendo sabatinado nesta quarta-feira (13/12) pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal junto com o ministro da Justiça Flávio Dino — indicado, por sua vez, para ser ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) no lugar de Rosa Weber. Leia abaixo, na íntegra, o discurso de apresentação de Gonet na sabatina.

“Exmo. Sr. Presidente, Exmas. Sras. Senadoras, Exmos. Srs. Senadores, senhoras e senhores aqui presentes — eu mando um cumprimento especial para a Procuradora-Geral da República, minha amiga Elizeta Ramos —, é uma especial honra poder estar perante V. Exas. para me submeter ao escrutínio da Alta Câmara, ao ensejo da minha indicação para o cargo de Procurador-Geral da República, efetuada pelo Senhor Presidente da República.

Nos últimos dias, procurei agendar visitas a todos os membros da Casa com o propósito de me apresentar pessoalmente antes mesmo da arguição no Plenário desta Comissão. A exiguidade do tempo desde indicação associada às vicissitudes do calendário de atividades parlamentares não me permitiu satisfazer integralmente esse intuito. De toda sorte, espero poder expor a todos os pontos de interesse que possam ser suscitados a propósito da minha indicação.

Ser trazido à presença de V. Exas. como candidato a Procurador-Geral da República é motivo de sentimentos de responsabilidade e de regozijo. Toda a minha vida profissional foi marcada pela atividade jurídica, que se tornou minha paixão desde o ingresso na Universidade de Brasília, em 1979. Ser apresentado a V. Exas. como indicado ao cargo culminante do Ministério Público me propicia imensa satisfação pessoal e me anima com maior intensidade ainda ao grato desafio de conduzir o Ministério Público ao encontro cada vez mais próximo da sua vocação constitucional de função essencial à Justiça, de defender a ordem jurídica democrática e dos interesses sociais e individuais, conforme define o art. 127 da Constituição.

Como crédito para um juízo de confiança de V. Exas., tenho a apresentar 36 anos de integrante do Ministério Público Federal, juntamente com os quatro anos e meio como Assessor do Ministro Francisco Resek no Supremo Tribunal Federal, cumpridos desde quatro meses depois da minha formatura em ciência jurídica. Somam-se, portanto, mais de quatro décadas de intensa atuação em atividades jurídicas.

Essa vida de dedicação aos afazeres do direito sempre significou para mim uma atividade apaixonante e absorvente. Sempre me pareceu gratificador por si mesmo o empenho na busca do justo e a dedicação à defesa dos interesses da dignidade da pessoa, especialmente por meio dos direitos fundamentais.

Devo compartilhar com V. Exas. outro fascínio que me guiou as energias e a vontade. Refiro-me ao entusiasmo pelo Ministério Público, que remonta aos primeiros anos do curso de graduação. Essa atração pelo Ministério Público me fez participar de dois concorridos concursos públicos. Tenho como motivo de orgulho a aprovação, em primeiro lugar, no concurso para o ingresso da carreira do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e também o primeiro lugar no concurso para Procurador da República, este em 1987, quando ingressei na carreira de que desde então não me desgarrei.

No Ministério Público Federal, tive a ventura de ser convidado pelo Procurador-Geral da República à época, mais tarde Ministro do Supremo Tribunal, Sepúlveda Pertence, que presidira o concurso, para atuar em processos da competência do Plenário da nossa Suprema Corte.

Com a estruturação posterior da carreira, tive a oportunidade de atuar também na primeira instância da Justiça Federal do Distrito Federal e perante o Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

Em janeiro de 2012, iniciou-se o meu período no cargo de Subprocurador-Geral da República, mediante promoção por merecimento, etapa final da carreira do MPF. Nessa condição, atuei em processos da competência das turmas do Supremo Tribunal Federal.

No contexto também das atribuições relacionadas com os cargos que ocupei, fui nomeado Procurador-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), no início da década de 1990, após a aprovação do meu nome pelo Senado, havendo sido sabatinado e aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos.
Da mesma forma, em meados da mesma década, fui o representante do Ministério Público Federal na Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, criada pela Lei 9.140, de 1995.

Em tempos mais recentes, fui Diretor-Geral da Escola Superior do Ministério Público da União, entre 2020 e 2021.

Em julho de 2021, fui designado Vice-Procurador-Geral Eleitoral.

Atualmente e desde o encerramento do mandato do último Procurador-Geral da República, exerço o cargo de Procurador-Geral Eleitoral em condição interina, até a posse de quem vier a chefiar o Ministério Público da União.

O fascínio pela defesa e implementação dos direitos fundamentais, pelos interesses da sociedade civil, aqueles mais essenciais, e da ordem constitucional que me conduziu ao Ministério Público também me acompanhou em atividades concomitantes de ordem acadêmica.

A nossa Constituição pretendeu inaugurar uma nova vivência sociojurídica, construída sob os valores do Estado de direito democrático, identificados com a proteção e o fomento dos direitos sociais e individuais, da liberdade, da igualdade, da fraternidade e da segurança, tanto material quanto jurídica, conforme o enunciado no seu preâmbulo.

Sempre acreditei que, sem uma apurada visão técnica dos direitos fundamentais, a riqueza inerente à sua proclamação pelo Constituinte perderia a força vinculante que lhe é própria e se abateria o ideal de máximo respeito à dignidade da pessoa humana. Daí a urgência do seu tratamento mediante abordagem técnica consistente e metódica.

Para esse fim, apliquei, então, os meus esforços acadêmicos, desde os primeiros momentos da vigência da Constituição.

De fato, entre 1989 e 1990, com o apoio do Conselho Britânico, pude cumprir o programa de Masters of Laws, mestrado da Universidade de Essex, no Reino Unido, todo ele voltado ao estudo dos direitos humanos internacionais. Vi ali aprovada a dissertação sobre os encontros e conflitos entre a liberdade de imprensa e a privacidade.

Foi também para a definição e a melhor aplicação dos direitos fundamentais que dediquei o meu doutorado na Universidade de Brasília, em que vi aprovada a tese sobre “Juízo de ponderação na jurisdição constitucional”. O trabalho recebeu recomendação para publicação, o que se efetuou pela Editora Saraiva.

A preocupação com uma análise técnica dos direitos fundamentais, compartilhada com outros acadêmicos, também ensejou um curso de Direito Constitucional, hoje em coautoria com o Ministro Gilmar Mendes, que já vai para a sua 19ª edição anual.

No currículo posto à disposição de V. Exas., constam também algumas dezenas de artigos de autoria exclusiva ou em parceria com juristas diversos.

No âmbito da atividade docente, ministro aulas de Direito Constitucional, de graduação e de pós-graduação em Brasília, desde 1986. Há mais de uma década sou responsável por disciplina sobre jurisprudência e direitos fundamentais, enfocando críticos relativas a ativismo judicial, tanto em curso de mestrado como mais recentemente de doutorado.

Participei de inúmeras bancas de dissertações e teses acadêmicas na área do Direito Constitucional. No âmbito dessa disciplina, integrei um grande número de bancas de concursos públicos. Assinalo a participação em concursos públicos para carreiras dos Ministérios Públicos Estaduais e da União, para advogados públicos e, durante uma década, para o ingresso na carreira diplomática.

V. Exas. têm aí um apertado retrato da minha vida profissional, dedicada aos valores mais encarecidos da vida jurídica, justamente aqueles que formam a chave de todo o sistema do direito entre nós.

Gostaria de enfatizar que todo uma vida assim dedicada ao direito, se me inspirou a necessidade do olhar técnico sobre temas delicados da convivência social e politica, não me embaçou a visão para o principal: a percepção de que o direito foi feito para as pessoas, devendo ser tratado como instrumento indispensável para que todos possam, com autonomia, buscar a realização como seres humanos, responsáveis pela própria vida e corresponsáveis pela história do nosso tempo.

Essas são, Sras. Senadoras e Srs. Senadores, as considerações que me ocorreram apresentar a V. Exas. na condição de quem se candidata ao seu abono para o exercício dos encargos que a lei e a Constituição confiam ao Procurador-Geral da República.

Muito obrigado. Estou à disposição de V. Exas.”