O protagonismo do hidrogênio verde no mundo e os esforços do Brasil

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Marcado por acontecimentos climáticos inéditos ou incomuns, como também por discussões que poucas vezes possibilitam nutrir qualquer sentimento de esperança sobre mudanças no cenário atual, o meio ambiente certamente foi uma das pautas mais marcantes de 2023. Com o desenrolar da COP 28, em Dubai, foi possível ver um grande jogo de interesses que mais divergem do que convergem em busca de resultados práticos para contenção da escalada dos problemas ambientais.

É o que se vê na participação do Brasil, marcada tanto pelos discursos incisivos no combate às mudanças climáticas quanto pelo recente aval do presidente Lula para o Brasil entrar na Opep+, revelando que o resiliente atrito entre a proteção do meio ambiente e os interesses do mercado também está presente em terras tupiniquins.

De todo modo, a COP 28 trouxe, entre as questões debatidas no evento, o mercado de hidrogênio verde, que se tornou um dos trunfos da produção de combustíveis alternativos aos de origem fóssil, sobretudo quando produzido a partir de fontes renováveis de energia.

No dia 7 de dezembro aconteceu o Hydrogen Transmition Summit, que reuniu importantes agentes do mercado e do setor público para discutirem uma agenda global para essa promissora alternativa aos combustíveis fósseis, notadamente diante do que chamam de urgent climate crisis.[1]

A importância do hidrogênio verde (H2V) nas discussões climáticas já reverbera nas iniciativas brasileiras, conforme recente parceria com o Reino Unido para criação de hubs de pesquisa e produção de hidrogênio de baixo carbono para oferta internacional[2] e, também, na iniciativa do da governadora de Pernambuco, Raquel Lyra, que anunciou durante a COP28 o investimento de R$ 20 milhões no desenvolvimento de centros de produção do H2V.[3]

Como já se infere desse cenário relatado, há uma distinção entre a produção industrial de hidrogênio feita a partir de fontes renováveis e com baixa emissão de carbono e outras, que não trazem muitos benefícios ambientais diante da considerável emissão de CO2 no processo produtivo.

Isso ocorre porque o H2, apesar de representar uma alternativa muito promissora aos combustíveis fósseis, ainda é uma fonte não biológica de energia, que demanda um processo industrial de produção que pode ser realizado de diversas formas. É esse processo produtivo que será capaz de definir o quão benéfico o H2 pode ser para uma economia com pretensões de sustentabilidade.

Por essa razão, um dos grandes esforços das instituições envolvidas é justamente o de criar padrões de classificação que tornem claro, tanto aos agentes privados quanto aos públicos, quais os parâmetros utilizados na definição das formas de produção de H2 que devem ser privilegiadas e almejadas pela indústria.

Nesse sentido, houve recente iniciativa da Comissão Europeia, responsável por redigir propostas e aplicar as decisões do Parlamento Europeu, submeteu, em fevereiro de 2023, propostas para elaboração de critérios claros de classificação e regras para produção do H2V, que foram aprovadas em junho.

As propostas, além de definirem claramente o que constitui o H2V para a União Europeia, definem critérios de produção e projetam incentivos diversos para o mercado[4]. Em pesquisa elaborada por pesquisador vinculado ao Parlamento Europeu, já se alertava que há uma corrida contra o tempo no que diz respeito ao H2V, tanto por questões ambientais urgentes quanto pela disputa econômica, pois possíveis concorrentes, como os EUA, já adotam incentivos fiscais aos produtores.[5]

É nesse cenário que o Brasil se insere, mais uma vez, com grande potencial conferido pelas vastas terras do país, que garantem uma grande quantidade de biomassa que pode ser aproveitada na produção do H2V[6].

Mais uma vez, o país depende dos seus atores políticos, que têm em suas mãos a possibilidade de potencializar a indústria de um mercado com grande potencial futuro. O Brasil, para não ficar para trás nessa corrida, precisa definir o quanto antes os critérios regulatórios que possibilitarão o protagonismo do país no mercado internacional do H2V, mais uma vez realçando o seu potencial nos esforços de transição energética que marcam o século 21.

Voltando à COP 28, o evento reforça a importância do tema ao divulgar um reconhecimento mútuo de intenções, que define uma cooperação entre diversos países, entre eles o Brasil, no desenvolvimento de classificações transparentes do H2 industrial, notadamente para a aceleração e desenvolvimento técnico do produto que, no entender dos participantes, terá um papel essencial na descarbonização das indústrias[7]. É evidente que o cenário demanda, com urgência declarada, proatividade dos agentes políticos e econômicos envolvidos.

Contrariando costumeira descrença dos brasileiros com esses agentes, sobretudo os políticos, há, tramitando no Congresso Nacional, iniciativa cujo projeto foi aprovado em 28 de novembro na Câmara dos Deputados. Trata-se do PL 2308/23, de autoria do deputado Gilson Marques (Novo-SC) e Adriana Ventura (Novo-SP).

O texto aprovado pelo relator, deputado João Carlos Bacelar (PL-BA), institui a tão necessária classificação do hidrogênio de baixa emissão de carbono e institui incentivos federais tributários para os produtores.[8]

O texto busca diferenciar tanto o hidrogênio de baixa emissão, cuja produção não gera mais do que 4 kg de CO2 por quilograma de H2 produzido, quanto o hidrogênio renovável, produzido a partir de fontes renováveis, como energia solar, eólica e gases naturais.

Entre os muitos avanços que o projeto de lei busca trazer ao cenário brasileiro, como a definição dos critérios de classificação, da autoridade reguladora competente e do sistema de cadastro para empresas produtoras, estão os incentivos fiscais às empresas que produzem H2 de baixo carbono. O projeto prevê a extensão dos benefícios previstos na Lei 11.488, que cria o Regime Especial de Incentivos para Desenvolvimento da Infraestrutura (REIDI), como a suspensão de PIS, Cofins, PIS-Importação e Cofins-Importação na elaboração de indústrias e projetos voltados à produção do H2 de baixo carbono.

Para se beneficiarem dos incentivos fiscais, as empresas terão que cumprir alguns pré-requisitos, como comprovarem investimento em pesquisa e inovação e uso mínimo de bens e serviços nacionais no processo produtivo.

Somando-se ao incentivo fiscal, o texto prevê também a concessão de crédito específico para as empresas produtoras de hidrogênio de baixa emissão de carbono, visando alocação de recursos que buscam fomentar a indústria e propiciar um aceleramento na transição energética.

Com a aprovação na Câmara dos Deputados, naturalmente o texto segue para apreciação no Senado Federal, ocasião na qual os parlamentares terão, mais uma vez, a oportunidade de debater e definir, finalmente, as diretrizes do país para uma das mais importantes pautas da atualidade.

Diante desse cenário, é importante que os agentes políticos continuem se esforçando para que, o quanto antes, sejam definidos os critérios brasileiros na produção de H2V que, aliados aos padrões internacionais de produção, podem colocar o país como importante agente em uma das mais relevantes pautas ambientais, sociais e econômicas do mundo.

[1]Disponível em: https://events.climateaction.org/transition-summits/hydrogen/. Acesso em 05/12/2023

[2]Disponível em: https://energiahoje.editorabrasilenergia.com.br/brasil-e-reino-unido-firmam-parceria-em-hidrogenio-de-baixo-carbono-durante-a-cop-28/. Acesso em 05/12/2023

[3]Disponível em: https://www.diariodepernambuco.com.br/noticia/economia/2023/12/cop-28-pernambuco-lanca-estrategia-estadual-de-hidrogenio-verde.html. Acesso em 05/12/2023.

[4] Disponível em: https://energy.ec.europa.eu/news/renewable-hydrogen-production-new-rules-formally-adopted-2023-06-20_en. Acesso em 05/12/2023.

[5] ERBACH, Gregor; SVENSSON, Sara. EU rules for renewable hydrogen: Delegated regulations on a methodology for renewable fuels of non-biological origin. European Parliamentary Research Service, PE 747.085 – Abril de 2023.

[6] Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2023/05/17/brasil-tem-grande-potencial-de-producao-de-hidrogenio-verde-dizem-especialistas. Acesso em 05/12/2023.

[7] Disponível em: https://www.cop28.com/en/cop28-declaration-of-intent. Acesso em 05/12/2023.

[8] Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/1020557-camara-aprova-certificacao-e-incentivos-para-hidrogenio-com-baixa-emissao-de-carbono/. Acesso em 05/12/2023.