Sudorese, ânsia de vômito, taquicardia, dor no peito. Alguns desses sintomas já são comumente conhecidos por quem costuma sofrer um episódio de ataques de pânico ou ansiedade generalizada. As reações se diferem de angústia de grande parte das pessoas que, navegando na internet, deparam-se com a imagem que resume a previsão de onda de calor da semana.
As ondas de um tom vermelho escuro sobrevoam o mapa do Brasil e só tendem a piorar ao longo dos dias. Ao fechar a aba da plataforma da rede social e abrir o portal de notícias em busca das atualidades, as informações sobre as mudanças climáticas não ficam mais animadoras. Seca na Amazônia e ciclones na região Sul ao mesmo tempo. Como é possível tamanho contraste?
Mapa de calor no Brasil nas últimas semanas com dados do Inmet. Crédito: Reprodução
Em um resumo (meramente narrativo): os esforços são urgentes para impedir o agravamento da crise climática. Porém, profecias científicas não estão movendo quem engrena a lógica da produção econômica atual. Desmatamento no Cerrado aumenta, incidência de fogo também, sociedades estão cada vez mais dependentes de plástico e combustíveis fósseis. Já os ações contrárias são praticamente ineficazes – caso todos os compromissos do Acordo de Paris sejam cumpridos, por exemplo, isso só significaria 22% do que seria necessário para impedir o cenário de 1,5ºC do aumento da temperatura global até 2020, segundo relatório da ONU Meio Ambiente de 2022. E se forem cumpridos.
Diante disso, surge um elemento cada vez mais conhecido: a ecoansiedade. Essa nova definição é reconhecida como uma experiência real e coletiva que causa sensações de sofrimento psicológico diante do cenário imprevisível do amanhã. Muitos comunicadores projetam essa angústia legítima em seus próprios produtos, mas isso pode mais afastar do que aproximar o público de interesse.
Eu era uma dessas leitoras que ignorava o assunto, pois ele me incomodava. O que me fez mudar foi, basicamente, começar a trabalhar na área da comunicação ambiental e entender uma perspectiva mais ampla do cenário – e descobrir que as propostas para reverter o quadro têm soluções muito eficientes, só precisam ser implementadas. Sim, a fagulha da esperança é bonita e acesa.
Os comunicólogos precisam compreender melhor o contexto ambiental, econômico, político e social que envolve o mapa de calor da semana. E o próprio público precisa ser orientado a entender não apenas o que está afetando essa anormalidade natural – o fenômeno El Niño –, mas também como a lógica da própria sociedade que faz parte está levando o fenômeno natural a se intensificar cada vez mais ao longo dos anos.
Por mais que sejam muito positivos e recomendáveis os movimentos individuais de reciclar o lixo, diminuir o consumo de carne e economizar água no banho, realizados de forma pontual, há um impacto ambiental mínimo. Melhor do que condenar o uso de um copo plástico, será direcionar energia para a proteção das áreas de preservação que concentram alta biodiversidade.
É mostrar que sim, o público pode contribuir com o esforço político de destinar terras públicas que ainda não têm função social – 50% do desmatamento na Amazônia ocorre nessas áreas, segundo estudo assinado por pesquisadores do IPAM. Fazê-lo entender que a própria lógica da organização urbana da cidade onde vive, quando socialmente inclusiva – mais investimento em transporte público, mais saneamento básico e menos desigualdade econômica –, também pode torná-la mais ambientalmente sustentável.
O desmatamento no Cerrado é motivado por um fator, e o da Amazônia é por outro. É importante que essas particularidades sejam explicadas. O leitor não pode se sentir desinformado quando o governo apresenta dados de redução do desmatamento na mesma semana em que o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Ambientais) alerta para o aumento de focos de incêndio. Ele precisa compreender a questão científica por trás dos dados. Quanto mais a pessoa percebe a “engrenagem”, de forma crítica e sensata, mais blindada contra o negacionismo climático e ambiental.
E por último, mas não menos importante – na verdade, está aqui justamente para encerrar com a chave de sementes de bacuri – é preciso dar mais espaço para as vozes indígenas. Os povos originários estão espalhados pelo Brasil em seus diversos povos, modos de pensar e cultura. Esses grupos têm algo comum: as terras onde eles habitam são mais preservadas quando comparadas às terras não indígenas. O que faz sociedades terem uma lógica de vida tão sustentável? A resposta à pergunta pode pôr em perspectiva a noção do não indígena de achar que “qualidade de vida” envolve justamente se distanciar de tudo que a natureza significa.
E, se você ainda acha que o mundo vai acabar, posso afirmar: não vai. O planeta é resiliente, vai se adaptar à perturbação ambiental. A humanidade também possui uma resiliência sem igual, graças a sua capacidade criativa de solucionar problemas com tecnologias (quando quer). A pergunta que deve ser respondida por jornalistas, cientistas e população em geral, na verdade, é outra: o modo de vida da sociedade atual da qual você faz parte, e sua lógica econômica, social e política consegue sobreviver ao agravamento das mudanças climáticas?