O Brasil enfrenta importante risco duplo no campo político: o acirramento das tensões geopolíticas no Oriente Médio e a fraqueza política do Executivo no encaminhamento da sua agenda. A combinação desse cenário internacional conturbado com os dilemas da agenda econômica deve limitar o espaço de redução da taxa de juros no Brasil, o que servirá como teste do pragmatismo governista na condução da agenda econômica.
Do ponto de vista doméstico, a perda de protagonismo da agenda econômica na arena legislativa já estava patente. Os líderes parlamentares pareciam pouco dispostos a aceitar a nova rodada de ações da equipe econômica em direção à recuperação fiscal. Não por acaso, o governo teve que mudar as metas de resultado primário para os próximos anos, como resultado da falta de cooperação legislativa com essa agenda. O senso de urgência em torno da questão fiscal deixou de existir, o que aumentou o custo econômico do cenário de rivalidade entre os Poderes e de insegurança do governo com relação ao seu capital político.
Os efeitos dessa instabilidade política doméstica foram reforçados pela cena internacional. Os riscos geopolíticos aumentaram com a ação militar iraniana diretamente contra Israel, o que representou mudança de paradigma na condução das relações bilaterais.
A tensão bilateral entre Israel e Irã deve ter vida longa. No limite, a ação iraniana faz parte da estratégia de liderança do “eixo da resistência” que, grosso modo, questiona a presença dos EUA na região, materializada nas disputas com Israel. O ataque iraniano rompeu com a tradição de “paciência estratégica” nas suas ações contra os EUA e joga a corrida pelo controle da região em um patamar de maior tensionamento.
A despeito da insistência dos EUA em controlar a ação israelense, as perspectivas para o conflito no Oriente Médio são pouco alvissareiras. A coalizão governista em Israel mantém o objetivo de destruir o poder militar do Hamas e ameaça uma nova incursão em Gaza. Essas eventuais manifestações devem justificar novas respostas do eixo da resistência, que poderiam se agravar ainda mais em um cenário de vitória do ex-presidente Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos.
Os protestos mais recentes nas universidades norte-americanas, em alguma medida, reforçaram a fraqueza da candidatura do presidente Joe Biden. O democrata parece ficar preso entre a relação histórica dos EUA com Israel e os custos políticos crescentes da ação militar israelense entre os eleitores tradicionais dos democratas.
No plano doméstico, os desafios da agenda econômica perderam protagonismo em meio a dois grandes conflitos da política no Brasil: a) disputas no governo devido à insegurança com a popularidade presidencial e b) conflito político eleitoral envolvendo o plano dos presidentes das casas legislativas adicionado à tensão entre os Poderes.
Sob a cena internacional mais incerta, os dilemas domésticos do Brasil acabam reforçados. Se, no passado, as críticas do presidente Lula ao Banco Central trouxeram um senso de urgência à coalizão de governo para aprovar o novo marco fiscal, agora, a agenda econômica é vítima dos projetos eleitorais dos presidentes das casas legislativas, bem como dos tensionamentos institucionais que, no limite, tomam o espaço da agenda econômica na atividade do Congresso.
O governo entrou em modo de insegurança com seu capital político tal como no início do mandato, quando as marcas do 8 de janeiro dominavam os primeiros passos do governo Lula antes mesmo da posse. Grosso modo, após o primeiro ano da administração, a avaliação de governo voltou a patamares do início do mandato, o que traduz um país dividido.
A coalizão de governo, por sua vez, retrata essa divisão. O núcleo político se divide em como responder ao quadro polarizado, resultando nas divergências públicas que reforçam a percepção de fraqueza da agenda fiscal e, especialmente, sugerem chances de retorno ao voluntarismo da agenda econômica. Além disso, esquerda e direita sustentam divergências e alimentam a tensão entre os Poderes. Os temas fiscais ficam à mercê da disputa de poder em torno das emendas orçamentárias.
Sob esse cenário de isolamento político, a equipe econômica pode encontrar no Banco Central um aliado para reequilibrar as disputas na coalizão. A eventual mudança na condução da política monetária pode ser o acionamento dos mecanismos de “alarme de incêndio” necessários para pressionar a elite política a aprovar temas que mantenham os riscos controlados na seara macroeconômica.