Sabemos como está a nossa vida, atualmente: corrida, agitada. No trânsito, procuramos o melhor lugar para chegarmos mais rápido, geralmente, na parte central da via, enquanto que, nas rodoviárias, ao esperar o transporte, que às vezes teima em chegar, procuramos nos achegar em um banco, senão nas laterais, na parte central.
Tudo isso por causa da sobrevivência: precisamos sobreviver e ganhar dinheiro e, talvez porque vivamos em tempos digitais, quando tudo pode ser acessado muito rápido, a vida tem que ser muito rápida mesmo, tal como os bits computacionais.
No centro de tudo, está o sistema financeiro – precisamos, como dissemos, sobreviver – e, no centro do sistema, o Banco Central, que recentemente, foi regulamentado pela LC 179/2021, em cujo art. 5º e § 1º, podemos ler que o presidente da República somente pode exonerar o presidente do BC a pedido, por doença, por condenação judicial ou por ineficiência atestada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
É a chamada autonomia do BC. Mas a indagação que fica é: não será essa autonomia, do jeito com que está ora a se apresentar, inconstitucional? Deveras, a regra geral prevista na Constituição é aquela dos arts. 76 e 84, que submetem toda a estrutura administrativa, vale dizer, toda aquela estrutura necessária à prestação dos serviços públicos à sociedade – tirante, portanto, por razões óbvias, os Poderes Legislativo e Judiciário –, à ingerência do presidente da República.
A bem dizer, nem poderia ser diferente, pois estando o Poder Executivo em suas mãos, ao presidente eleito caberá conduzir essa estrutura administrativa, a Administração Pública, que alguns chamam pela denominação, um tanto pejorativa – concordemos –, de “máquina pública”. E é essa “máquina” que a Constituição chama, genericamente, de Poder Executivo.
Temos, aqui, uma regra geral: todo o Poder Executivo, portanto toda a Administração Pública, na qual se inclui o BC, pela Constituição, está submetida à ingerência do presidente da República. Todavia, essa regra comporta exceções ditadas pela própria Constituição, quais sejam: a) os já mencionados Poderes Legislativo e Judiciário, por conta da doutrina montesquieuniana da tripartição; b) os estados, o Distrito Federal e os municípios, por conta da Teoria Federalista; c) alguns órgãos públicos que o povo, pela Constituição, resolveu dotar de “autonomia” perante o presidente da República, como o Ministério Público, as universidades, a Defensoria Pública, entre outros.
O balanceamento fica sendo, portanto, o seguinte: se não houver uma exceção (prevendo uma autonomia), vige, irretorquivelmente, a regra geral de que o (a) Poder Executivo/Administração Pública está submetida à ingerência do presidente da República. Indaga-se: o Banco Central está debaixo de alguma regra de exceção constitucional? Tal indagação, entrementes, acaba nos levando a uma outra: e não poderia a lei, inclusive, complementar, estabelecer uma autonomia a latere da Constituição?
Independentemente de qual seja a resposta, o fato é que temos, ao lado dos Poderes Legislativo e Judiciário, o Poder Executivo, que, assim como os outros dois, possui as suas prerrogativas, claro, nos limites da Constituição, pois, como sabemos, vivemos, como diria um famoso jusfilósofo, sob o império da lei e, inclusive, ou principalmente, da lei constitucional.
Enquanto isso, vige, plenamente, o disposto no art. 5º e § 1º da LC 179/2021, consagrando a autonomia do BC perante o presidente da República. Vira e mexe, com o perdão do trocadilho, vozes se levantam contra uma tal autonomia, no feitio em que posta por aquela LC. Cremos, de fato, humildemente, que tal resolução urge ser feita, haja vista que diante da “rapidação computacional” de nossos dias precisamos saber se o Brasil tem ou não assento para descansar – seja na lateral, seja na central do banco.