Nova Lei de Licitações só vai ser utilizada em grande escala em 2026?

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30 de dezembro de 2023. Essa é data final – obtida da conjugação do art. 191 com redação original da nova Lei Geral de Licitações e Contratos (que retornou a vigorar em razão da caducidade da MP 1.167/2023) com o art. 193 da NLGC com a redação conferida pela Lei Complementar 198/2023 – para que a Administração Pública possa optar por licitar ou contratar diretamente de acordo com as regras da Lei 14.133/2021 ou de acordo com as Leis 8.666/1993, 10.520/2002 (Lei do Pregão) e 12.462/2011 (Lei do RDC).

Entretanto, apesar da proximidade da derradeira data, o plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) identificou quando da prolação do acórdão 2154/2023 proferido nos autos do Processo TC 027.907/2022-8 que, de 196.136 processos de licitação feitos através da plataforma de compras do Governo Federal (Compras.gov.br) entre agosto de 2021 e julho de 2023, apenas 3,1% (6.127 licitações) foram baseados na Lei 14.133/2021.

Um olhar “otimista” sobre o acórdão 2154/2023 do TCU é o de que apenas 13% dos municípios brasileiros usaram o Compras.gov.br, o que poderia nos levar a imaginar que o uso da NLGC estaria ocorrendo em outras plataformas (o TCU inclusive demonstra preocupação com o uso de plataformas privadas).

Mas, para quem milita no setor e acompanha os depoimentos em, por exemplo, grupos de Whatsapp, está percebendo que a nova Lei de Licitações e Contratos ainda está muito longe de ser a principal opção da Administração Pública, o que é muito estranho quando pensamos na proximidade do dia 30 de dezembro.

Considerando que, na prática, uma das grandes diferenças entre a Lei 14.133/2021 e a Lei 8.666/1993 é a preocupação com o planejamento e o detalhamento da fase interna do processo licitatório, fica muito evidente que é bastante provável que após o dia 30 de dezembro de 2023 tenhamos licitações que só tenham o “nomen juris” da NLGLC, mas que, na verdade, sejam totalmente formatadas sob a forja da Lei 8.666/1993, vindo desprovidas, por exemplo, de estudos técnicos preliminares.

Veja, é preciso ter em mente que o Brasil possui 5.570 municípios e serão eles que serão os responsáveis por conferir a aplicação em larga escala do Novo Marco Legal das Contratações Públicas.

Pois bem, após 30 de dezembro de 2023 estaremos em 2024 e, no próximo ano, esses 5.570 municípios estarão vivendo ano de eleições para prefeitos e vereadores.

E quais as consequências do ano eleitoral na implementação da nova Lei de Licitações nos municípios?

Bom, a depender do porte do município, é extremamente comum que a estrutura de pessoal que lida com licitações e contratos, seja, em que pese o teor do art. 3º, § 1º da Lei 10.520/2002 e do art. 6º, LX e 8º da Lei 14.133/2021, composta por servidores comissionados ou mesmo empregados terceirizados que, ou (e aqui não se pode negar a realidade) muitas vezes estão envolvidos nas campanhas políticas, ou são exonerados e demitidos quando um grupo político rival assume.

Assim, anos de eleição municipal, como o de 2024, para diversos municípios, notadamente no que se refere ao segundo semestre, é um ano de compasso de espera ou mesmo de paralisia, ante ao cenário de incerteza que se forma.

Ainda sobre o ano eleitoral, findo o pleito, inicia-se um período de “limbo” que antecede a formação de eventuais “governos de transição” onde há uma recusa/omissão por parte de quem está em seus últimos meses/dias de exercício em assinar e se responsabilizar por algo que será continuado e sobretudo fiscalizado por uma nova gestão.

Findo 2024, teremos 2025, o fatídico primeiro ano de gestão que, principalmente, mas não exclusivamente, é deveras tormentoso quando há uma solução de continuidade no grupo político que estava à frente da máquina pública municipal, não sendo incomum em tais situações que os novos servidores comissionados e empregados terceirizados contratados se depararem com o seguinte cenário de “terra arrasada”: arquivos incompletos, ausência de documentos e computadores sem registro do que ocorreu na gestão passada, por exemplo.

Sendo 2024 e 2025 anos com dificuldades concretas para implementação das novidades trazidas pela Lei 14.133/2021, não é nenhum absurdo imaginar que a nova Lei de Licitações só será utilizada em grande escala a partir de 2026.

Veja, a Medida Provisória 1.167, de 31 de março de 2023, que prorrogava a possibilidade de uso da Lei 8.666/1993 teve seu prazo de vigência encerrado no dia 28 de julho de 2023, de modo que, quem esperava que sua eventual conversão em lei trouxesse uma nova prorrogação para aplicação da Lei 8.666/1993, passou, a partir de 28 de julho, a ter 155 dias para planejar licitações e contratações a serem realizadas sob a forma da NLGLC.

Considerando que a CGU[1] identificou que o prazo médio para conclusão de uma licitação do DNIT regida pela Lei 8.666/1993 é de 169 dias, por que pensar que no resto do Brasil é diferente?

Pior, com os municípios tendo de empreender a realização de uma detalhada fase interna que até então não adotavam em suas licitações, o prazo médio de 169 dias pode ser superado com tranquilidade (lembrando que a partir de 28 de julho deste ano faltavam 155 dias para não mais se poder optar por licitar pela Lei 8.666/1993).

Assim, o cenário de uma aplicação em larga escala da nova Lei de Licitações (que, como já dito, depende da adoção da Lei 14.133/2021 pelos municípios) somente em 2026 não pode ser desconsiderado.

[1] Disponível em https://www.cauro.gov.br/44-das-licitacoes-para-contratacao-integrada-sao-malsucedidas-diz-cgu/#:~:text=De%20acordo%20com%20a%20CGU%2C%20o%20prazo%20m%C3%A9dio%20para%20conclus%C3%A3o,8.666%2F1993. Acesso em 16/11/2023.