Necessidade e propósito para construir uma carreira significativa

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A necessidade e o propósito, uma dupla e tanto quando se fala de carreira.

Todos nós buscamos uma vida confortável. A quantidade de recursos financeiros suficientes varia de acordo com a realidade de cada indivíduo, cada história, cada padrão de vida. Mas uma coisa é fato: vivemos em um mundo onde os recursos financeiros são essenciais. É aí que na maioria dos casos entra a nossa relação com o trabalho, seja em um emprego formal, um empreendedor ou autônomo.

Tão importante quanto entendermos a nossa relação com o trabalho é termos consciência de que não existe distinção entre vida pessoal e profissional, temos uma vida única.

Sempre podemos escolher qual caminho seguir. Podemos optar por simplesmente ter um trabalho remunerado ou uma carreira. Cada caminho nos levará a um destino.

Vou te contar uma breve história.

Maria nasceu e cresceu em uma família pobre, mas com sólidos valores. Seus pais tinham poucos recursos para manter a família com cinco filhos. Recursos esses oriundos do duro trabalho como faxineira e auxiliar de pedreiro. Os irmãos mais velhos desde sempre ajudavam no sustento da casa.

Maria gostava muito de ler e estudar. Quando ia à biblioteca pública de sua cidade, viajava em histórias bem diferentes da sua realidade. Sempre estudou em escolas públicas, o que não a impedia de aprender e sonhar alto.

A necessidade fez com que Maria começasse a trabalhar aos 15 anos, como secretária em um consultório médico no centro da cidade no contraturno do ensino médio.

O salário era baixíssimo, mas pelo menos ela podia comprar seus itens básicos de higiene feminina, sem pedir aos pais. Aprendeu a poupar desde cedo e seu pequeno salário até que rendia. Na maioria dos dias, ia andando para o trabalho e escola, no centro da cidade, com o objetivo de economizar o valor do transporte público para comprar outras coisinhas que seus pais não podiam proporcionar. Ela também se divertia ouvindo belas histórias dos bons velhinhos que frequentavam o consultório de cardiologia, e não poucas vezes, ganhava doces pela atenção que dedicava a eles.

Foi também a necessidade que fez Maria ir trocando de emprego para ganhar mais, chegando até o mundo das vendas. Vendeu colchão, assinatura de TV, trabalhou até em ótica. Ela queria ganhar mais dinheiro para poder pagar suas necessidades e aliviar seus pais.

Mas foi o propósito que motivou Maria a seguir estudando, mesmo sem recursos. Muito “conversadeira”, como diz sua avó, Maria descobriu que a universidade federal do seu estado oferecia cursos técnicos, totalmente gratuitos e à noite. Diferente da graduação, em que as aulas poderiam ser em turnos alternados, impedindo a manutenção do seu trabalho, que para ela não era opcional.

Maria estudou muito em seu tempo livre. Enquanto suas amigas adolescentes assistiam clipes na MTV e dormiam até mais tarde, ela estudava. Quando viu a lista de cursos disponíveis, teve muita dúvida. Escolheu contabilidade, afinal gostava muito de matemática. Mal sabia ela…

Seu propósito gritava alto, dizia que ela seria uma boa profissional, que teria melhores condições financeiras e uma vida mais confortável.

A necessidade fazia com que Maria tivesse força e coragem para acordar antes que todos em sua casa para trabalhar na capital, pegar o primeiro ônibus do dia e voltar no último. Eram três transportes públicos para ir ao trabalho e outros três para voltar. Por vezes, tinha medo, ao sair e voltar a noite, quando não havia muitas pessoas na rua. O retorno, no último ônibus, até que era bem divertido, fez amigos que estavam na mesma jornada, aqueles minutos após um dia super cansativo, era de muita descontração e altas gargalhadas. O motorista do ônibus, possivelmente louco para encerrar seu expediente, também curtia o agito.

Logo nos primeiros meses no curso técnico, e após falar com quase todos os professores e funcionários, conseguiu um estágio em uma secretaria de pós-graduação da própria universidade, de forma remunerada. Passava o dia por lá e almoçava no restaurante universitário por um valor simbólico. Bons tempos… se alimentava bem diferente dos lanches ultra processados e o mais barato que pudesse encontrar pelo caminho.

Ainda pelo propósito, Maria procurava um estágio em contabilidade, queria aprender na prática e se tornar uma boa profissional. Quando se aproximava do final do curso, a oportunidade apareceu e iniciou o seu primeiro estágio. Lá, conheceu profissionais incríveis, que a ensinaram muito e alguns até se tornaram seus amigos de longa data.

Mas o propósito era maior, ela queria ser a primeira da sua família a se formar na faculdade. A ter o “canudo”. Queria ser uma profissional.

Infelizmente, a universidade federal ainda não era uma opção para ela que trabalhava diariamente em horário comercial. Então, lá foi ela procurar uma universidade particular que pudesse pagar com seus poucos recursos. Passou na prova e iniciou com o mínimo de disciplinas possível, apertando seu orçamento e voltando a comer ultra processados baratíssimos para aguentar chegar em casa após a meia noite e comer o delicioso feijão da sua mãe. No almoço, levava marmitas de dar inveja, sempre com o apoio de sua mãe que após um longo dia de trabalho, se dedicava aos filhos e a casa integralmente.

Maria conseguiu um emprego em uma multinacional, como assistente, sua curiosidade em aprender e sua disponibilidade para fazer o que fosse preciso, fez com que logo se tornasse analista.

Com o passar do tempo uma oportunidade para trabalhar em São Paulo surgiu e Maria a agarrou com as duas mãos. Ela trabalhava com muitas pessoas que ficavam na matriz em SP, sabia que lá abriria um mundo de possibilidades. Foi com uma dor no peito e bastante medo que Maria despediu-se de seus pais, que choravam de orgulho e preocupação ao mesmo tempo. Ela disse: “Está tudo bem. Se não der certo, eu volto”.

Foi o propósito que a encorajou e a manteve firme, mesmo diante dos desafios que a vida trazia. Ainda na faculdade, agora pagando aluguel e precisando cuidar de si mesma, sem o delicioso feijão da sua mãe. Enfrentou colegas que não gostavam do seu perfil curioso, que “mexia no queijo dos outros”, mas fez muito mais amigos que a apoiaram de muitas formas. Aprendeu muito, teve experiências de vida que jamais imaginou.

Maria se formou na faculdade, fez duas pós-graduações, inúmeros cursos de extensão e atualizações na área tributária. Passou por algumas grandes empresas, aprendeu muito, fez amigos. Hoje, tem uma vida honesta e confortável. Ainda acorda mais cedo do que gostaria para trabalhar. Mas essa é uma outra história.

A necessidade a fez levantar cedo e sair para trabalhar, mas foi o propósito que a tornou uma profissional tributarista.

Para satisfação dos seus pais, Maria voltou para sua cidade natal. Mas diferente da promessa que fez em sua despedida, voltou porque deu certo. Voltou porque o propósito evoluiu e construir uma nova família perto da sua também se tornou prioridade de vida. Voltou porque sabia a importância, para seus pais, da convivência com os futuros netos. Após uma longa jornada, Maria teve a opção de seguir crescendo na sua carreira e manter laços fortes com a sua família.

Muito prazer. Eu sou a “Maria”.

Eu ainda tenho a necessidade de trabalhar para manter a minha família, mas o propósito segue sendo minha principal escada na vida.

E você? Sua carreira realmente faz parte da sua vida?