Na mira da revisão de gastos anunciada pelo governo, as regras da Previdência não devem sofrer alterações estruturais no terceiro mandato de Lula. Esse é o cenário de momento de fontes que acompanham o assunto de perto. A escalada recente nessa despesa, causada pela combinação de política de reajuste real do salário mínimo com redução da fila do INSS, tem gerado forte inquietação no mercado financeiro e estimulado a retomada do debate sobre a necessidade de uma nova reforma, que seria capaz de conter seu ritmo de alta.
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Inclusive no governo. A ideia de avançar na discussão no ano que vem já chegou a ser ventilada pelo ministro dos Transportes, Renan Filho, em conversa recente com empresários, e conta ainda com o respaldo de uma ala do centrão do Congresso. Mas a leitura está longe de ter massa crítica no governo. Quem tem sido ouvido por Lula sobre mudanças nas regras de acesso à aposentadoria avalia que a própria configuração do atual Legislativo, bem mais à direita do Planalto, é um obstáculo para o avanço do tema até 2026.
Além da leitura de que o atual governo não tem mandato para encarar um tema tão polêmico e tão pouco tempo depois da última reforma (ocorrida em 2019), aponta-se o temor de se embarcar na reformulação das regras da previdência e perder o controle da discussão no âmbito parlamentar. É um cenário que, de acordo com essas fontes, não deve mudar mesmo com a troca de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco no comando das Mesas da Câmara e do Senado, respectivamente, no início do ano que vem.
Mesmo quem é contra uma mudança no regime geral nesse governo, avalia que dificilmente, dadas as premissas atuais, se escapará da discussão de uma nova reforma a partir de 2027. Enquanto não se faz nada mais estrutural no curto e médio prazo, o governo mira a entrega do pente fino nos cadastros do INSS. Dos R$ 25,9 bilhões estimados pelo governo de corte de despesa com a revisão de gastos indevidos, a estimativa é de obter cerca de R$ 10 bilhões a partir da revisão nas aposentadorias e no BPC, o Benefício de Prestação Continuada.
Esse último, aliás, também deve ter, para além do pente-fino no cadastro, regras mais restritivas de acesso a serem anunciadas nos próximos dias. E a ideia do governo é que se faça com maior frequência a revisão dos beneficiários, mantendo um controle mais estreito dessa despesa. A urgência em adotar medidas para o BPC se justifica porque o crescimento da despesa com esse benefício vem sendo muito acima do esperado. E o governo quer conter o tamanho de novos congelamentos de gastos no orçamento para viabilizar o cumprimento do arcabouço fiscal e do resultado primário deste ano.
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A medida é tratada como um passo dentro de um esforço maior a se intensificar no ano que vem, com eventual avanço em discussões que pudessem tornar o orçamento menos engessado. Entre elas está a possibilidade de desvinculação desse e outros benefícios em relação ao salário mínimo. O problema é que Lula não quer o avanço dessa discussão e tem respaldo da ala mais à esquerda do governo.
Nas discussões sobre o que fazer no lado dos gastos, especialmente previdenciários, outro problema colocado é sobre as regras para militares. Praticamente blindados da última reforma na área feita pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, o consenso até aqui dentro governo é de que eventuais ajustes deveriam começar pela caserna, já que o custo proporcional por indivíduo para os cofres públicos é muito maior do que o regime geral.
Do ponto de vista político, porém, a ideia enfrenta resistência por representar mais um foco de desgaste para Lula em meio a relação de desconfiança com os militares. Sem um movimento mais forte de respaldo por parte do Congresso, dificilmente um governo que por pouco não foi alvo de um golpe vai enfrentar tema tão espinhoso.
Seja como for, o governo está tentando efetivar alguns sinais do lado do gasto, iniciando com as novas regras do BPC. No conjunto de medidas que virão até o orçamento, fará menos do que o mercado quer. Mas se conseguir pelo menos ganhar sobrevida para o arcabouço fiscal até 2026, já será um avanço. E esse ainda é um grande “se”.