A Lei de Incentivo à Reciclagem, também conhecida como “Lei Rouanet da Reciclagem” (Lei 14.260/2021), deve finalmente receber regulamentação por meio de um Decreto Presidencial e por uma Portaria do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
O decreto trará o detalhamento dos procedimentos de recebimento de propostas para incentivar as indústrias e as entidades dedicadas à reutilização, ao tratamento e à reciclagem de resíduos sólidos produzidos no território nacional. Estes documentos estão em fase avançada de elaboração com as minutas em tramitação pela área jurídica e entre ministérios que serão impactados pela renúncia fiscal.
De acordo com Adalberto Maluf, secretário Nacional do Meio Ambiente Urbano e Qualidade Ambiental, a proposta de regulamentação deve ser entregue em breve à Casa Civil e a expectativa do MMA é que seja publicada no começo de junho, durante a Semana do Meio Ambiente (que é comemorada entre 31 de maio e 5 de junho) ou por ocasião do Dia Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (7 de junho).
Na visão do MMA e da Presidência, a reciclagem representa a união simbiótica de esforços de sustentabilidade não apenas na área ambiental mas principalmente de inclusão social dos catadores de materiais recicláveis, suas cooperativas e associações.
Aprovada em 2021 pelo Congresso, após a derrubada dos vetos presidenciais ao mecanismo de renúncia fiscal, sendo promulgada em 2022 pelo presidente Jair Bolsonaro, a Lei de Incentivo à Reciclagem manteve o mecanismo nos mesmos moldes da Lei Rouanet, que possibilita a dedução de até 6% do Imposto de Renda de pessoas físicas e até 1% das pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, em troca do investimento em projetos de reciclagem.
As diretrizes para ações que podem ser beneficiadas incluem desde cooperativas de catadores e empreendimentos sociais solidários, a organização de redes de comercialização, capacitação, formação e assessoria técnica, até pesquisa e desenvolvimento na área de reciclagem e economia circular.
Em paralelo aos esforços de regulamentação do mercado de crédito de carbono, o MMA planeja publicar portarias e decretos que regulamentem as regras da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que responsabiliza setores pela coleta, transporte, armazenamento, reciclagem e tratamento de resíduos produzidos pelo descarte de produtos e embalagens no pós-consumo. Uma das propostas é exigir um conteúdo mínimo de material reciclado na fabricação de novas embalagens.
Atualmente, a regulamentação é fruto de acordos setoriais voluntários, mas a intenção do MMA é passar a obrigar os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes a cumprir metas de reciclagem, o que daria maior tração aos créditos de reciclagem criados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em fevereiro do ano passado.
Também criado pela Lei Rouanet da Reciclagem e para os mesmos propósitos de sustentabilidade social e ambiental, os Fundos de Investimentos para Projetos de Reciclagem ou “Fundos ProRecicle” são atualmente objeto de Consulta Pública divulgada no final do ano passado pela Superintendência de Desenvolvimento do Mercado (SDM) da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Nesta consulta, a CVM destacou duas questões relevantes: a pertinência da não criação de nova categoria de fundos ProRecicle, o que implica a possibilidade de todas as categorias de fundos possuírem “classes de cotas” ProRecicle, e a possibilidade de a aplicação de recursos no ProRecicle ser considerada passível de obtenção de incentivo ou benefício fiscal.
Em resposta à primeira questão, parece-nos que a possibilidade de todas as categorias de fundos possuírem classes de cotas ProRecicle contribuiria com o “social washing”. Não parece viável, por exemplo, que quaisquer fundos de investimento tradicionais prevejam “classes de cotas ProRecicle”, que atenderiam aos requisitos de inclusão social e de emancipação econômica dos catadores previstos na PNRS e no decreto que criou os créditos de reciclagem.
Caso a CVM opte em não criar um fundo temático específico de reciclagem, a classe de cotas ProRecicle deveria ser restrita a compor a carteira de Fundos de Investimento em Participações (FIP) do tipo ProRecicle, ao lado dos demais tipos existentes: Capital Semente, Empresas Emergentes, Infraestrutura, PD&I e Multiestratégia.
Esta classe de cotas do FIP do tipo ProRecicle investiria em projetos de reciclagem associados à inclusão social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis. Em cumprimento ao quanto previsto no decreto que criou os créditos de reciclagem, tais classes de cotas deveriam manter, ao menos, 50% de seu patrimônio líquido investido em notas comerciais ou outros títulos de emissão de cooperativas, organizações sociais e associações de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, com a possibilidade de investimentos, amortizações e resgates com a utilização dos diferentes tipos de certificados de créditos de reciclagem de que trata o referido decreto.
Com relação à segunda questão da CVM, a respeito da possibilidade de a aplicação de recursos no ProRecicle ser considerada passível de obtenção de incentivo ou benefício fiscal, uma das respostas a esta questão estaria dada por esta regulamentação do MMA à renúncia fiscal constante da mesma lei que instituiu o ProRecicle, esperada para ser publicada nas próximas semanas.