O juiz federal Paulo Cezar Neves Junior, da 21ª Vara Cível Federal de São Paulo, indeferiu um pedido de liminar apresentado pela Maersk Brasil para suspender os efeitos de decisões da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) sobre o processo licitatório do novo terminal de contêineres Tecon Santos 10, no Porto de Santos. A empresa alegava que a inclusão de restrições à participação de operadores incumbentes no edital deveria ter sido submetida a nova audiência e consulta públicas.
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A Maersk argumentava que a Antaq violou os princípios da transparência e participação ao alterar a minuta do edital após a realização da Audiência Pública 02/2025. Em especial, questionava a decisão da agência de prever duas etapas na licitação: na primeira, ficariam impedidos de participar os atuais operadores do Porto de Santos, e, apenas na segunda etapa, caso a primeira não tenha propostas válidas, tais empresas poderiam concorrer, desde que houvesse “desinvestimento” de seus ativos já existentes.
A empresa argumentou que essa mudança “nem sequer havia sido cogitada nem discutida anteriormente” e, por isso, “é evidente que tal brusca alteração deveria ser objeto de nova consulta pública”.
Na decisão da última terça-feira (22/7), o magistrado rejeitou esse entendimento, e afirmou que “a matéria concorrencial sempre esteve presente nas reuniões da Antaq e nas duas audiências públicas mencionadas”. Segundo ele, “não merece prosperar a alegação da impetrante no sentido de que a restrição concorrencial surgiu de forma ‘superveniente’ e inédita”.
“Tais normas não exigem, ao contrário do que defende a impetrante, audiências públicas para cada minuta modificada (…). Eventuais alterações em pontos específicos da minuta, ainda que relevantes, não necessariamente impõem a realização de nova audiência pública”, escreveu na decisão.
Ao negar a liminar, o juiz destacou que a análise se limitava ao aspecto formal do processo, isto é, se seria obrigatória nova audiência pública. Assim, não se refere ao mérito da decisão administrativa da Antaq.
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Contatada, a Maersk, em nota, afirmou que “defende regras claras no edital do Tecon Santos 10, que garantam a livre concorrência e estejam à altura desse ativo estratégico para o país. A companhia reafirma seu compromisso com a competitividade do Brasil e exalta a importância da transparência e publicidade na condução de todos os processos relacionados ao leilão do Tecon Santos 10”.
Segundo a Maersk, “a decisão proferida neste momento se refere apenas ao pedido de uma nova consulta pública e não analisou o mérito da restrição sugerida no edital. A empresa seguirá o curso natural do processo, avaliando a interposição de recurso e buscando as medidas cabíveis para fazer valer o direito a uma concorrência ampla, isonômica e alinhada ao interesse público”.
Para Marcela Bocayuva, mestre em Direito Público e especialista em Direito Portuário, o indeferimento da liminar “mostra que o Judiciário reconheceu a legitimidade da atuação técnica da Antaq” e a decisão “reforça o papel do Estado na defesa da infraestrutura estratégica e sinaliza que o setor portuário brasileiro é mais do que uma via de escoamento de cargas. É uma peça central na arquitetura da soberania nacional”.
Tecon Santos 10
O projeto de um novo terminal em Santos teve início em 2013, dentro do Programa Nacional de Arrendamento de Áreas e Instalações Portuárias, mas não avançou. A ideia era desafogar o maior porto da América Latina, que hoje opera perto de sua capacidade máxima.
A retomada aconteceu apenas em 2019, quando houve um novo hiato até outubro de 2024. Na ocasião, o Ministério de Portos e Aeroportos reformulou a proposta, e a batizou como Tecon Santos 10. Projetado para ser o maior terminal do país, com capacidade de movimentação de 3,5 milhões de TEUs (unidade de medida para contêineres) a partir de 2034, o Tecon Santos 10 terá contrato de arrendamento de até 70 anos.
A licitação do terminal foi objeto de uma primeira audiência pública em 2022 e outra em 2025. A Antaq afirmou que recebeu 538 contribuições pelo sistema oficial, além de pareceres e estudos de diversos órgãos, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda.
Segundo o juiz, esse debate prévio sobre as restrições demonstra que “não se trata de alteração superveniente” e que “todas as contribuições serviram de subsídio para a análise concorrencial”, conforme a Nota Técnica 51/2025/GRP/SRG. A Antaq também afirmou que a medida de dividir a licitação em duas etapas foi uma das alternativas discutidas publicamente, com o objetivo de evitar concentração de mercado e práticas anticompetitivas.
Além disso, para o magistrado, o edital continua em fase preparatória e sujeito a revisões, já que tanto o Tribunal de Contas da União quanto a Comissão de Viação e Transportes da Câmara dos Deputados ainda debatem os termos da licitação.
O número do processo é 5017328-89.2025.4.03.6100.