As recentes discussões sobre o aumento do IOF e outras medidas tributárias propostas pelo governo federal para recompor a arrecadação merecem uma análise crítica – não apenas técnica, mas também estrutural. O que temos assistido é, novamente, uma tentativa de tampar o sol com a peneira: diante da frustração das receitas previstas, o governo recorre a soluções pontuais e imediatistas, como o aumento da carga tributária, ao invés de enfrentar de forma responsável a verdadeira raiz do problema – o descontrole das despesas públicas.
É importante destacar que essa movimentação fiscal ocorre em meio à constatação de que a arrecadação federal não vem atingindo os patamares esperados. Diante disso, o governo procura alternativas para cobrir déficits crescentes, recorrendo à elevação de tributos de forma seletiva e, muitas vezes, questionável.
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Essa abordagem, no entanto, ignora uma lição elementar da economia doméstica: quando se gasta mais do que se ganha, o primeiro passo é rever os gastos. No setor público, essa lógica parece invertida. Em vez de discutir uma reestruturação das despesas, cortando excessos e otimizando a gestão dos recursos, a solução encontrada é sempre o aumento da arrecadação, mesmo que isso signifique mais peso sobre o setor produtivo e o contribuinte.
É nesse contexto que surge a proposta de aumentar a alíquota do IOF – um imposto que, por natureza, é extrafiscal, ou seja, deveria servir para orientar comportamentos econômicos e não para arrecadar. A escolha do IOF como instrumento de ajuste revela uma intenção clara: ele pode ser cobrado imediatamente, sem precisar respeitar a regra da anterioridade anual nem o prazo de 90 dias, ao contrário de outros tributos. Assim, o governo dribla as limitações constitucionais para gerar receita no curto prazo.
Essa manobra, no entanto, pode trazer sérias consequências jurídicas. A ampliação do alcance do IOF sobre operações que não se caracterizam claramente como operações de crédito – como é o caso do “risco sacado” – levanta questionamentos relevantes sobre a legalidade da incidência do tributo nesses casos. A discussão gira em torno da própria natureza dessas operações e se elas realmente se enquadram nas hipóteses de incidência previstas para o IOF. Ou seja, há um potencial risco de judicialização que pode comprometer o objetivo arrecadatório da medida.
Outro exemplo são as discussões sobre a tributação das apostas e a elevação da alíquota do imposto de renda sobre os ganhos nesse setor. Aqui, a limitação é temporal: por se tratar de imposto sujeito à anterioridade anual, a cobrança só poderia começar em 2026. Já a proposta de aumentar a Contribuição Social sobre o Lucro (CSL) das instituições financeiras e fintechs tem viabilidade maior, pois exige apenas o cumprimento do prazo de 90 dias. No caso das fintechs, inclusive, trata-se de uma equiparação razoável, considerando que muitas já operam como verdadeiras instituições financeiras.
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Isso vale para o fim da isenção do imposto de renda sobre aplicações como LCI, LCA, CRI, CRA e debêntures incentivadas. Essas isenções têm atraído investidores, criando distorções no mercado de renda fixa. Corrigir esse desequilíbrio pode ser positivo – desde que feito com planejamento, por meio de lei e com vigência futura.
No entanto, o problema não está apenas no conteúdo das propostas, mas na lógica por trás delas. Como bem observou o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, essas medidas vêm desacompanhadas de qualquer projeto de reestruturação estrutural do Estado.
Em suma, o Brasil precisa de uma reforma fiscal de verdade. Uma que vá além do aumento pontual de impostos, que enfrente com seriedade o crescimento descontrolado das despesas públicas e que promova justiça e racionalidade tributária. Qualquer caminho diferente disso é apenas mais um remendo em um tecido que está prestes a rasgar.