Interpretação subjetiva aumenta a insegurança jurídica no mercado de capitais

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A insegurança jurídica é tema fundamental na hora de falar sobre o mercado de capital. O excesso de judicialização, a demora de decisões e a falta de transparência são comumente citados como fatores que estremecem a confiança do investidor estrangeiro no país. Para debater o tema, a Casa JOTA realizou um evento na última quarta-feira (19), em São Paulo, com patrocínio da Ternium.

Na conversa, Luciana Ribeiro, sócia-fundadora da EB Capital, reafirma a segurança jurídica como um fator determinante na hora de tomadas de decisões sobre investir ou não no país. “Quando falo com investidores, principalmente internacionais, as grandes preocupações hoje estão em três temáticas. A primeira é a volatilidade do câmbio, a segunda é custo de capital, e a terceira é a insegurança jurídica. Neste caso, o que importa para todos é saber que as regras do jogo não serão alteradas e que se tenha previsibilidade.”

Como exemplo da importância do tema, ela cita a temática de investimento em infraestrutura e a previsibilidade das autorizações e das licenças ambientais. “Isso não é um problema só aqui no Brasil, mas qual investidor vai colocar seu dinheiro em um projeto que pode demorar doze anos para ser aprovado? Ter clareza de prazos e de celeridade é fundamental”, afirma.

Pablo Cesário, presidente-executivo da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), concorda com os desafios e fala da complexidade em encontrar uma solução para a insegurança jurídica no Brasil. “É preciso de discussão profunda para que haja um processo regulatório com previsibilidade. Do contrário, vivemos a situação atual: um país com agências reguladoras criativas, que decide por interpretações.”

Otávio Yazbek, advogado e ex-diretor da CVM. Foto: Cláudia Magalhães/Nome Filmes

Como exemplo, Cesário avalia o PL 2.925/2023, que reforma a Lei das S.A. O projeto em andamento no Congresso altera as leis 6.385 e 6.404 para dispor sobre a transparência em processos arbitrais. Aprimora ainda o sistema de tutela privada de direitos de investidores do mercado de valores mobiliários. “Essa é uma discussão central, pois temos um modelo que é, essencialmente, europeu, e difere do norte-americano, inspirado na tradição de privatizar o enforcement legal ou permitir as ações públicas coletivas.”

O presidente-executivo da Abrasca comenta que o cerne da discussão é qual o padrão ideal a ser usado para punir ações legais no mercado. “O PL 2.925/2023 busca um modelo intermediário. Não queremos que seja como o norte-americano, que pode aumentar a litigância predatória que já existente. É um debate em andamento complexo do ponto de vista técnico, mas necessário.”

Ternium versus CSN

Outro exemplo prático em termos de segurança jurídica foi citado pelo advogado, ex-diretor da CVM Otávio Yazbek: o caso da Ternium versus CSN, que se arrasta na Justiça há mais de uma década. “Para mim, a decisão final do STJ no caso Ternium é equivocada. Ignora todo o histórico de decisões antecedentes e o que foi consolidade pela CVM, que tem competência legal para interpretar a Lei das S.A. Ainda: abre espaço para qualquer tipo de análise subjetiva acerca alienação de controle.”

Ao olhar para o futuro, Yazbek cita alguns assuntos que tendem a chegar ao Poder Judiciário. Entre eles estão o acionista de referência, a caracterização de pessoas ligadas ao controlador, as poison pills estatutárias e o grau de vinculação de administradores a acordo de acionistas. “Existem alguns assuntos que tendem a gerar necessidade de uma decisão mais clara, eventualmente em sede judicial. Esses são temas que são permanentes fontes de insegurança jurídica.”

Avanços

Luciana Ribeiro, sócia-fundadora da EB Capital. Foto: Cláudia Magalhães/Nome Filmes

Apesar dos desafios, Luciana Ribeiro salienta o avanço e crescimento dos últimos anos: “O mercado de capitais brasileiro tem crescido muito em termos de relevância e sofisticação. Nos últimos vinte anos, esse mercado saiu de menos de 1% para quase 6% do PIB [Produto Interno Bruto]. E isso é decorrência de um avanço importante na questão regulatória, na forma como se protege o investidor.”

A sócia-fundadora da EB Capital comenta ainda que não tem dúvidas sobre o mercado de capitais ter como premissa básica a proteção do investidor: “Além do investidor internacional, cada vez mais o pequeno investidor precisa sentir confiança. Nesse sentido, deve-se avançar em celeridade, transparência, clareza de entendimento do porquê de tomadas de decisões”, conclui.

Assista ao evento na íntegra: