Incra oficia CVM e Jucesp para evitar transferência do controle da Eldorado Celulose

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O superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no estado de Mato Grosso do Sul, Paulo Roberto da Silva, enviou ofícios à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e à Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp) com o objetivo de evitar a formalização da transferência do controle da Eldorado Brasil Celulose para a empresa Paper Excellence, “diante da ausência das autorizações das instâncias competentes” — no caso, o próprio Incra e o Congresso Nacional. Trata-se de um novo capítulo na batalha entre Paper Excellence e J&F pelo controle da Eldorado Celulose.

O fundamento dos ofícios do Incra é que a a CA Investment, subsidiária da Paper Excellence que comprou as ações da Eldorado Celulose, é uma empresa com sede no Brasil, mas que tem como acionistas uma companhia holandesa e outra malaia. Trata-se, portanto, de uma empresa brasileira equiparada a estrangeira, de acordo com o Incra. E com a transferência do controle da Eldorado Celulose, que detém 11 imóveis rurais com 14.486,8319 hectares no Mato Grosso do Sul, a empresa também passaria a ser considerada uma companhia equiparada a estrangeira.

“Diante da caracterização, era indispensável o pedido de autorização prévia para operações societárias quem (sic) repercutissem mesmo que indiretamente, compra e arrendamento de imóveis rurais, de acordo com a legislação vigente”, afirmam em nota técnica os analistas do Incra João Batista Queiroz Eudociak e Paulo Roberto Lucca.

Os analistas recomendaram que o Incra orientasse “a empresa Eldorado Brasil Celulose S.A. e suas acionistas, nos termos do Cap. 11 do Manual de Orientação para Aquisição e Arrendamento de Imóvel Rural por Estrangeiro, sobre a possibilidade de, em comum acordo entre o adquirente e o transmitente, cancelar a aquisição e -após – permanecendo o interesse, solicitar previamente ao INCRA e demais órgãos competentes a autorização, que deverá ser requerida pelo adquirente na forma prevista na Instrução Normativa n. 88 de , de 13 de dezembro de 2017 e no Manual de Orientação para Aquisição e Arrendamento de Imóvel Rural por Estrangeiro”.

Diante dos ofícios e da nota técnica, a Eldorado Celulose afirmou em nota ao mercado que “o INCRA comunica a Eldorado e suas acionistas que como o Contrato violou as Leis nº 5.709/1971 e 9.629/1993, o Decreto nº 74.965/1974 e a Instrução Normativa nº 88/2017 e é nula de pleno direito, nos termos do art. 15 da Lei nº 5.709/1971, tendo como solução o desfazimento do negócio entabulado em 2017, e determina a comunicação à Junta Comercial do Estado de São Paulo e CVM”. Trata-se de uma interpretação, já que não há menção textual ao artigo 15 da Lei 5.709/1971, nem à palavra nulidade, nos documentos do Incra.

A J&F, holding dos irmãos Batista, por sua vez, afirmou que tomou conhecimento da posição adotada pelo Incra, idêntica àquelas já manifestadas pela Advocacia-Geral da União (AGU) e pelo Ministério Público Federal (MPF). “Em razão da conclusão técnica do Incra de que o contrato de venda da Eldorado não poderia ter sido firmado, e considerando que a AGU já afirmou em três pareceres que ‘a consequência é a nulidade de pleno direito’, a J&F aguarda a concordância da Paper Excellence para o desfazimento amigável e voluntário do negócio, como recomendado pela autarquia, com a devolução do valor já pago, evitando assim prejuízos ainda mais graves às operações da Eldorado”.

A interpretação da Paper Excellence é divergente. “A Paper entende que o contrato de compra da Eldorado atende às preocupações do Incra, do MPF, bem como da própria Justiça, uma vez que a operação não compreende compra de terras rurais, mas sim de um investimento em um complexo industrial. A Paper adquiriu uma fábrica de celulose, em que a madeira é insumo e não a atividade principal, não sendo necessário, portanto, ter propriedades rurais ou arrendamentos de terras”, afirma. A empresa diz confiar que as autoridades agirão de modo a garantir a segurança jurídica no Brasil, “visando ao respeito dos contratos e da Lei, sem criar uma situação inédita contrária aos investimentos no país”.

Em outra frente da batalha jurídica, a J&F tenta anular na Justiça uma decisão arbitral da Câmara de Comércio Internacional (ICC) que havia reconhecido, por 3 votos a 0, o direito de a Paper Excellence assumir o controle da Eldorado. Na ocasião, o negócio de R$ 15 bilhões não foi finalizado, já que a J&F não aceitou o resultado e acionou o Judiciário.

A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) começou a julgar no ano passado. Dois desembargadores já votaram para negar o recurso da J&F contra uma decisão que havia mantido a sentença arbitral. Eles também voltaram para condenar a empresa a pagar uma multa de R$ 30 milhões por litigância de má-fé. O julgamento foi interrompido por um pedido de vista do desembargador Eduardo Azuma Nishi.

O julgamento do recurso pode ser finalizado depois do voto de Nishi se ele acompanhar o relator. Caso o voto seja divergente, outros dois desembargadores serão convocados a se manifestar. O julgamento deve ser retomado já em janeiro.

Em outro processo, em julho do ano passado, o desembargador Rogério Favreto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), suspendeu os atos de transferência das ações da Eldorado Brasil Celulose e a aquisição de imóveis rurais no território brasileiro pelas empresas Eldorado Brasil Celulose S/A, Paper Excellence BV, CA Investment Brazil S/A, até que elas apresentassem autorizações do Incra e do Congresso Nacional.