Desde que o presidente Lula afirmou, no dia 7 de março, que o Brasil precisava criar um “plano de inteligência artificial” genuinamente nacional e que atendesse às necessidades da população, abriu-se mais uma frente de trabalho sobre a IA no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
A IA é claramente uma prioridade do governo, demonstrado pelo processo de revisão da Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial (EBIA) desde o fim do ano passado, e a liderança do MCTI nos trabalhos do G20, com enfoque na equidade social e no desenvolvimento sustentável. Contudo, não está ainda muito claro, pelas informações já publicizadas a seu respeito, de que forma o Plano Nacional de Inteligência Artificial (PNIA) se diferencia da EBIA, mas a consulta pública poderia beneficiar ambas.
Se analisarmos essas estratégias nacionais sob a ótica da sustentabilidade ambiental, há um foco no que tem sido chamado de IA para sustentabilidade, focada na aplicação de sistemas de IA, o que não está necessariamente relacionado à sustentabilidade da IA.
Para tratar de sustentabilidade nesse caso temos de considerar toda cadeia de valor da IA, desde o trabalho realizado, passando pela extração de matéria-prima, matriz energética, emissão de gases de efeito-estufa provenientes da produção e distribuição de infraestrutura física, como de data centers, e do processamento, pelo consumo de água para resfriamento, até chegar nos modelos de previsão climática e governança de dados ambientais e geodados. Este texto busca avançar em alguns desses elementos para uma política pública, no caso a EBIA e, talvez o PNIA, de forma a promover a IA sustentável nos países.
Um capítulo ambiental na nova EBIA e no PNIA? Só com esforços conjuntos
No que tange à infraestrutura, ao planejar a construção de data centers, por exemplo, os governos devem investir em soluções que otimizem o consumo de recursos e concentrem a construção desses centros em áreas onde a água é mais abundante e as fontes de energia são as menos impactantes possíveis. É importante reconhecer, contudo, que fontes renováveis de energia não são uma panaceia.
As políticas para aumentar a vida útil de hardwares também são relevantes, tanto para diminuir a demanda por minerais quanto para reduzir o lixo eletrônico. É chave avançar nas discussões legislativas em torno do chamado direito ao conserto. A economia circular poderia ser uma obrigação no caso da IA ou ser incentivada.
Aprender com as comunidades indígenas, inclusive urbanas, bem como capacitá-las sobre como desenvolver, implantar e refletir sobre esses sistemas é fundamental para fazer florescer os sistemas que nós, como sociedade, mais desejamos, sem cair em armadilhas tecnossolucionistas.
As estratégias de IA poderiam promover usos comunitários e territorializados da IA e fornecer metodologias para avaliar essas demandas e correlacioná-las com o trabalho dos órgãos ambientais, assegurando a soberania estatal ou indígena sobre os sistemas e os dados.
É necessário olhar a transição climática, energética e digital de forma integrada, suscitando interlocuções com vários ministérios, como Minas e Energia, Meio Ambiente, Povos Indígenas e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. Além disso, o esforço interministerial deve contemplar universidades, empresas, órgãos de padronização e associações para criar técnicas e parâmetros que garantam a sustentabilidade dos sistemas de IA.
Vale questionar se é ou não possível ter um desenvolvimento sustentável da IA, afinal o desenvolvimentismo em si suscita diversas contradições. Mas é possível pensar em uma IA sustentável, se não for liderada por grupos dominantes da minoria global. Ações preventivas precisam ser adotadas imediatamente, mas o processo pode amadurecer na Cúpula do Futuro, passar pela cúpula do G20 e terminar na COP30.