Sindicatos e associações que representam servidores públicos rejeitam mudanças na estabilidade e criticam o uso da reforma administrativa como instrumento de corte de gastos. Em audiência pública na Câmara dos Deputados, na terça-feira (17/6), as entidades também rechaçam o prazo de 45 dias do grupo de trabalho (GT) e o tempo de fala de três minutos para as exposições dos participantes.
Na avaliação das entidades, o prazo de 45 dias para o grupo de trabalho e o tempo de fala nas audiências inviabilizam o debate de um tema com a complexidade e importância como a reforma administrativa. Diante disso, o relator do GT, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), afirmou que avalia convocar uma nova audiência pública para ouvir as categorias.
“Construir essa proposta nos soa como algo bastante perigoso e não necessariamente vinculado aos objetivos anunciados; 37 anos em 37 dias, não dá”, afirmou Celso Mariani, da Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco).
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João Domingos, da Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CPSB), defendeu que o impacto da reforma será maior em estados e municípios e propôs, nesse sentido, a realização de audiências públicas regionais: “Os problemas centrais dessa reforma, como, por exemplo, contratação de temporário, avaliação de desempenho, eles nem são um grande problema na Administração Federal, eles são problemas lá nos estados e municípios”.
Outro ponto de destaque foram as críticas dos representantes dos servidores a tentativa de fazer da reforma administrativa um instrumento de corte de gastos.
“Nós refutamos e rechaçamos qualquer tentativa de usar a reforma administrativa como uma janela de oportunidade para inviabilizar aquilo que diz a Constituição Federal, para inviabilizar o Estado social”, afirmou Dão Real Pereira dos Santos, do Sindifisco Nacional.
Além disso, o deputado André Figueiredo (PDT-CE) reforçou que o objetivo da reforma não é mexer na estabilidade dos servidores. Os representantes dos servidores, no entanto, alertaram que o crescimento de servidores temporários e a introdução de avaliações de desempenhos que podem levar à demissão podem fragilizar essa estabilidade.
“A estabilidade é uma proteção da sociedade, é uma proteção do interesse público. Se você vir um parlamentar defendendo o fim da estabilidade, certamente você estará diante de um mau político que pretende facilitar os desvios, a corrupção e fazer rachadinha, porque servidor público efetivo e estável não pratica rachadinha”, ponderou Eduardo Couto, da Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário nos Estados (Fenajud).
As entidades destacaram que a avaliação de desempenho sem critérios objetivos não combate a ineficiência do Estado e pode fragilizar a autonomia dos servidores públicos.
Elizabeth Hernandes, da Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental (Anesp), considerou que, embora o grupo de trabalho reafirme que não mexerá na estabilidade, o modelo de contratos temporários pode impactar na estabilidade. Segundo ela, o uso indiscriminado desse modelo compromete a qualidade do serviço público e pode aumentar os riscos de corrupção.
“O número de vínculos temporários no serviço público aumentou incríveis 1.760% entre 2003 e 2022, passando de 40 mil pessoas para mais de 716 mil pessoas”, afirmou Alisson Souza, do Sindilegis. “Nós precisamos […] unir esforços […] por acaba com esse sistema de contratação temporária que tem precarizado o serviço público”, adicionou a deputada Gisela Simona (União-MT).
Por outro lado, a deputada Luciene Cavalcanti (PSol-SP) alertou que a avaliação de desempenho pode se tornar, na prática, um instrumento de assédio institucional. “A gente não quer [essa] farsa de avaliação de desempenho se transforme em assédio, perseguição. Porque é isso que no final das contas acaba acontecendo, como está acontecendo hoje na rede estadual de educação, onde os professores estão sendo perseguidos e assediados”, disse.
Na abertura da audiência, Pedro Paulo reforçou que ainda não há definição sobre o texto final e disse que o objetivo das audiências é apenas receber sugestões de propostas. O relatório final do grupo de trabalho será apresentado em 14 de julho.
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“O momento agora do plano de trabalho do grupo é colher as propostas, fazer as reuniões técnicas e, aos poucos, nós vamos construindo dentro do modelo possível de consenso, dentro do grupo, aquelas propostas que nós entendamos que sejam as propostas que possam produzir um avanço do Estado, da modernização do Estado”, afirmou o parlamentar.
Críticas do setor produtivo à estabilidade
Enquanto os servidores defendem a estabilidade, o modelo atual é alvo de críticas do setor produtivo. Em audiência durante a tarde de terça-feira, os representantes do setor alegaram que a estabilidade prejudica a qualidade das entregas à população e a produtividade do país.
André Saconato, da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CN), fez defesa enfática da avaliação de desempenho, ao avaliar que não se trata de reduzir o tamanho do Estado, mas de premiar os servidores com bom desempenho e demitir aqueles com baixo desempenho. “Quem tem medo de avaliação? Quem vai mal. Quem é bom não tem medo de avaliação”, afirmou.
Na mesma linha, Juan Carlos Arruda, do Ranking dos Políticos, pontuou que a estabilidade “protege a mediocridade e pune quem trabalha”. Segundo ele, apenas 0,2% dos servidores federais são desligados por baixo desempenho. “Se nós temos um sistema onde somente 0,2% de servidores são desligados por baixo desempenho, a verdade é que o sistema hoje está protegendo a mediocridade e é preciso mudar algo nesse sentido”, afirmou.
Por outro lado, o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia, da Fin (Confederação Nacional das Instituições Financeiras), citou as agências reguladoras como exemplo de ineficiência do serviço público brasileiro. Maia disse que as agências estão “sucateadas” e defendeu um modelo híbrido com enfoque em gestão técnica e blindagem contra interesses políticos. “O melhor para a indústria financeira, e acho que para o Brasil, é que essas agências tivessem um modelo híbrido entre público e privado”, completou.