O alto volume de processos relacionados à saúde, com quase 900 mil ações em andamento, é consequência de falhas nas políticas públicas e nas vias administrativas de acesso, defende a jurista Daiane Lira, conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e supervisora do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (Fonajus).
“Mais de 800 mil pessoas precisaram do Judiciário para ter garantido o seu acesso à saúde. Isso é um problema”, disse.
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A conselheira argumentou que o número excessivo de ações judiciais no setor não está sempre ligado a temas complexos, como no caso dos medicamentos de altíssimo custo ou de novas tecnologias.
A maior parte dos processos diz respeito a medicamentos padronizados e já incorporados ao Sistema Único de Saúde (SUS), ao andamento da fila de procedimentos e cirurgias, leitos de UTI. Na saúde suplementar, ela lembrou, grande parte das ações está ligada a procedimentos já incluídos no rol da ANS.
As falas ocorreram no evento “Diálogos da Saúde”, organizado pelo JOTA PRO, em Brasília, nesta segunda-feira (26/5).
A conselheira também destacou que, em alguns casos, há uma lacuna nas políticas públicas. Não existem, por exemplo, parâmetros claros para o tratamento do Transtorno do Espectro Autista (TEA) em crianças, argumenta. Dessa forma, são judicializados casos em que se solicita a realização de 40 e até 80 horas de terapias complementares para as crianças com TEA, exemplificou.
Algo similar ocorreu com a política de tratamento do câncer, que só recentemente teve uma regulamentação nacional que ainda está incompleta.
Especialização
Além de ampliar o diálogo com as demais instituições, uma grande aposta da conselheira é a especialização dos magistrados e o estímulo à criação de varas especializadas ou núcleos de saúde no maior número possível de regiões.
“Não é mais possível decidir em saúde somente o que a gente chama de direito à esperança”, argumentou.
Para Daiane, os magistrados precisam levar em consideração, além da prescrição médica, os níveis de evidências científicas. Precisam também entender para quais casos aplicar cada tipo de exigência.
Nesse sentido, a conselheira defende o aperfeiçoamento técnico dos juízes em todo o país, que devem conhecer também os processos de avaliação e incorporação de tecnologias. Também é preciso lembrar do impacto sistêmico das decisões tomadas na área da saúde, tanto na suplementar quanto na saúde pública.
“Uma decisão nunca é só sobre aquele paciente, que recebe o benefício através do pedido judicial”, argumentou, no sentido de que há impacto em toda a cadeia do setor.
A conselheira Daiane Lira destacou que o Fonajus e o CNJ estão abertos ao diálogo com o setor e que vê com bons olhos a troca de experiências sobre a judicialização da saúde.