Eletrobras reivindica no STJ alteração de repetitivo com impacto de R$ 4 bi

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A Eletrobras tem pleiteado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) a alteração de três repetitivos de 2009 envolvendo a devolução de valores relacionados a empréstimos compulsórios de energia elétrica.

Segundo a companhia, um erro na proclamação do resultado teria feito com que a tese fixada não correspondesse ao que foi decidido durante o julgamento, gerando uma aplicação equivocada do precedente pelo Judiciário. Ainda, por conta da situação, que afeta mais de 2.700 processos, a Eletrobras possuía, no final de 2024, uma provisão de R$ 4,8 bilhões.

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O debate envolve os temas 65, 66 e 67, que tratam da correção monetária e dos juros remuneratórios na devolução de valores relacionados aos empréstimos compulsórios da Eletrobras. A companhia alega que, em relação aos chamados juros remuneratórios, foram computados de maneira equivocada os votos do ministro Herman Benjamin, hoje presidente do STJ, e do ex-ministro Teori Zavascki, morto em 2017.

Tributo extinto em 1993

O empréstimo compulsório da Eletrobras foi cobrado de pessoas físicas e jurídicas entre 1964 a 1993 com o objetivo de arrecadar recursos para a expansão do setor elétrico. Os contribuintes pagavam o valor por meio de suas contas de luz, com a promessa de reaver o montante em no máximo 20 anos.

Apesar dos mais de 30 anos desde a extinção do empréstimo compulsório, entretanto, a devolução dos valores ainda gera debates na Justiça. Um dos problemas foi a correção monetária dos montantes devolvidos. Com a alta inflação principalmente na década de 1990, muitos contribuintes acabaram recebendo cifras desatualizadas, o que gerou um enorme contencioso. Prova disso é o fato de o STJ possuir 20 teses firmadas em recursos repetitivos sobre o assunto.

Nos temas 56, 66 e 67, a 1ª Seção fixou, entre outros pontos, o momento a partir do qual devem ser calculados a correção monetária e os juros remuneratórios sobre os empréstimos compulsórios. A questão que pode ser levada novamente à análise do colegiado, porém, diz respeito aos chamados juros reflexos, ou seja, os juros que surgiram após o reconhecimento pela Justiça de que o valor principal a ser recebido pelos contribuintes deveria ser ampliado a partir da inclusão de expurgos inflacionários.

“Se o valor [que deveria ter sido recebido pelos contribuintes] era maior do que esse valor que a Eletrobras devolveu, também os juros de 6% que deveriam ter sido recebidos anualmente foram recebidos a menor. Ele deveria ser calculado sobre o valor corrigido corretamente”, sintetiza o advogado Tadeu Negromonte de Moura, sócio do escritório Rolim, Goulart, Cardoso, Advogados.

Consta na decisão tomada em 2009 que o termo inicial da prescrição dos juros reflexos começa no momento da restituição do empréstimo em valor inferior ao devido aos contribuintes. Por cinco votos a três foi vencedora a posição da relatora, a então ministra Eliana Calmon, que entendeu que esse momento se dá na data das assembleias-gerais extraordinárias que homologaram a conversão do empréstimo compulsório, em 1988, 1990 e 2005.

Já a posição vencida considerou que a prescrição dos juros reflexos inicia-se a cada mês de julho, quando do pagamento dos juros remuneratórios.

A Eletrobras, porém, alega que os ministros Benjamin e Zavascki votaram a favor da divergência, apesar de seus votos terem sido computados como condizentes com o da relatora. O real placar em relação ao ponto, assim, seria favorável à companhia.

A 1ª Seção julgou, em 2010, embargos de declaração opostos pela companhia, negando-os. A relatora cita em sua decisão que a Eletrobras alega “contradição quanto ao termo inicial da prescrição relativa à correção monetária sobre os juros remuneratórios e também quanto aos juros remuneratórios reflexos”, mas segue dizendo que não vê nenhum vício neste ponto.

A posição vencida no julgamento é mais benéfica aos contribuintes em relação à defendida pela Eletrobras. O entendimento constante na tese firmada pelo STJ permite, por exemplo, que por meio de uma ação ajuizada em 2010 – cinco anos após a última assembleia-geral extraordinária – o contribuinte consiga pleitear o pagamento a menor de valores recebidos na década de 1980.

Pet

O tema voltou à 1ª Seção por meio da Pet 17904/RJ, que tem como relator o ministro Teodoro Silva Santos. Nos autos, a Eletrobras alega que desde 2018 já foram pagos cerca de R$ 669 milhões em juros reflexos prescritos. A companhia ainda afirmou que possui R$ 4,8 bilhões provisionados, relativos a  2.723 processos sobre o tema em tramitação na Justiça. De acordo com seu relatório de resultados do 2º trimestre de 2025, a Eletrobras possui um total de R$ 12 bilhões provisionados sobre empréstimos compulsórios.

A Pet começou a ser julgada em 13 de agosto pelo STJ, e após ser suspensa por pedido de vista deve voltar à pauta na próxima quarta-feira (8/10). Em agosto, entretanto, a ação foi palco de um intenso debate entre os ministros.

Na ocasião, os integrantes da 1ª Seção debateram quem deveria relatar uma possível revisão dos temas 65, 66 e 67. Isso porque as partes não podem requerer esse procedimento, que é restrito aos ministros e ao Ministério Público. O artigo 256-T, inciso II, do regimento interno do STJ define que, nos casos em que o procedimento de revisão for iniciado pelo Ministério Público Federal, a relatoria ficará com o relator do processo que ensejou a criação do tema ou com o presidente do órgão julgador. Em caso de aplicação do dispositivo à situação analisada na Pet, a relatoria ficaria com a presidente da 1ª Seção, ministra Regina Helena Costa.

O ministro Teodoro Silva Santos, por outro lado, alegou que não houve requerimento do Ministério Público para a revisão. O órgão fez apenas um parecer no qual apontava a possibilidade de mudança dos temas. Assim, o magistrado deveria ser responsável pela relatoria.

O assunto gerou um longo debate entre os magistrados. Ao final, por sete votos a três, os integrantes da 1ª Seção optaram por deixar a relatoria com Silva Santos.

Na ocasião, o advogado da Eletrobras destacou que a empresa fez pedido semelhante em três processos em tramitação no STJ, requerendo que os relatores, se convencidos, fizessem à 1ª Seção o requerimento de revisão dos repetitivos. A atitude, porém, foi alvo de comentário pela ministra Regina Helena Costa. “Isso não muda o fato de que a proposição partiu de parte ilegítima e que o Ministério Público, em ambos os casos, é que se manifestou pela admissibilidade da revisão”, disse.

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No dia 8 o caso voltará a debate com voto-vista do ministro Gurgel de Faria. O mérito do assunto, ou seja, se os repetitivos devem ser revistos, porém, não será analisado. Os magistrados primeiramente devem decidir se aceitarão a abertura da revisão dos temas e se deve haver a suspensão das ações relacionadas à temática em tramitação no Judiciário.

Para o advogado Tadeu Negromonte de Moura, porém, a revisão dos repetitivos pela 1ª Seção geraria insegurança jurídica. “Se tiver uma mudança na redação da tese como a Eletrobras quer, as empresas que ainda não receberam, e são várias, porque esses processos ainda não acabaram em definitivo, podem receber o crédito com base em um critério diferente de outras por uma questão de azar, vamos dizer assim, porque um processo pode ter demorado mais do que de outra empresa”, afirma.

O JOTA entrou em contato com a Eletrobras por meio de sua assessoria de imprensa, mas não recebeu retorno até a publicação.