Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) retomaram nesta quinta-feira (4/12) o julgamento que discute a validade do acordo firmado entre a União e a Eletrobras (atual Axia Energia). Todos os ministros votaram para validar o acordo, mas há divergências em relação à extensão da homologação a ser feita pela Corte. O placar está 5 a 4 pela homologação total dos termos.
Diante do placar apertado e da ausência do ministro Luiz Fux em plenário, o presidente do Supremo, Edson Fachin, optou por suspender o julgamento até a próxima quinta-feira (11/12).
O caso chegou ao Supremo depois de a União questionar dispositivos da lei de privatização da Eletrobras que limitavam o poder de voto do governo, apesar dele ser acionista majoritário, com 42% de participação. Diante do impasse, o relator, Kassio Nunes Marques, optou por enviar o caso para a conciliação.
Agora os ministros analisam o acordo feito entre a União e a Eletrobras por meio da Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Federal (CCAF), conforme estabelecido pelo relator. Os termos da negociação foram anunciados ao mercado em fevereiro de 2025 e aprovados em abril em Assembleia Geral Extraordinária (AGE) da empresa. Desde então, parte do acordo já está válida, mas outros itens ainda têm condicionantes para começarem a valer.
A homologação do acordo mantém os três assentos da União entre os 10 existentes no Conselho de Administração e um assento entre os 5 no Conselho Fiscal. Além disso, é uma etapa importante para a consolidação de eventual venda de parte da Eletronuclear ao grupo J&F, conforme anunciado no mercado. O acordo elimina, por exemplo, a obrigação de um aporte bilionário da Eletrobras em debêntures que seriam emitidas pela geradora nuclear. Ainda, desobriga investimentos em Angra 3 pela Eletrobras (atual Axia Energia) e os aportes na usina de Angra 1.
O relator, ministro Nunes Marques, votou a favor da homologação total do acordo e pela extinção da ação. Contudo, durante os debates, mudou de posição para não extinguir a ação e julgá-la parcialmente procedente, de acordo com o voto do ministro Cristiano Zanin. O relator também concordou com a sugestão de Flávio Dino de a fiscalização do acordo ficar sob a responsabilidade do STF.
Além de Marques e Zanin, votaram nessa corrente os ministros André Mendonça, Gilmar Mendes e Dias Toffoli.
Divergência
O segundo a votar foi o ministro Alexandre de Moraes, que levou a discussão do plenário virtual para o físico. Como já havia se manifestado durante as sustentações orais na semana passada, Moraes optou por homologar parcialmente o acordo. Em sua avaliação, o Supremo só pode opinar pela governança da empresa e não sobre tópicos “alienígenas” ao objeto da ação.
Para Moraes, não está no escopo do STF decidir sobre outros itens, como o processo de desinvestimento, a participação na Eletronuclear, a emissão de debêntures, a desobrigação de investimentos em Angra 3 pela Axia Energia e os aportes na usina de Angra 1. “O Supremo Tribunal Federal não tem como analisar se os termos visaram ou não o interesse público”, afirmou. “São questões concretas e alheias se o artigo da lei [de privatização da Eletrobras] é constitucional ou não”, acrescentou.
O ministro Flávio Dino, que também tinha demonstrado preocupação com a validação de termos que não eram objeto da ação proposta no Supremo, acompanhou Moraes pela homologação parcial. Dino disse que “é constrangedor que a AGU [Advocacia-Geral da União] tenha feito esse acordo”. Falando em segurança jurídica e respeito ao setor privado brasileiro, Dino disse que o STF não pode decidir sobre outros itens além dos dispositivos questionados na Corte.
Durante seu voto, Dino demonstrou preocupação com a negociação da venda da Eletronuclear para o braço de energia da J&F, a Âmbar – a operação já foi autorizada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O advogado da União substituto, Flávio Roman, pediu a palavra para dizer que a negociação com a Âmbar ocorreu depois do acordo já firmado.
A ministra Cármen Lúcia e o ministro Edson Fachin aderiram a essa corrente. Fachin, inclusive, mudou de posição em relação ao voto proferido em plenário virtual, que era a favor da homologação total.
Nos debates, o ministro Dias Toffoli afirmou que o STF já homologou acordos em controle abstrato com resoluções concretas e citou a ADPF das Favelas (ADPF 635). Zanin também lembrou do acordo dos Planos Econômicos (ADPF 165). Já Mendonça demonstrou preocupação com a homologação parcial porque, em sua avaliação, as partes teriam que manifestar se aceitam ou não a validade de parte do acordo.
A ação
Em maio de 2023, a AGU ingressou com a ação no STF pedindo maior poder de voto à União na Eletrobras, uma vez que ela é a acionista majoritária. A União se insurgiu contra dispositivos da Lei de Desestatização da Eletrobras (Lei 14.182/2021) que limitavam o poder de voto dos acionistas majoritários, fortalecendo, assim, os acionistas minoritários da empresa.
O objetivo da ação era o de assegurar o direito da União de votar, como acionista da Eletrobras, de forma proporcional à participação que ela detém no capital social da empresa. Mesmo após a privatização, a União possui cerca de 42% das ações ordinárias da companhia — considerado o controle direto e outras formas de participação. Porém, pela Lei de Desestatização da Eletrobras, a União teve seu poder de voto reduzido a menos de dez por cento do capital votante.
Na ação, a AGU pedia que a Corte afastasse a regra que proibia que acionistas ou grupo de acionistas exerçam votos em número superior a 10% da quantidade de ações em que se divide o capital votante da empresa. Para a AGU, essa regra só seria aplicável às ações adquiridas após a desestatização da Eletrobras, o que excluiria a União. Dessa forma, para quem comprou ações depois da privatização, a regra da Lei da Desestatização continuaria válida.
Diante do impasse, o ministro Nunes Marques encaminhou a questão para a conciliação que começou em 2023 e durou até 2025.