A derrota do governo na Medida Provisória 1303 sem dúvida representa um acirramento na disputa política mirando 2026 e um embate mais direto entre o presidente Lula e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. O fato de ela ter ocorrido na semana que marca um ano para o pleito presidencial e em meio a safra de pesquisas que mostra uma consolidação da melhora da aprovação e da chance de vitória de Lula no ano que vem não é mera coincidência.
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Ficou claro para a oposição que era preciso tentar gestos mais drásticos para conter a trajetória ascendente do petista nas pesquisas, de forma a garantir alguma chance de vitória para uma candidatura de direita.
Relatos de diversos parlamentares de governo e oposição confirmam que Tarcísio, hoje o preferido das lideranças do Centrão para ser o representante da direita para o Planalto, operou para que o acordo político da MP fosse desfeito e que os parlamentares votassem contra a proposta. A lógica é tentar forçar o governo a reduzir ou pelo menos não poder aumentar mais seus gastos no ano eleitoral.
Prudência com LDO se provou acertada
A MP dava originalmente ao governo R$ 20 bilhões em arrecadação para 2026 e, segundo contas não oficiais e não colocadas na Exposição de Motivos, evitava um aumento de R$ 15 bilhões em despesas obrigatórias. Ciente dos riscos em torno do texto, o governo segurou a votação do PLDO, conforme antecipado pelo JOTA.
A derrota provou que a prudência foi acertada, ainda mais em um ambiente no qual prevalece o discurso de não permitir aumento de tributos. Neste momento, as propostas de redução de gastos tributários, que prometem economizar outros R$ 20 bilhões para o ano que vem, também têm destino incerto.
Aos governistas, nesta quarta-feira amarga para seus planos, restou prometer atacar na opinião pública, especialmente nas redes, os congressistas que foram contra a MP. O bordão “Congresso inimigo do Povo” já estava sendo levantado e a tese de defesa de privilégios pelos parlamentares para cortar direitos dos pobres também.
Os opositores não pareciam tão preocupados e estavam firmes no discurso de que a sociedade não quer mais saber de aumento de impostos —o mesmo feito no IOF.
Alternativas na mesa
Enquanto a polarização política mostrava acirramento, o governo começava a estudar as alternativas práticas para resolver o problema orçamentário. Em conversas com parlamentares e entrevista coletiva, Haddad disse que tem um cardápio de possibilidades, que ainda precisava de aval do presidente Lula.
No Congresso, alguns levantavam a hipótese de uma reedição da MP, uma vez que ela não foi formalmente rejeitada. Mas o governo enxerga óbice jurídico para isso e estava caminhando mais na direção de medidas de caráter regulatório. Nesse sentido haveria a possibilidade de decretos (que podem subir impostos como IOF e IPI) e, eventualmente, de enxertos ou mesmo de um novo projeto com partes da MP, já nos termos do que havia avançado nas negociações.
Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo no Senado, avalia que o calor da derrota não é o melhor momento para definir alternativas. “As conversas são as piores porque são as de todo mundo de cabeça quente. Nunca sairão as melhores ideias hoje, porque está todo mundo querendo reagir”, afirmou.
O senador disse que as “ferramentas” da Fazenda para fazer frente à expectativa frustrada de arrecadação ainda precisam ser analisadas e que nenhuma decisão definitiva passou pelo presidente Lula (PT). O líder, no entanto, não descartou a possibilidade de isso ser feito por decreto. “Tem um armário de coisas que você pode fazer. Pode ter decreto, pode não ter”, disse.
Wagner também mencionou que a possibilidade de incorporar pontos do que previa a MP no projeto de lei do imposto de renda, relatado no Senado por Renan Calheiros (MDB-AL), foi citada em reunião desta tarde entre lideranças alinhadas ao governo no Senado e o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP).
Essa era a tese original do ex-presidente da Câmara e relator do IR na Casa, Arthur Lira (PP-AL). Mas o governo foi contra a ideia, por querer preservar a estrutura de tirar dos super ricos para desonerar a classe média. Wagner também considera que esse não seria o melhor caminho, já que o projeto voltaria para a Câmara, o que poderia piorar o clima político.
Hugo Motta preservado
Embora seja do mesmo partido de Tarcísio de Freitas, não há queixas do governo em relação ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), segundo o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP). O senador disse que Motta “esteve à disposição para ajudar o governo nessa construção”.
Outros líderes da Câmara foram na mesma direção, bem diferente do que ocorreu no episódio do IOF. Ainda assim, o Republicanos, junto com PP, União Brasil e PSD, entre outros, orientou a bancada pela retirada de pauta que sepultou a MP e derrotou o governo.
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Para além das questões práticas, fica a dúvida sobre se a vitória da oposição no Parlamento será espelhada na rua, contendo a recuperação da popularidade do presidente Lula, ou se, como apostam alguns aliados do Planalto, servirá para uma nova rodada de crescimento da aprovação do chefe do Planalto.