O ano de 2023 foi marcado por importantes decisões, em matéria trabalhista, no âmbito dos tribunais superiores. Cinco anos após a promulgação da reforma trabalhista, várias ações de inconstitucionalidade sobre dispositivos modificados ou incluídos pela Lei 13.467/2017 foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Na ADI 6188, a corte julgou inconstitucional a redação do art. 702, I, f e §§ 3º e 4º, da CLT, sobre os processos de elaboração e revisão de súmulas jurisprudenciais. Por maioria de votos, os ministros consideraram que referida disposição viola o princípio da separação dos poderes e a autonomia dos tribunais.
Na ADI 5994, o STF considerou constitucional a jornada 12×36, inclusive quando fixada por acordo individual escrito. Na ADI 6050 (e apensadas), o Supremo julgou também constitucional o tabelamento do dano extrapatrimonial, instituído no art. 223-G da CLT, dando-se interpretação conforme a Constituição para que os critérios de quantificação da reparação sirvam como recursos orientativos de fundamentação da decisão judicial e não como limitadores.
Para além dos dispositivos da reforma trabalhista, outra questão relevante julgada pelo STF refere-se ao piso salarial nacional dos agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias. A tese fixada no Tema de Repercussão Geral 1.132 (RE 1.279.765) declarou constitucional a aplicação do piso aos servidores estatutários dos entes subnacionais. Foi esclarecida, ainda, a abrangência da expressão ‘remuneração mínima’ para fins do piso salarial: corresponde à soma do vencimento do cargo e da gratificação por avanço de competências.
A procedência da ADC 39 assentou a constitucionalidade do Decreto 2.100/1996, que tornou pública a denúncia, pelo Brasil, da Convenção da OIT 158, relativa ao término da relação de trabalho por iniciativa do empregador.
Assim como no direito individual, as decisões do STF afetaram aspectos do direito coletivo do trabalho. Ressalta-se a reviravolta jurisprudencial que permitiu a imposição de contribuição assistencial aos empregados não sindicalizados, conforme tese fixada em sede de Embargos de Declaração no Tema de Repercussão Geral 935.
O ano de 2023 também foi marcado por grandes debates jurídicos no âmbito das decisões proferidas pelo STF e pela Justiça do Trabalho em matéria de relações de trabalho não empregatícias.
Um novo paradigma de interpretação da validade dessas relações contratuais civis veio sendo construído nos últimos anos pelo STF, notadamente em temas como terceirização (ADPF 324 e RE 958.252) e pejotização (ADC 48, ADC 66 e ADI 5.625). Por meio de reclamações constitucionais, instrumento que visa a preservar a autoridade das decisões do Tribunal, a Suprema Corte reforçou essa tendência em diversas oportunidades, cassando decisões da Justiça do Trabalho e validando a contratação, sem vínculo empregatício, de advogados, corretores, consultores, profissionais da saúde e trabalhadores via aplicativo. A questão, todavia, não se encontra exaurida e ainda será objeto de grandes debates.
Essa retrospectiva evidencia que, no ano de 2023, decisões emanadas do Poder Judiciário causaram impactos relevantes no cenário laboral, e a perspectiva é que essa tendência persista em 2024.
A reforma trabalhista subsiste como objeto de ações pendentes de julgamento no STF. Destacam-se os seguintes assuntos: contrato de trabalho intermitente (ADI 5826 e apensadas), equiparação da dispensa coletiva à individual (ADI 6142) e exigência de liquidação dos pedidos como requisito da petição inicial (ADI 6002).
Também com vista de conclusão em 2024, o julgamento do RE 1.387.795 (Tema 1.232) poderá fixar a tese sobre a (in)constitucionalidade da inclusão, no polo passivo da execução trabalhista, de pessoa jurídica pertencente ao mesmo grupo econômico e que não participou da fase de conhecimento.
Outro julgamento que provavelmente ocorrerá no próximo ano é o do RE 1.323.708 (Tema 1.158), sobre a configuração do delito de redução à condição análoga à de escravo e a possibilidade de distinção das condições de trabalho pela realidade do local de sua realização.
Por fim, destacamos para o ano que vem a continuidade das discussões sobre a natureza jurídica do vínculo entre trabalhadores via aplicativos e as plataformas por meio das quais prestam serviços. Resta a dúvida, para o ano de 2024, se a resolução dessas divergências resultará de uniformização jurisprudencial ou se a resposta se dará por via legislativa.