COP 28: oportunidades para o saneamento básico

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Os últimos meses do ano trouxeram um olhar atento para as externalidades positivas dos serviços de saneamento básico e a urgência de avanços no setor. Apesar de não haver motivos para celebração, a Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceu o dia 19 de novembro como o Dia Mundial do Banheiro, como forma de conscientização para esse grave problema ambiental e de saúde pública, que acarreta, sabidamente, uma série de impactos negativos na saúde, infância, educação e na própria atividade econômica como um todo.

Em um cenário no qual mais de 15% da população brasileira não têm acesso à água tratada e 44% não têm acesso à coleta e tratamento de esgoto (de acordo com dados da 14ª edição do Ranking do Saneamento, publicado pelo Instituto Trata Brasil), o tema deve continuar sendo central dos debates na medida em que existe um longo caminho a ser percorrido. Com efeito, mesmo com a inclusão de quase 2 milhões de pessoas no sistema de esgotamento sanitário entre 2019 e 2023, o déficit de atendimento continua a ser alarmante: em torno de 95 milhões de pessoas não têm acesso ao esgotamento sanitário. Além disso, a cobertura existente sofre com disparidades e singularidades regionais, bem como está sujeita a uma constante modernização e manutenção dos sistemas.

Sem uma robusta expansão dos investimentos no setor, o país flerta com o risco de permanecer em situação precária nos próximos dez anos, não alcançando as metas de universalização previstas pelo Novo Marco do Saneamento. Justamente por essa razão, atores governamentais, players privados e públicos, instituições financeiras, organismos multilaterais e agências internacionais de fomento demonstram estar atentos às necessidades transformacionais do setor.

Tudo indica que a emergência climática será um tema central das discussões da 28ª edição da Conferência das Nações sobre Mudanças Climáticas (COP28), que começou na última quinta-feira (30), tendo painéis e fóruns específicos para evidenciar as necessidades de proteção de infraestruturas de água e saneamento como forma de garantir segurança hídrica. Enquanto o mundo pretende discutir o financiamento para as ações de mitigação e riscos (Fundo de Perdas e Danos), o Brasil deve galgar, nos próximos dias, posição de destaque para atrair investimentos.

Nessa linha, o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação anunciou durante a última semana o lançamento de cinco editais do programa intitulado Mais Inovação Brasil, para financiar projetos nas áreas da transição energética, bioeconomia, infraestrutura e mobilidade, representando um investimento total de R$ 20,85 bilhões, sendo R$ 850 milhões em subvenção econômica. O lançamento do programa diretamente da COP28. O destaque vai para a pasta chamada “Mais Inovação Resíduos Urbanos e Industriais: Aproveitamento de Resíduos Sólidos Urbanos e Resíduos Industriais, Soluções Sustentáveis para Saneamento, Moradia Popular e Infraestrutura”, que promete ser importante instrumento de transformação e modernização do setor de saneamento.

Em paralelo, a criação do Plano de Transição Ecológica, elaborado pelo Ministério da Fazenda, com o intuito de colocar o Brasil na vanguarda da agenda ESG, conta com seis eixos, os quais devem e podem ser aproveitados pelo setor de saneamento básico:  (i) incentivos econômicos; (ii) consolidação tecnológica da indústria nacional;  (iii) fomento à bioeconomia; (iv) incentivos à transição energética, incluindo captura de carbono e exportação de excedente de hidrogênio verde; (v) resíduos e economia circular, incluindo o saneamento básico; e (vi) adaptação às mudanças climáticas.

Diante desse panorama, uma das principais estratégias para que os municípios brasileiros consigam acelerar ações de mitigação e sanar lacunas de infraestrutura e serviços com investimentos de baixo carbono é o financiamento climático, tema que deve novamente ter relevância na COP28.

O financiamento climático é caracterizado pelo financiamento local, nacional ou transnacional, concedido por fontes públicas, privadas e alternativas, que busca apoiar ações de mitigação e adaptação no contexto das mudanças climáticas. A COP27 foi encerrada com novas promessas de financiamento, mas deliberações importantes como valores, prazos e fontes referentes à nova meta financeira acabaram não sendo definidas.

Avanços nessa pauta podem abrir acesso a capital de menor custo para os projetos de saneamento, inclusive de menor escala, sendo essencial que as economias desenvolvidas e em desenvolvimento, juntas, garantam que repasses financeiros sejam aplicados e monitorados de forma transparente e eficiente.

Ainda no contexto de crise climática, o Brasil deve ter um olhar atento para os serviços de drenagem urbana e manejo de águas pluviais, os quais possuem um grau de integração e de indissociabilidade com as medidas de mitigação de risco das catástrofes climáticas. As práticas de gestão das cidades devem estar alinhadas com a percepção de integração dos serviços de saneamento. Para além dos benefícios de aprimoramento do setor de resíduos, como a possível geração de biogás e biometano (os quais foram objeto de avanços regulatórios nos últimos anos), também é possível destacar a necessidade de disrupção tecnológica advinda de redes IoT e da chamada tecnologia 4.0 para drenagem e manejo de águas pluviais, garantindo que os processos sejam metrificados e monitorados.

Em um contexto de crise e eventos severos, investimentos em PD&I, ações preventivas baseadas em dados de desempenho e segurança em ambientes de risco, como controle de presença, alarmes e programações automatizadas se fazem urgentes.

Medidas de financiamento de ações climáticas são ferramentas importantes e que contribuem para a eliminação de barreiras para novos projetos no setor de saneamento. Os esforços locais e regionais são determinantes para garantir um avanço inclusivo e resiliente, resultando em externalidades positivas a nível global. Esperamos que a COP 28 seja palco de decisões e catalisadora de mudanças positivas.