O ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou, na última terça-feira (11/2), oito decisões do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2), sediado em São Paulo, que reconheciam o vínculo empregatício de franqueados com a seguradora Prudential do Brasil Seguros de Vida S.A. Para ele, os acórdãos estão em desconformidade com a orientação da Corte firmada no julgamento da ADPF 324, que admitiu ser lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada.
Por isso, o ministro também determinou que outras sejam decisões sejam proferidas, em conformidade com os precedentes do STF. Além da ADPF 324, Nunes Marques mencionou outros precedentes estabelecidos pelo STF, como o julgamento da ADCs 48 e 66 e ADI 5.625, que versam sobre terceirização e celebração de contrato civil.
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O ministro cassou as decisões dos processos de número 1001411- 52.2019.5.02.0022, 1000572-83.2021.5.02.0013, 1001304-19.2020.5.02.0007, 1001417-14.2020.5.02.0058, 1001190-77.2020.5.02.0008, 1001272- 96.2020.5.02.0012, 1000530-35.2020.5.02.0024 e 1000214-53.2021.5.02.0067, todos do TRT2. Nos acórdãos, os franqueados requereram o reconhecimento de vínculo empregatício pela seguradora Prudential. O Tribunal trabalhista reconheceu a relação de trabalho entre as partes, por entender presentes os requisitos enumerados no art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Ao STF, a Prudential afirma que, na hipótese, firmou contratos de franquia com empresas corretoras de seguros, dos quais os beneficiários são sócios. Sustenta também que o TRT2 considerou ilícita as contratações, sem qualquer demonstração de fraude. Diz, ainda, que conforme ficou decidido nos precedentes da Corte, não existe prevalência do vínculo de emprego sobre outras formas de prestação de trabalho, estabelecidas mediante contratos civis, mesmo que em atividades-fim.
Por fim, alegou que a Justiça do Trabalho é incompetente pra julgar e processar a demanda e, por isso, requereu a cassação das decisões proferidas pelo tribunal e o retorno dos autos à Justiça comum.
Ao julgar o caso, o ministro Nunes Marques observou que não foi indicado qualquer exercício abusivo nas contratações, nem a intenção de fraudar uma eventual existência de vínculo empregatício. Além disso, ressaltou que a terceirização não enseja, por si só, precarização do trabalho, violação da dignidade do trabalhador ou desrespeito a direitos previdenciários.
“A primazia da liberdade negocial se afigura ainda mais intensa tendo em conta as peculiaridades dos casos, em que inexiste vulnerabilidade técnica das partes beneficiárias, as quais detinham conhecimentos suficientes para compreender os termos e implicações dos acordos firmados”, declarou Nunes Marques.
O ministro reiterou que na ADC 48 foi reconhecida a natureza civil da relação comercial entre empresa e transportadores autônomos, enquanto, na ADI 5.625, o Plenário do STF fixou a validade dos contratos de parceria firmados entre estabelecimentos e trabalhadores autônomos do ramo da beleza.
“Embora cada um dos paradigmas mencionados tenha abarcado aspectos da divisão de trabalho diversos, o ponto nodal e comum entre eles é a compreensão de que o princípio constitucional da livre iniciativa autoriza a adoção de estratégias negociais distintas do modelo empregatício”, concluiu.
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A estratégia jurídica do caso e a ação foram feitas pelo Mattos Filho, escritório representante da Prudential nos acórdãos mencionados.
Para Cleber Venditti, sócio de trabalhista do Mattos Filho, a importância da decisão do ministro Nunes Marques não está apenas na reafirmação da jurisprudência do STF, mas também na promoção de maior eficiência no sistema judiciário, ao permitir a resolução conjunta de múltiplos casos que compartilham a mesma questão jurídica.
“O caráter inédito da decisão reside no fato de o STF ter acolhido uma reclamação constitucional plúrima, anulando decisões em oito casos distintos, mas que tratavam da mesma matéria. Este precedente abre a possibilidade de que novas ações semelhantes sejam apresentadas. Caso sejam procedentes, isso poderá reduzir significativamente o número de reclamações junto ao STF, uma vez que será possível discutir vários casos similares em uma única reclamação constitucional”, concluiu Venditti.
A decisão do ministro se deu na Reclamação (Rcl) 64.274.