O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou a Resolução 530/2023 com o objetivo de melhorar a proteção, por meio do acesso à Justiça e ao direito social à saúde. Ao longo das últimas décadas, abundam evidências sobre a necessidade de estabelecer diretrizes nacionais para orientar a atuação dos órgãos do Judiciário para tratamento do elevado número de ações judiciais relacionadas à assistência à saúde.
O objetivo declarado pelo CNJ para a política recém-instituída é o de promover a resolução adequada das demandas judiciais de saúde e, no que couber, cooperar para o aperfeiçoamento da prestação de serviços de saúde. Ao fixar estes objetivos, o CNJ consolida um avanço no entendimento deste órgão superior do Judiciário sobre o fenômeno da judicialização da saúde, na medida em que compreende o tratamento dos processos judiciais que demandam saúde como consequência de conflitos oriundos de má prestação de serviços de saúde, nos sistemas público e privado.
A resolução cria a Política Judiciária de Resolução Adequada das Demandas de Assistência à Saúde, com princípios, objetivos e diretrizes para o planejamento de ações no âmbito do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (Fonajus).
Princípios e objetivos da política do CNJ para a judicialização da saúde
O art. 2º da resolução apresenta os princípios e diretrizes que devem orientar a política, valendo destacar os seguintes:
Garantia do acesso à justiça;
Cooperação e atuação interinstitucional para a promoção da resolução de demandas de assistência à saúde;
Especialização da estrutura judiciária e contínua capacitação e aperfeiçoamento funcional;
Apoio técnico-científico especializado necessário à tomada de decisão no âmbito judicial;
Atuação colaborativa, em parceria com órgãos e entes competentes, para aprimorar, no que couber, a prestação do serviço de saúde;
Contínuo acompanhamento estatístico das ações judiciais de saúde e incentivo à pesquisa judiciária;
Colaboração dos órgãos públicos e da sociedade civil organizada.
Os princípios estabelecidos pelo CNJ apontam para uma política judiciária que reforça a necessidade de respeito ao direito constitucional à saúde, garantindo ao cidadão o direito de acesso o Poder Judiciário quando este direito for violado ou ameaçado.
Ao mesmo tempo, os princípios direcionam a política judiciária para um processo de qualificação da atuação dos magistrados nas demandas de saúde, para que decidam sempre com base nos casos concretos que lhes são trazidos, mas sem deixar de considerar, nas motivações das decisões, as evidências científicas e as políticas públicas normatizadas pelo Estado brasileiro.
Destaque-se também que a nova política trazida pelo CNJ também busca promover a integração entre a ação dos diversos atores institucionais que movimentam a judicialização da saúde, tais como secretarias de saúde, agências reguladoras, associações civis, Defensoria Pública, Ministério Público, advocacia, dentre outros.
Outra importante inovação da Resolução 530/2023 foi o estabelecimento dos objetivos da política do CNJ para a judicialização da saúde. Dentre os objetivos listados, merecem destaque:
Estimular a adoção de métodos consensuais de solução de conflitos em demandas que versem sobre o direito à saúde;
Qualificar e prevenir a judicialização de conflitos de assistência à saúde;
Estabelecer programa de capacitação continuada de atores do Poder Judiciário, e cooperar, no que couber, para a capacitação de atores externos, do sistema de justiça e da área de saúde, para prestação de apoio à atividade judicial;
Cooperar com os órgãos ou entidades públicas ou privadas competentes para promoção da resolução de conflitos, da desjudicialização e do aprimoramento da prestação de serviços de saúde;
Fomentar ambientes de estímulo à participação e colaboração interinstitucional da sociedade para a proposição de ações que visem ao alcance dos objetivos desta política, bem como à disseminação de boas práticas e do acesso à informação.
A resolução estabelece expressamente que os objetivos listados podem e devem ser atualizados e detalhados pelo Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (Fonajus).
A judicialização da saúde pode ser entendida como a consequência do reconhecimento do direito à saúde pela Constituição, de um lado, e dos conflitos inerentes à expectativa do direito à saúde pelos indivíduos e pela sociedade face à realidade de entrega destes serviços pelos sistemas público e privado de saúde, de outro lado.
Nesse sentido, parece promissora a nova política na medida em que o CNJ a orienta para o fomento da participação democrática e da colaboração da sociedade como um todo para a busca de soluções consensuais e eficazes para os conflitos que chegam ao Judiciário.
Plano nacional da política do CNJ para a judicialização da saúde
Outra importante inovação trazida pelo CNJ foi a de criar as bases para a construção de um Plano Nacional para execução da nova política instituída, sob a coordenação do Comitê Executivo Nacional do Fonajus.
O Plano Nacional deve estabelecer as ações que serão desenvolvidas sob a coordenação do Comitê Executivo Nacional do Fonajus, de responsabilidade do Poder Judiciário, bem como as ações a serem desenvolvidas em colaboração com outros órgãos e instituições públicas ou privadas, e sob a responsabilidade de agentes externos. A previsão é que o Plano Nacional tenha vigência de seis anos, a contar de janeiro de 2024, e sua execução será acompanhada pelo Comitê Executivo Nacional do Fonajus.
O art. 6º da resolução prevê também que os Comitês Estaduais do Fonajus estabelecerão seus respectivos Planos Estaduais ou Distrital, que deverão ser encaminhados ao Fonajus para publicação no portal do Conselho Nacional de Justiça.
Saúde: direito de todos e dever do estado
A resolução do CNJ reforça o reconhecimento do direito à saúde no Brasil e o compromisso do Poder Judiciário para que este direito seja efetivado em sua plenitude.
Como dever do Estado que é, a proteção do direito à saúde, é tarefa dos Três Poderes — Executivo, Legislativo e Judiciário — e a institucionalização, no âmbito do Poder Judiciário, de uma política judiciária para tratar o tema é muito bem-vinda, mas deverá ser acompanhada de perto pela sociedade para que se reflita, de fato, na plena efetivação do direito à saúde.