O recente acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Agravo Interno no Recurso Especial 1.798.667/PB, que reconheceu a prevalência do artigo 147 do Código Tributário Nacional (CTN) até a notificação do lançamento, representa um marco significativo na jurisprudência tributária brasileira.
Este entendimento, que permite ao contribuinte apresentar a declaração retificadora durante o processo de fiscalização, desde que antes da notificação do lançamento do tributo devido, sinaliza um precedente importante e representa uma evolução relevante na relação entre fisco e contribuinte.
O acórdão é claro ao afirmar que a declaração de imposto de renda apresentada pelo contribuinte representa hipótese de autolançamento, conforme o artigo 150 do CTN, é suficiente para a formatação definitiva do crédito tributário, cabendo ao fisco a prerrogativa de homologar, ou não, a modalidade de lançamento realizada pelo contribuinte. Nesse contexto, a declaração retificadora assume a mesma natureza jurídica e efeito da declaração original, porém, com a vantagem de ser mais recente e refletir informações atualizadas.
A decisão acima representa um marco significativo na jurisprudência tributária brasileira, pois o entendimento predominante que até então prevalecia nos tribunais afastava os efeitos da declaração retificadora transmitida após o início do procedimento fiscal (artigo 895 do RIR/2018 e artigo 7º, caput, inciso I, e § 1º do Decreto 70.23/72), ao passo que o novo precedente passa a prestigiar o disposto no artigo 147, §1º, do CTN, que autoriza a retificação da declaração desde que atendido dois requisitos: a comprovação do erro; e que a retificação da declaração ocorra até a notificação do lançamento.
O novo entendimento é um avanço na flexibilização das normas tributárias, facilitando a regularização de situações fiscais e fortalecendo a confiança que se espera entre o fisco e os contribuintes.
Essa evolução é ainda mais relevante quando observamos o entendimento consolidado pelo STJ no Recurso Especial 1.149.022/SP, onde foram estabelecidos os requisitos para a caracterização da denúncia espontânea.
Segundo o STJ, a denúncia espontânea ocorre quando o contribuinte confessa a prática de uma infração tributária e paga o débito antes que o fisco inicie qualquer procedimento administrativo de cobrança, eximindo-se, assim, do pagamento da multa incidente, restando apenas os juros de mora.
A denúncia espontânea está prevista no artigo 138 do CTN e, segundo a jurisprudência do STJ, deve atender a quatro requisitos essenciais: o débito deve ser declarado; o pagamento do débito declarado deve ser feito até o vencimento; a declaração deve ser retificada antes de qualquer procedimento da administração tributária; e a diferença do tributo deve ser paga na mesma data da retificação.
A recente decisão do STJ, embora não tenha abordado a matéria sob o viés da denúncia espontânea, reforça a validade das declarações retificadoras durante o processo de fiscalização e proporciona um possível avanço na interpretação do conceito de denúncia espontânea.
Antes, a rigidez na aceitação das declarações retificadoras limitava a capacidade dos contribuintes de regularizar suas situações tributárias sem a imposição de multas adicionais. Com a nova interpretação, abre-se espaço para uma maior flexibilidade e um tratamento mais justo, permitindo que os contribuintes corrijam erros ou omissões de boa-fé, promovendo um ambiente de maior transparência e cooperação.
A importância desse precedente vai além da questão técnica. Ele sinaliza uma mudança de paradigma no relacionamento entre o fisco e os contribuintes, movendo-se em direção a uma abordagem mais colaborativa e menos punitiva. Esse avanço é crucial para um sistema tributário mais eficiente e justo, onde o contribuinte é visto como um parceiro no cumprimento das obrigações fiscais e não apenas como um sujeito passivo das ações fiscais.
Essa nova perspectiva também tem implicações significativas para a segurança jurídica dos contribuintes. Com a possibilidade de retificar declarações durante o processo de fiscalização, sem a imediata imposição de penalidades, os contribuintes ganham maior segurança para corrigir suas declarações e evitar futuros litígios tributários. Além disso, essa flexibilidade permite uma melhor gestão do compliance tributário, incentivando práticas mais transparentes e responsáveis.
Portanto, ao reconhecer a possibilidade de apresentação de declarações retificadoras durante o processo de fiscalização, o STJ propicia que seja fomentada a justiça e equidade no sistema tributário e, assim, pavimenta o caminho para um ambiente tributário mais colaborativo e eficiente.