Brasil é líder global no controle da corrupção

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O Brasil é um dos melhores países do mundo no controle da corrupção. No ranking geral está à frente de Bélgica, Chile e Israel, e segundo alguns critérios está à frente de Dinamarca, Alemanha e Suíça. O Brasil é um líder global quando o tema é transparência e integridade da administração pública. Não, isso não é um delírio.

Trata-se da conclusão do índice “Previsão de Risco de Corrupção” (Corruption Risk Forecast) criado em 2015 pela professora romena Alina Mungiu-Pippidi, em um programa financiado pela União Europeia e outras entidades. O sistema mede o problema da corrupção usando critérios objetivos de organização do Estado, como acesso à informação, transparência orçamentária, governo eletrônico e modelo de licitações.

Nos quesitos transparência orçamentária e governo eletrônico o Brasil está perto dos dez primeiros colocados e em transparência administrativa atinge um incrível 2º lugar entre 119 países, marcando 8,88 de 10 pontos. No ranking geral de integridade pública o Brasil fica em 34º lugar, e em transparência, 30º lugar.

O resultado do índice Previsão de Risco de Corrupção contrasta com o Índice de Percepção da Corrupção (IPC), publicado pela Transparência Internacional. Este índice é um agregado de pesquisas de opinião, captando uma avaliação subjetiva, em regra de empresários.

O resultado do Índice de Percepção da Corrupção é praticamente o oposto do obtido pelo Previsão de Risco de Corrupção. Coloca o Brasil em 104ª posição entre 180 países, marcando 36 pontos em uma escala até 100 pontos. Até 2014 o Brasil estava 35 posições e sete pontos melhor do que está hoje.

A Previsão de Risco de Corrupção também tem pesquisas de opinião, e são exatamente elas que puxam o Brasil para baixo. Critérios como independência do Judiciário e liberdade de imprensa são mal avaliados. Não fossem as pesquisas de opinião, o Brasil estaria no topo do ranking global do controle da corrupção.

Em estatística a discrepância entre dois indicadores é mau sinal. Ou um deles está errado, ou os dois estão. Ou o Brasil tem instituições de fachada que não funcionam, ou tem uma opinião pública enviesada e distorcida. Ou as duas coisas. 

Os estudos em comunicação de massa mostram que a opinião pública pode ser distorcida e enviesada em alguns casos. Pesquisas também mostram que a opinião pública tende a interferir no funcionamento das instituições, que realimenta o problema.

Uma das principais teorias da comunicação é a “espiral do silêncio”, criada pela cientista política alemã Elisabeth Noelle-Neuman. A ideia é que as pessoas tendem a imitar a opinião dos outros, mesmo quando discordam. As mídias de massa, inclusive as redes sociais, são máquinas de produzir “espirais do silêncio”. 

Pesquisas em comunicação mostram que a corrupção era um tema pouco relevante na mídia e na opinião pública até os anos 1980. Começou a crescer nos anos 1990 e atingiu seu ápice a partir de 2014, quando aparece a Operação Lava Jato. Em 2015 o Brasil desaba no Índice de Percepção da Corrupção: caiu cinco pontos e perdeu 16 posições de um ano para o outro. 

O Brasil vinha desde a Constituição Federal de 1988 colocando em pé aparatos robustos de controle interno e externo da administração pública. Tribunais de Contas, controladorias, Ministério Público, Judiciário. O Brasil é vanguarda em governo eletrônico, tem grandes quantidades de informação disponíveis ao público e um amplo leque de instrumentos para intervenção em decisões governamentais. 

O processamento de um escândalo de corrupção é um indício de que o problema está sendo resolvido, não de que está piorando. Mas a opinião pública percebe exatamente o contrário. A partir daí entra em funcionamento uma máquina de retroalimentação entre opinião pública e instituições que agrava o mal-entendido. 

A interferência entre opinião pública e instituições é tema recorrente em pesquisas. Uma delas é o doutorado do professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) José Roberto Franco Xavier. Foi publicado em 2015 em um artigo intitulado “A Opinião Pública e o Sistema de Direito Criminal”. 

A conclusão é que o sistema de Justiça possui uma ferramenta jurídica específica para incorporar a opinião pública, as “estruturas de recepção”. As estruturas de recepção são conceitos jurídicos vagos usados para dar a aparência de legalidade ao clamor popular. Conceitos como “preservação da ordem pública”, “alta culpabilidade”, “circunstâncias agravantes do crime” são alguns exemplos de estruturas de recepção. 

A opinião pública faz pouco caso de conceitos como “ampla defesa” e “devido processo legal” e tende a ver o Judiciário com desconfiança quando não entrega o que se espera, o que tende a deixar agentes institucionais ansiosos. O resultado são grandes espetáculos punitivos que reforçam a impressão de haver um problema grave onde existe uma solução em curso.  

A discrepância entre o Índice de Percepção da Corrupção (IPC) da Transparência Internacional e o índice Previsão de Risco da Corrupção (Corruption Risk Forecast) reflete a diferença entre aparência e essência. Na última década o Brasil foi tomado por tornados punitivistas que não ajudaram no controle da corrupção. Em 2013 a perspectiva do Brasil no Índice de Previsão da Corrupção era de melhora. Desde então, o país está estagnado.