Banco não pode ser responsabilizado por ‘golpe do motoboy’, decide STJ

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A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu em sessão nesta terça-feira (11/3), por maioria de votos, que instituições financeiras não podem ser responsabilizadas por compras realizadas com cartão de crédito em casos da fraude conhecida como “golpe do motoboy”. Com a decisão, a Turma reforça que, em casos de golpes bancários, a responsabilidade da instituição financeira só se configura quando há falha direta na prestação do serviço.

O julgamento no STJ até esta sessão estava empatado, com dois ministros, a relatora Nancy Andrighi e o ministro Humberto Martins, votando a favor da responsabilização do banco, e dois outros, Ricardo Villas Bôas Cueva e Paulo Dias Moura Ribeiro, contrários ao recurso da vítima. Coube ao ministro Antonio Carlos Ferreira o voto de desempate, negando provimento ao recurso da consumidora e formando maioria contrária à responsabilidade da instituição financeira.

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O recurso especial discutia se o banco Itaú deveria indenizar, por danos morais, uma cliente que foi vítima do golpe, no qual estelionatários, se passando por funcionários da instituição financeira, convenceram a correntista a entregar seus dados pessoais e o cartão bancário. Posteriormente, compras presenciais foram realizadas com o cartão e a senha digitada pelo criminoso. 

O valor das compras, de mais de R$ 16 mil, estaria fora de seu perfil de consumo, segundo a cliente. Ela ainda alegou que estava em estado de vulnerabilidade devido a um tratamento de quimioterapia para câncer de mama, o que teria afetado seu raciocínio lógico e sua cognição​. Com base nisso, argumentou que era hipervulnerável e que o banco deveria ter considerado essa condição ao avaliar a situação. 

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No entanto, tanto a sentença de primeira instância quanto a decisão do STJ concluíram que essa condição não estabelecia nexo causal com a responsabilidade da instituição financeira, pois o golpe ocorreu por meio da ação direta dos estelionatários, sem falha comprovada do banco​. 

Desempate

O voto de desempate do ministro Antônio Carlos Ferreira, que seguiu a divergência, considerou que a instituição financeira não deixou de adotar as medidas necessárias de segurança e que a fraude ocorreu por culpa exclusiva da correntista. “O caso sob exame evidencia a hipótese de culpa exclusiva da vítima, atraindo a aplicação do artigo 14, parágrafo terceiro, incisos I e II, do Código de Defesa do Consumidor”, disse Ferreira. Segundo ele, o banco não teve participação na fraude, pois a própria correntista entregou os dados e a senha pessoal ao estelionatário. 

“Foi a própria correntista que fragilizou o sistema de segurança do banco, possibilitando ao terceiro acessar o aplicativo do banco através da instalação de programas e posteriormente utilizar seu cartão de crédito com chip e senha para a realização de compras de forma física”, afirmou. “Penso que a instituição financeira não deixou de adotar qualquer medida que fosse dela legitimamente esperada e que pudesse evitar a prática da fraude por terceiros com participação direta e fundamental da vítima e aqui recorrente.”

O ministro ainda citou outros precedentes estabelecidos pelo STJ para fundamentar seu voto, como o julgamento do Recurso Especial 2.015.732, em que a Corte reafirmou que “comprovada a hipótese de vazamento de dados por culpa da instituição financeira, será ela, em regra, responsável pela reparação integral de eventuais danos. No entanto, quando as transações contestadas foram feitas com o cartão original e mediante o uso de senha pessoal, passa a ser do consumidor a incumbência de comprovar que a instituição financeira agiu com negligência, imprudência ou imperícia ao efetivar a entrega de numerário a terceiros.”

O golpe

A cliente disse que recebeu uma ligação de uma pessoa que se identificou como representante da área de segurança do banco, informando sobre compras suspeitas em seu cartão. Foi orientada a ligar para a central de atendimento do banco e, nesse processo, teve seus dados capturados por golpistas. Eles a instruíram a instalar o aplicativo AnyDesk, permitindo acesso remoto ao seu computador e contas bancárias. Posteriormente, um motoboy enviado pelos criminosos recolheu seu cartão físico e, com a senha já obtida, realizaram compras de alto valor.

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A decisão em primeira instância negou provimento ao pedido da cliente, sob a justificativa de que não houve falha na prestação do serviço bancário. Segundo a sentença, “a fragilização da segurança das transações bancárias envolvendo o cartão de crédito da vítima deu-se por sua conduta exclusiva e, como destacado na contestação, em ambiente externo ao sítio eletrônico e sede do banco”.

No curso do processo, a autora obteve uma decisão favorável em agravo de instrumento no TJMG, que determinou a suspensão da cobrança da dívida até o julgamento final. Segundo o acórdão, “o deferimento da tutela provisória de urgência pressupõe a demonstração da probabilidade do direito bem como a comprovação do perigo de dano […] A agravante solicitou o cancelamento do cartão tão logo percebeu a fraude”. Apesar disso, no mérito, a decisão final manteve a negativa de responsabilidade do banco.

O caso foi julgado no REsp 2155065.