Atualização de recursos offshore regularizados no RERCT

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Até esta sexta-feira (31/5), os contribuintes poderão atualizar os valores de bens e direitos no exterior à alíquota reduzida de 8% mediante o preenchimento da Declaração de Opção pela Atualização de Bens e Direitos no Exterior (ABEX). O desejo de, em pouco tempo, ter seus ganhos lá fora à disposição é apenas um dos motivos para o exercício dessa opção.

Outra razão se encontra no aumento do custo de aquisição de bens e direitos por conta de ganho cambial não tributável. Afinal, se o bem em questão tiver sido adquirido com rendimentos auferidos originariamente em moeda estrangeira, a variação cambial não impactará seu resultado. Simplesmente, prevê-se a conversão do custo de aquisição desse bem para real pela mesma taxa de câmbio do valor atualizado, qual seja: cotação oficial de fechamento da moeda estrangeira, para venda, em 29 de dezembro de 2023.

Diante desse cenário, muitos contribuintes que regularizaram seus recursos no âmbito do Regime Especial de Regularização Cambial Tributária (RERCT) têm dúvidas sobre qual seria o tratamento tributário na ABEX, sob a perspectiva cambial. A questão a ser respondida é se os recursos regularizados no RERCT, eventualmente atualizados na ABEX, são impactados pela variação cambial.

A Receita Federal já deu sua resposta: “depende”. Para o fisco, seria necessário examinar cada ativo regularizado. Nesse passo, ao contribuinte, restaria investigar cada bem ou direito informado no RERCT, de modo a averiguar a origem dos recursos empregados na sua aquisição. O tratamento tributário no RERCT seria, assim, irrelevante para fins de determinação da procedência dos ativos nele regularizados.

Esse caminho, porém, desconsidera que a regularização, no RERCT, importou atribuição de novo custo em decorrência da ficção jurídica estabelecida pela Lei 13.254/2016. A adesão ao RERCT pressupôs a declaração dos ativos objeto de regularização a valores de mercado (art. 4º, §8º), sendo expressos em moeda estrangeira (art. 4º, §9º). O montante desses ativos foi considerado um acréscimo patrimonial adquirido em 31 de dezembro de 2014 a título de ganho de capital (art. 6º, caput). Mediante ficção jurídica, o legislador substituiu o que ocorreu “de fato” para dar um tratamento legal. Pouco importava se na realidade se tratava de doação (não tributável) ou rendimento do trabalho (sujeito a tabela progressiva): para efeitos legais, aquele valor passou a ser um ganho de capital em moeda estrangeira.

É evidente, portanto, que a “transparência” do RERCT conferida pela Receita é incompatível com a Lei do RERCT e, por consequência, com a Lei das Offshores.

Adotar o raciocínio da Receita implicaria admitir que os ativos regularizados no RERCT não passaram a ter novo custo de aquisição. Ora, tais recursos sequer eram declarados (corretamente). Daí a necessidade de regularizá-los. Para tanto, decidiu-se gravar o valor a mercado de tais recursos como se fosse um acréscimo patrimonial – adquirido em moeda estrangeira – a título de ganho de capital.

Na linha da Receita, seria possível cogitar o absurdo de se examinar o custo de aquisição, anterior ao RERCT, dos ativos regularizados nesse regime, mesmo tendo o contribuinte oferecido à tributação todo o montante informado. Nesse passo, o valor a ser pago na ABEX seria ainda maior, pois não levaria em conta o custo de aquisição conforme a regularização no bojo do RERCT, mas aquele anterior à adesão ao programa. É como se a tributação no RERCT não tivesse existido. Simples assim.

Seguir o raciocínio da Receita implicaria acusar de inconstitucional o RERCT. Investigar ativo a ativo tiraria o véu da ficção jurídica trazida pelo RERCT (“recurso adquirido a título de ganho de capital em moeda estrangeira”), o que poderia atestar a tributação de situações alheias à competência da União para tributar a renda como as heranças ou mesmo rendimentos cuja pretensão tributária já havia decaído.

Por isso, deve-se entender que é irrelevante como se deu a aquisição dos ativos regularizados pelo RERCT. Averiguar a sua origem não é importante. Pelo contrário, justamente porque a Lei do RERCT concebeu uma aquisição desses ativos a título de ganho de capital em moeda estrangeira, as aplicações com os recursos do RERCT ocorreram, para todos os efeitos legais, originariamente em moeda estrangeira. Daí a ausência de impacto da variação cambial na ABEX referente aos ativos regularizados no RERCT.