Para além das explicações sobre a divisão no Copom, a ata da reunião da semana passada mostrou mais explicitamente que se reavivou no Banco Central as preocupações com a política fiscal e a política econômica de forma mais ampla.
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A autoridade monetária nas duas reuniões anteriores desse ano e no relatório de inflação havia moderado os comentários sobre a política fiscal. O presidente do BC, Roberto Campos Neto, chegou a dizer no último relatório de inflação, em março, que a gestão fiscal estava com mais riscos de surpresas positivas do que negativas, por isso o tom mais brando sobre o tema no documento e nas últimas reuniões.
Com a mudança nas metas fiscais e a piora no balanço de riscos, o colegiado do BC dedicou um parágrafo grande sobre a piora fiscal e seus impactos. “O Comitê acompanhou com atenção os desenvolvimentos recentes da política fiscal e seus impactos sobre a política monetária. O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”, diz a autoridade.
O BC destaca que, mesmo sem mudanças relevantes nas projeções do mercado para o resultado primário e para a dívida, “observou-se, no período, um aumento do prêmio de risco e uma percepção de piora da situação fiscal, de acordo com os agentes que respondem o Questionário Pré-Copom”. E colocou como motivos a piora do cenário externo; os recentes anúncios de política fiscal; e a percepção de agentes econômicos acerca do compromisso da autoridade monetária com o atingimento da meta ao longo dos anos.
Esse último ponto, aliás, acabou sendo reforçado pela própria maneira como foi conduzida a decisão de juros na semana passada, na qual os membros novos e indicados pelo governo Lula se posicionaram por um corte de 0,5 ponto porcentual, enquanto a maioria liderada por Campos Neto decidiu por 0,25 ponto porcentual.
A justificativa do grupo minoritário e que será, a partir de janeiro de 2025, maioria foi de que, a despeito de uma evidente piora no balanço de riscos, não havia motivo suficiente para não confirmar a sinalização (“guidance”) de corte de 0,5 ponto. Eles afirmaram que o custo reputacional da mudança seria maior do que manter a direção e mudar o tom para junho em diante. Ponderaram ainda que, dada a efetiva necessidade de se garantir a convergência da inflação e das expectativas para a meta, o mais importante seria a taxa terminal de juros.
Mas ficou clara a unanimidade em torno de um cenário realmente mais adverso e a necessidade de se cuidar sobretudo da reancoragem das expectativas inflacionárias. Elas subiram mesmo com um cenário de juros finais maiores.
“De forma mais relevante, o Comitê unanimemente avalia que se deve perseguir a reancoragem das expectativas de inflação independentemente de quais sejam as fontes por trás da desancoragem ora observada. A reancoragem das expectativas de inflação é vista como elemento essencial para assegurar a convergência da inflação para a meta”, diz o documento.
“O Comitê avalia que a redução das expectativas requer uma atuação firme da autoridade monetária, bem como o contínuo fortalecimento da credibilidade e da reputação tanto das instituições como dos arcabouços fiscal e monetário que compõem a política econômica brasileira. O Comitê não se furtará de seu compromisso com o atingimento da meta de inflação e entende o papel fundamental das expectativas na dinâmica da inflação”, completa o colegiado.
Para além da política fiscal, o BC voltou a alertar para outros aspectos da política econômica. Entre eles, o aumento do crédito direcionado, que é liderado pelo BNDES, mas também outros bancos públicos. E também cobrou empenho na continuidade das reformas.
“O Comitê reforçou a visão de que o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade”, diz o documento.
Não está claro se os novos diretores subscrevem também esse trecho. De qualquer forma, especialmente o tópico do direcionamento de crédito, trata-se de uma crítica a um dos pilares da estratégia econômica do atual governo. Faltando sete meses para acabar o ano, o grupo majoritário liderado por Roberto Campos Neto parece querer colocar com mais ênfase suas preocupações e marcar posição antes de o atual presidente deixar o cargo e a balança pender para os indicados de Lula.