Anvisa: suplementos são 48% dos alimentos suspeitos de irregularidades ou falsificações

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Com promessas fantasiosas e ingredientes adulterados, os suplementos alimentares foram o maior alvo da fiscalização de alimentos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2023. De acordo com levantamento feito pelo JOTA com base nos dados da consulta de alimentos irregulares, os suplementos alimentares são responsáveis por 48% das medidas cautelares e preventivas aplicadas em alimentos pela Anvisa. 

Com 126 infrações registradas, os suplementos estão presentes em pelo menos 60 ocorrências, quatro vezes mais que o segundo colocado, o sal, que responde a 12% das infrações — com 15 ocorrências. 

Nesse levantamento, a apuração do JOTA considerou os dados públicos sobre alimentos irregulares ou falsificados no período de 2023, disponibilizados no sistema de consulta da Anvisa. Contudo, os dados da agência indicam apenas os produtos que foram alvo das medidas preventivas e cautelares, que são ações de precaução, baseadas com o objetivo de eliminar, reduzir ou atenuar os riscos sanitários. Portanto, não possuem caráter condenatório ou punitivo, e podem ser revogadas caso as suspeitas ou riscos à saúde sejam afastados.

Para chegar a essas cifras, o JOTA precisou classificar cada produto contido na base de dados da Anvisa, analisando a descrição dos alimentos, as informações das empresas (nome e razão social) e notícias que identificaram o tipo do alimento. Leia na íntegra.

No Brasil, a regulamentação da venda dos suplementos alimentares existe desde 2018, a partir da Instrução Normativa – IN 28/2018 da Anvisa. Uma das novidades trazidas pela regra foi a definição de suplementos como “produtos destinados a pessoas saudáveis, com o objetivo de fornecer nutrientes, substâncias bioativas, enzimas ou probióticos em complemento à alimentação”. Além disso, as normas da agência também determinam os ingredientes e a quantidade autorizada para a fabricação dos suplementos.

Para a área técnica da Anvisa, a recorrência das infrações com suplementos alimentares é motivada por uma série de fatores, como: as alegações de benefícios à saúde não autorizadas; composição irregular, com uso de ingrediente sem autorização da Anvisa para suplementos alimentares; e comércio sem autorização junto ao órgão competente.  “Atualmente estão sujeitos a registro na Anvisa os suplementos alimentares que contenham enzimas e/ou probióticos. Os demais suplementos alimentares estão sujeitos a apresentar comunicado de início de fabricação junto à vigilância sanitária local”, ressaltou o órgão em nota enviada ao JOTA.

Para as empresas do setor regulado de suplementos, a comercialização de produtos irregulares ou falsos reflete um cenário de inadequação com os parâmetros regulatórios. Em nota, a  Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para Fins Especiais e Congêneres (Abiad) destaca a necessidade de um trabalho contínuo de fiscalização e conscientização das empresas fabricantes no cumprimento das normas regulatórias para garantir a oferta de suplementos mais seguros para a população.

Contudo, a diretora executiva da Abiad, Gislene Cardozo, pondera que, embora a regulação tenha aumentado a qualidade e a segurança dos suplementos, o setor lida com a demora na liberação de novos ingredientes. “Um dos principais desafios regulatórios no campo de suplementos alimentares é a aprovação de novos ingredientes”, afirmou.

Cardozo sustenta que, para se destacar no mercado, as empresas do setor regulado apostam na adoção de novas tecnologias e ingredientes para apresentar novas opções aos consumidores. “Em prol de constantes melhoramentos, a interlocução entre o setor privado e público constrói diálogos que enriquecem a produção, comercialização e divulgação de informações corretas dos produtos. Como mencionado anteriormente, a aprovação de novos ingredientes é fundamental para que cada vez mais grupos da população tenham suas necessidades nutricionais atendidas”, defende.

Riscos à Saúde

Embora possam parecer inofensivos à primeira vista, o consumo de suplementos alimentares irregulares ou falsificados pode causar graves riscos à saúde. De acordo com Celso Cukier, médico nutrólogo do hospital Albert Einstein, a dosagem inadequada de vitaminas por tempo prolongado pode ocasionar doenças hepáticas e até lesões no fígado.

“A questão da saudabilidade dos alimentos é muito importante. Saber a origem e só comprar os produtos recomendados por profissionais especializados pode proteger e evitar danos à saúde. É preciso tomar cuidado com produtos anunciados ou ofertados, sem base científica ou indicação adequada às necessidades do paciente”, recomenda

Para o médico, ao decidir tomar suplementos alimentares, o consumidor deve procurar adquirir o produto em estabelecimentos autorizados pela vigilância sanitária e sempre analisar a composição e rotulagem do produto. “A origem desses produtos precisa ser muito bem averiguada. É importante estar com um profissional orientado e adquirir um produto de boa qualidade nos estabelecimentos que tenham autorização para comercializar esses produtos. Também devemos analisar a origem dos produtos e olhar a rotulagem para saber o que a gente está tomando”, afirma.

Ele também destaca que, antes de iniciar um tratamento, é necessário diferenciar a complementação e a suplementação alimentar. A primeira é indicada para os casos em que a dieta não está adequada, de modo que é necessário o tratamento com algum micro ou macro nutriente, entre carboidrato, gordura, proteína e micronutrientes, vitaminas e minerais, como prevenção.

Por outro lado, a suplementação alimentar é indicada nos casos em que há uma deficiência nutricional e é necessário “suplementar” a falta de alguma vitamina. “A gente resguarda a suplementação para os casos em que é necessário reposição. Enquanto, a complementação alimentar é utilizada quando não é possível adquirir todos os nutrientes com a alimentação natural, com a comida normal que a gente deveria ter todos os dias. Então, é importante o acompanhamento de um bom profissional de saúde para orientar o paciente”, explica

E-commerce irregular

Atualmente, um dos principais espaços para a venda e publicidade de suplementos falsificados ou irregulares é a internet. Segundo o monitoramento da vigilância sanitária, a Anvisa já emitiu mais de 55 mil notificações para a retirada de anúncios de suplementos irregulares no e-commerce. Dados do monitoramento do e-commerce de produtos sujeitos à vigilância sanitária apontam que 33% dos pedidos de retirada de anúncio são de suplementos. De 202.722 notificações encaminhadas, 55.261 foram destinadas a vendedores de suplementos alimentares fora dos padrões de regulação.  

Para auxiliar o consumidor na compra de suplementos, a Anvisa disponibiliza um guia com as principais informações sobre os ingredientes autorizados e as normas de regulação vigente. Acesse aqui.

Hoje, os suplementos alimentares estão em 59% dos lares brasileiros, tendo no mínimo uma pessoa consumindo o produto, segundo a pesquisa “Hábitos de Consumo de Suplementos Alimentares no Brasil”, realizada pela Abiad. Seja em comprimidos, shakes ou até gelatinas saborizadas, o setor de suplementos vem ganhando mais espaço na vida dos consumidores. Ainda de acordo com a Abiad, o consumo de suplementos e complementos alimentares cresceu 2,3% em 2023.