Está em vias de votação no Congresso Nacional o PL 6461/2019, que propõe restringir a atuação de escolas técnicas privadas na formação de jovens aprendizes. A proposta vai na contramão de avanços trazidos pela Portaria 671/2021, que ampliou um mercado restrito a ONGs e estimulou a criação de cursos voltados à economia 4.0, aproximando a formação profissional das necessidades do setor produtivo.
Criado há 25 anos, o programa Jovem Aprendiz é considerado referência internacional. A legislação exige que empresas tenham de 5% a 15% de jovens entre 14 e 24 anos no quadro de funcionários, garantindo a combinação entre educação profissionalizante e experiência prática.
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Em tese, trata-se de um poderoso mecanismo de mobilidade social. Na prática, os resultados ainda estão aquém do ideal. Apenas 15% dos jovens aprendizes são efetivados, segundo dados do Ministério do Trabalho.
Dar voz aos jovens é essencial para entender os gargalos da política. E eles têm falado alto: uma busca por #JovemAprendiz no TikTok revela centenas de vídeos criticando os modelos tradicionais de formação, com comentários que expressam frustração generalizada.
Fica claro que parte da responsabilidade está na formação oferecida — ainda distante das habilidades que as empresas buscam. Pela legislação, tanto a formação quanto o salário são custeados pelas empresas. O resultado é um investimento de mais de R$ 10 bilhões por ciclo, que raramente se traduz em qualificação ou aproveitamento real: mais de meio milhão de jovens deixam o programa sem serem efetivados.
O problema é ainda mais estrutural: 62% dos aprendizes no Brasil são formados como assistentes administrativos, uma função cada vez mais desconectada da nova economia. Em fala no evento Empregabilidade Jovem Brasil 2024, Paula Montagner, subsecretária de Estatística e Estudos do MTE, alertou: “Este tipo de ocupação (operacional) é outro que vai embora. […] A tecnologia vai substituindo… precisamos juntar conhecimento técnico para diferenciar a inserção de quem está no mundo do trabalho”.
Segundo a consultoria McKinsey, até 2030 cerca de 30% das atividades repetitivas poderão ser substituídas por inteligência artificial. Ou o Brasil transforma a aprendizagem em instrumento para desenvolver habilidades do futuro — como análise de dados, pensamento crítico e competências digitais — ou empurra uma geração inteira ainda mais para a informalidade e o subemprego.
Nestes menos de quatro anos em que a reserva de mercado foi quebrada, surgiram bons e maus exemplos de oferta, como é natural em qualquer segmento. Cabe ao Ministério do Trabalho fiscalizar a qualidade com rigor e imparcialidade.
Reverter essa decisão limitaria o impacto de um setor que hoje soma mais de 15 mil escolas técnicas privadas e cerca de 1 milhão de alunos. Algumas delas já conquistaram uma taxa de efetivação de 48% — aproximadamente três vezes a média do mercado.
Permitir que instituições privadas atuem não significa abandonar o interesse público. Ao contrário, significa abrir espaço para inovação, diversidade de métodos e maior impacto na mobilidade social.