Em 2013, o canal History Channel organizou um concurso para eleger a figura mais importante da história da Colômbia. No México, a votação popular havia sido vencida por Benito Juárez, e na Argentina, por José de San Martín. Para surpresa de muitos, o vencedor na Colômbia foi Álvaro Uribe Vélez, superando o laureado com o Nobel de Literatura Gabriel García Márquez, o pintor Fernando Botero ou os heróis da independência Antonio Nariño e Francisco de Paula Santander, entre outros.
Diante das dúvidas sobre chamar Uribe de “O Grande Colombiano”, temos uma certeza: o ex-presidente Álvaro Uribe é a figura política mais importante da Colômbia no que vai do século 21. Amado por muitos e odiado por outros, mas nunca indiferente, ele marcou o destino eleitoral do país cafeeiro durante o primeiro quarto de século.
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Advogado de formação, graduado pela Universidade de Antioquia, militou no Partido Liberal Colombiano e ocupou cargos como representante da Câmara (1980-1982), prefeito de Medellín (1982-1984), senador (1986-1994) e governador de Antioquia (1995-1997).
Em 2002, na qualidade de dissidente deste mesmo partido, com um discurso contrário aos diálogos de paz do governo de Andrés Pastrana com as FARC-EP, e diante da ruptura e término abrupto dessas conversações, ele se catapultou nas pesquisas presidenciais, passando de 3% para 53,03% e conseguiu ser eleito presidente da Colômbia no primeiro turno.
Em 2004, e com a tramitação de um Ato Legislativo bastante questionado, conseguiu que o Congresso da República reformasse a Constituição Política, que no artigo 197 proibia a reeleição, para que fosse permitida por outro período. Foi assim que em 2006, como candidato independente, ele venceu a reeleição (2006-2010).
Em 2010, e como parte de uma nova tentativa de reforma constitucional, mas desta vez através de um referendo de origem popular, o Tribunal Constitucional, por meio da Sentença C 141 do mesmo ano, declarou a inconstitucionalidade da lei de convocação a um referendo reformador da Constituição para uma segunda reeleição e um terceiro mandato de Uribe.
Desde o fim de seu segundo mandato (2010), o ex-presidente Uribe tem sido determinante para as eleições presidenciais da Colômbia, umas vezes por seu apoio inicial, como foi o caso de Juan Manuel Santos (2010-2014) e Iván Duque (2018-2022), e outras vezes como ferrenho opositor, como aconteceu com Juan Manuel Santos (2014-2018) e Gustavo Petro (2022-2026).
Ele inclusive fundou seu próprio partido político em 2012, denominado Centro Democrático, que se tornou uma das forças políticas mais importantes do país. Trata-se de um partido de direita, com ideias conservadoras e uma marcada influência de seu fundador. Por esse partido, ocupou uma cadeira no Senado da República entre 2014 e 2020, mas renunciou buscando evadir a competência da Corte Suprema de Justiça, que havia ordenado sua captura.
Denúncias criminais contra Álvaro Uribe
A forma de governo da Colômbia é presidencialista, e a figura do presidente tem foro privilegiado, do qual não pode ser privado a não ser que se lhe faça um exigente e complexo julgamento político. Da denúncia contra o presidente, conhece a comissão de investigações e acusações da Câmara de Representantes, que, se encontrar méritos, acusa perante o Senado, mas com prévia aprovação da Câmara.
Será então o Senado quem decidirá se retira ou não o foro do presidente. O anterior não aconteceu com nenhum chefe de Estado colombiano em vigência da Constituição de 1991, apesar de existirem razões de peso para serem julgados. O presidente Álvaro Uribe não tem sido exceção.
Da época de diretor da Aerocivil, ele é acusado de ter concedido licenças aeronáuticas a narcotraficantes. Como governador de Antioquia, ele tem denúncias criminais por sua suposta participação na formação de grupos de autodefesa ou sua atuação omissiva na hora em que grupos paramilitares cometeram massacres como as de La Granja ou El Aro.
Como presidente, ele é acusado de ter tido alianças com políticos com vínculos com os paramilitares e/ou o narcotráfico; ter comprado congressistas para a aprovação da reforma constitucional que permitiu sua reeleição (escândalo chamado Yidispolítica); entrega de subsídios milionários a famílias ricas (AIS); interceptações ilegais a opositores, jornalistas, magistrados da Corte Suprema de Justiça (grampos do DAS); assassinatos de jovens inocentes que posteriormente foram apresentados como guerrilheiros mortos em combate (falsos positivos); são algumas das muitas denúncias que hoje repousam na comissão de investigações e acusações da Câmara de Representantes.
Estima-se que nesta instância há mais de 200 denúncias contra o ex-presidente Uribe, mais as que foram adiantadas perante a jurisdição ordinária, mas a maioria delas foram arquivadas.
Mas então, que denúncia criminal tem Álvaro Uribe como o primeiro ex-presidente colombiano a ser condenado em vigência da Constituição de 1991?
Como foi registrado no parágrafo anterior, na Colômbia é muito difícil processar um presidente pelos fatos ocorridos durante sua presidência, por estar protegido com um rígido foro privilegiado. Mas o caso de Uribe é distinto, pois em 2014 ele se fez eleger senador, e neste espaço sustentou acalorados debates com líderes de esquerda como o hoje presidente Gustavo Petro e o senador e pré-candidato presidencial Iván Cepeda.
Aos congressistas que cometem crimes, a Corte Suprema de Justiça os investiga. Uribe decidiu denunciar em 2012 Cepeda pelos supostos crimes de fraude processual e suborno, mas em 2018, a máxima autoridade judicial do país decidiu arquivar a investigação contra Cepeda e, em vez disso, abrir uma contra o então senador Uribe, pelos mesmos crimes e adicionalmente concerto para delinquir.
Em 2020, a Corte Suprema de Justiça ordenou a captura do senador Uribe, mas este decidiu renunciar à sua cadeira, para assim evadir a competência do alto tribunal.
Agora a autoridade competente para investigar Uribe era a Procuradoria-Geral da Nação, que se encontrava sob o comando de Francisco Barbosa, amigo pessoal de Iván Duque. Houve três tentativas do órgão investigador de pedir a preclusão da investigação, mas graças aos recursos de lei apresentados pelas vítimas reconhecidas dentro do processo, este não foi arquivado.
Em 2024, Adriana Camargo assume como Procuradora-Geral da Nação. Assim, o órgão investigador decidiu mudar de posição e acusou o ex-presidente Uribe perante os juízes criminais. Por sorteio, o caso coube à Juíza 44 Penal do Circuito de Bogotá, que, apesar das pressões, tomou a decisão de condenar Uribe a 12 anos de pena privativa de liberdade e ordenar sua detenção domiciliar imediata.
É claro que a defesa fez uso do recurso de apelação, e caberá ao Tribunal Superior de Bogotá confirmar ou não a sentença de primeira instância. Seja qual for sua decisão, algum dos sujeitos processuais ficará inconformado e fará uso do recurso extraordinário de cassação. Com o anterior, caberá à Corte Suprema de Justiça, onde este processo começou, decidir sobre a inocência ou culpabilidade do ex-presidente Álvaro Uribe, e esta decisão levará anos.
O agora condenado ex-presidente Uribe tutelou seu direito de gozar de liberdade enquanto o juiz de segunda instância se pronuncia sobre o recurso de apelação.
O caso estava às portas da prescrição no mês de outubro deste ano, mas mediante uma decisão calculada, a defesa do ex-presidente decidiu renunciar à prescrição, mostrando-o como um homem comprometido com a verdade, mas o que realmente conseguiu foi ganhar tempo para fazer campanha, percorrer o país e mostrar-se a seus seguidores como um perseguido político. O anterior em um ano eleitoral, pois em março de 2026 os colombianos elegerão um novo Congresso da República e em maio o próximo presidente.
Por todas as denúncias criminais que foram instauradas contra ele e pelo manejo dilatório que deu às investigações que foram e são adiantadas contra ele, e por respeito à memória dos 6.400 jovens assassinados para inflar os resultados da força pública em sua luta contra as guerrilhas durante seus dois mandatos (mal chamados falsos positivos), Álvaro Uribe Vélez não pode ser “O Grande Colombiano”.
“O Grande Colombiano” somos todos os nascidos no país cafeeiro, que nos recuperamos da guerra, transformamos a dor em resiliência, transformamos uma história trágica em um presente esperançoso. Os colombianos são paixão, natureza e música, e esses são os valores que queremos que nos representem diante do mundo.