O presidente Lula recebeu mais um presente político de seus adversários na semana passada. A aprovação pela Câmara da PEC da Blindagem conjugada ao requerimento de urgência da anistia aos golpistas do 8 de janeiro foi inicialmente vista como apenas mais uma derrota acachapante do Planalto no parlamento. Mas essa associação acabou se convertendo em um enorme tiro no pé para o centrão e o bolsonarismo, que ensaiam forjar uma aliança com o objetivo de derrotar o petista nas eleições presidenciais de 2026.
São tantas as consequências negativas para os participantes dessa concertação, e dos grupos associados a eles, que fica difícil enumerar. A mais óbvia foi vista no último domingo (21/9) nas manifestações no Rio de Janeiro, em São Paulo e em diversas capitais do país. Pela primeira vez desde as jornadas de junho de 2013, quando “o gigante acordou”, a esquerda saiu da toca. Com os rivais tomando a Paulista e Copacabana, a direita perdeu o monopólio das ruas.
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Outro grande erro está na origem desse acordão na Câmara. Ao associar a anistia de Bolsonaro, tema que divide o país, à PEC da Blindagem, privilégio inaceitável para basicamente todo o eleitorado, fez outro enorme favor a Lula: uma pauta acabou enfraquecendo a outra, sem que o presidente tivesse que mover uma palha para tal.
A repulsa popular praticamente matou a PEC, que agora tem chance quase zero de passar no Senado. E a “anistia light” costurada pelo deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), que já vinha sendo minada pelo bolsonarismo raiz e pelo PT, também tem reduzidas as suas chances de aprovação.
Deputados do centrão agora fazem “mea culpa” por seu voto e dizem que vão trabalhar contra a aprovação da proposta no Senado. Um deles é Mario Negromonte (PP-BA), do mesmo partido e estado do relator da PEC, Claudio Cajado (PP-BA), o que só reforça como o movimento no Congresso foi um tiro no pé.
Estilhaços atingem Tarcísio
Os estilhaços dessa bomba legislativa atingem também o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), o chamado “candidato do centrão à Presidência”. Protagonista na articulação pela anistia no Congresso, ele mais uma vez terá que se recolher a fim de não irritar bolsonaristas nem afugentar eleitores do centro, movimentos que vem sendo forçado a fazer na difícil missão de se cacifar para a disputa ao Planalto.
Ronaldo Caiado (União Brasil-GO), outro governador que pretende ser o candidato da oposição, já tratou de dizer que a PEC é “um erro que tem que ser derrubado no Senado”.
O bolsonarismo raiz, por outro lado, tampouco sai bem nessa foto. A começar por Jair Bolsonaro, que vê mais distante a concretização do acordo gestado no Congresso para ao menos livrá-lo de ir para a Papuda, como vinha sendo propagado nos bastidores pelos líderes do centrão que participaram do pacto.
Já o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) se encontra agora obrigado a defender pautas contra as quais emergiu como um ícone “antissistema” e “anticorrupção”. Ao receber o título de cidadão honorário de Juiz de Fora (MG), na últimaquinta-feira, ele disse que a PEC da Blindagem deveria ser chamada de “PEC da Alforria”.
Motta é o grande perdedor
O grande perdedor nesse episódio, porém, parece ser Hugo Motta (Republicanos-PB). Com a autoridade contestada e sem o controle do plenário que se espera de um presidente da Câmara, ele foi forçado a engolir o acordo costurado entre seu padrinho político, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), e o bolsonarismo radical.
O Senado já sinaliza que não vai deixar passar a PEC da Blindagem, já chamada abertamente por comentaristas em meios de comunicação de massa como “PEC da Bandidagem”. Convertido em rosto público dessa medida amplamente impopular, Motta corre agora o risco de morrer com um gigantesco mico na mão.